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No Brasil o surrealismo passou rápido

Enquanto a Europa vivia a perturbadora transição entre as duas grandes guerras quando o surrealismo foi defendido por artistas e poetas, com ideias do francês André Breton, o Brasil exalava ainda o ranço conservador do colonialismo na sua República Velha. Portanto, o movimento artístico que defendia a liberdade das forças do inconsciente sem o controle do pensamento, foi fraco na cultura brasileira, mas não passou despercebido.

O esforço de alguns artistas como Ismael Nery. Cícero Dias, Tarsila do Amaral, ainda que tinham em mente buscar a identidade artística nacional e não apenas copiar ideias europeias, trouxeram para o país um novo estilo na arte.

Qual é a importância do surrealismo no contexto histórico?

A diversidade da cultura brasileira a um movimento que surgiu da inquietação intelectual de uma sociedade que estava vivendo transformações imprevisíveis da pós-guerra e na iminência de outra, perdeu-se no sentido original. Um artigo de Mario Schenberg pontua o quanto foi inexpressivo o movimento no Brasil ao falar sobre Realismo Fantástico, Arte Mágica e Surrealismo.

No Brasil a influência do surrealismo foi bastante fraca até recentemente. Só tivemos um grande surrealista na década dos trinta, Ismael Nery, mas que só agora vem recebendo a atenção merecida. Isso se deve talvez ao fato de haver no Brasil fortíssimas influências religiosas e mágicas de origem africana e ameríndia. No Brasil, como em muitos outros países da América Latina, nunca chegou a se fazer sentir falta do elemento mágico, como nas regiões da arraigada cultura ocidental pós-renascentista.

Ismael Nery foi expoente do movimento surrealista brasileiro na pintura

Um grande destaque como pintor surrealista foi Ismael Nery. Ele ficou conhecido com o pintor maldito, pelo fato de nunca ter conseguido vender um quadro em vida e surreal era sua arte contrapondo-se aos seus valores básicos de vida. O poeta Floriano Martins cita um comentário do jornalista Sérgio Augusto interessante:

 

Dois dos mais notórios apóstolos do surrealismo no Brasil, Ismael Nery e Murilo Mendes, não só acreditavam em Deus como iam à missa aos domingos – onde vez por outra comungavam ao lado de um e outro comunista, pois não há limites para o absurdo neste país irremediavelmente surreal“.

Poesia

O poeta Murilo Mendes transitou pelo surrealismo em suas poesias, nada convencionais, ao potencializar imagens cotidianas em clima onírico e místico. Personalidade de extremos, ao mesmo tempo que defendia a liberdade política e estética, era um homem religioso.


Adivinho nos planos da consciência
dois arcanjos lutando com esferas e pensamentos
mundo de planetas em fogo
vertigem
desequilíbrio de forças,
matéria em convulsão ardendo pra se definir.
Ó alma que não conhece todas as suas possibilidades,
o mundo ainda é pequeno pra te encher.
Abala as colunas da realidade,
desperta os ritmos que estão dormindo.
À guerra! Olha os arcanjos se esfacelando!
Um dia a morte devolverá meu corpo,
minha cabeça devolverá meus pensamentos ruins
meus olhos verão a luz da perfeição
e não haverá mais tempo.

(O homem, a luta e a eternidade – Murilo Mendes)

Retrato de Murilo Mendes. Ismael Nery
Maria Martins em seu ateliê, em Paris, 1950, cercada das esculturas. O Impossível (a mais famosa, à esq. Da artista, na foto), However, Pourquoi toujours e Saudade. Foto internet, via Casa Vogue

Escultura

Maria Martins foi a única artista surrealista na escultura. “Maria gostava de ser apenas Maria e era assim que assinava suas obras.

Afirmava-se pelo avesso do destino de recatada moça de família. Escultora de talento reconhecido nos anos 1940 pelo crítico francês André Breton, que a integrou ao movimento surrealista (liderado por ele), Maria Martins (1894-1973) participou ativamente da criação da Fundação Bienal de São Paulo, expôs em locais de prestígio na Europa e nos Estados Unidos e tem obras no acervo do MoMA, entre outros.

Com vida amorosa turbulenta, o fato de ser esposa do embaixador do Brasil em Washington não a impediu de viver calientes temporadas em Nova York, onde namorou o pintor holandês Piet Mondrian e teve longo love affair com o artista francês Marcel Duchamp. Este a fez protagonista de sua obra Étant donnés (1944-1964), pedra de toque da arte contemporânea e fonte de percepções simbólicas”

Fonte: Casa Vogue

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Da janela indiscreta às flores nas janelas que revelam o morador

As lentes da máquina não são mágicas e nem conseguem saber mais.

Essa janela aberta, diante de outra janela, desperta a curiosidade de quem está do outro lado descobrir quem é o moço que trabalha com persistência para deixar a casa pronta  para o morador se instalar.

Flagrante feito por Mari Weigert, em Roma (2012), Itália, de uma janela para outra.

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Uma janela que revela a alegria de seu morador nas traquitandas escolhidas para colorir e celebrar a chegada da primavera e do verão na Europa. Foto por Mari Weigert, Murano (2012),Itália.

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Não faltam flores a essa janela que devem encher de alegria o coração de quem vive na casa. Foto por Mari Weigert, Amélia, Itália (2012).

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Abaixo a ditadura da estética arquitetônica e viva a roupa lavada que seca pendurada no varal da janela da fachada da casa para aproveitar o sol benfeitor.As fachadas antigas italianas não respeitam isso não!  Seus moradores alheios às pieguices da modernidade aproveitam os raios de sol para deixar a roupa limpa, seca e cheirosa. Quem foi o arquiteto que começou com a história de não permitir varais pendurados na janela. São tão especiais que dão colorido e autenticidade à paisagem urbana. A simetria cansa os olhos.

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Cadê as flores?

Fotografar janelas é fascinante porque deixa o fotógrafo viajar pelas lentes e na imagem captada imaginar quem é o dono da janela que deixa a luz entrar naquela casa…

 

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O dia que cruzei com Deus

'Acredito no poder da oração por meio da ação'
‘Acredito no poder da oração por meio da ação’

Por Luiz Ernesto Wanke –

Que gelo!

Era um dia tremendamente frio, com um ventinho gelado, daqueles de congelar o dedão do pé. As gotículas de umidade dançavam em minha frente num balé desorganizado. Mas eu não estava nem aí para o tempo, bem instalado, dentro do carro ainda quentinho, esperando a cara-metade sair do seu trabalho na escola.

A rua estava deserta, mas não por muito tempo. Lá no fundão começou a se formar a imagem de uns vultos ao lado de um carrinho e que logo deu para identificar uma criança zanzando em torno do rude veículo puxado a muque, carregado de restos de lixo. Como não tinha nada para pensar, fiquei refletindo sobre a vida dura daquelas pessoas, trabalhando tanto nestas condições, possivelmente só para poder comer alguma coisa.

Mais perto, pode distinguir melhor aqueles vultos: o adulto puxava a carrinho, sua mulher, passivamente mais atrás e o garotinho espantando o frio, correndo, brincando, atirando pedras em direção a um cachorro sarnento, atravessando a rua e subindo pelos barrancos. Eu, diante de uma escola, fiquei matutando se aquela criança teria o direito de aprender como qualquer aluno ou teria um futuro tão cruel como de seus pais. O que estaria reservado para seu futuro: ser um trabalhador do bem ou virar um marginal?

Mais perto, vi que o garoto estava com uma camisa ruída, tipo social, maior que seu dorso, fazendo com que um dos lados ficasse a descoberto… Naquele frio? Meio peito estava exposto, provavelmente pela falta de botões.

De repente, pensei que podia ajudá-lo.

Pai de quatro filhos homens, em diversos estágios de idade, tinha em casa camisas sobrando e de vários tamanhos. E mais, o guarda-roupa estava entulhado de peças boas com finalidade de atender as gerações mais novas.  Mas o detalhe é que os destinados às odiavam e não queriam saber dos sinistros planos dos seus pais.

Como professor, fiquei matutando o que eu mesmo dizia para meus alunos, ou seja, que acredito na oração através da ação.

Não acho de nenhum valor quando alguém entrega como doação os entulhos que estão entupindo a casa. Para que um bem dado tenha valor como oração, deve custar algum sacrifício para o autor. Exemplificava que é fácil se desfazer de uma camisa rota que não se usa mais… O difícil é entregar aquela camisa preferida, domingueira, que ao doá-la, seu coração vai junto.

Enquanto meditava, a família passou.

Caí na realidade. Pensei: puxa, não tenho nenhuma aqui! Não poderia ir até em casa, – muito longe – só para pegar uma camisa… E não sabia onde eles moravam! Definitivamente, não dava…

Quando olhei pelo retrovisor, tinham desaparecidos.

Paciência!

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Só mais tarde percebi que Deus tinha passado por mim, estendido sua mão e eu, covardemente, fingi que não O vi…
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Surrealismo como símbolo contra a ditadura da razão

Salvador Dalí foi o mestre do surrealismo

O surrealismo foi um movimento artístico que surgiu entre as duas grandes guerras mundiais, na década de 20 na França, em tempos conturbados, como um grito de liberdade para criar sem censura.  A ideia  foi do poeta e escritor francês André Breton, que desejava mostrar a loucura da mente humana nas artes e desejava expressar a criatividade artística livre da ditadura da razão.

Artistas como Salvador Dalí, René Magritte, Frida Kahlo, Joan Miró, no início do século XX abriram espaço nas artes plásticas para disseminar o movimento e produziram obras inesquecíveis, que até hoje são sinônimo de sucesso em público nas mostras de arte. Para se ter uma ideia, a página oficial de Salvador Dalí no Facebook tem mais de cinco milhões de curtidas.

Características do Surrealismo

A paixão que universaliza Dalí e o transforma no principal precursor desse movimento somente Sigmund Freud (pai da psicanálise) explicaria. Aliás, as teorias do médico austríaco estavam no auge na época e, portanto, não é difícil intuir que elas influíram nas bases do movimento. Apesar de Freud ter negado o seu envolvimento e ter demonstrado sua perplexidade uma carta endereçada a Breton em 1932.

O manifesto define as características do movimento nos seguintes termos  “automatismo psíquico puro, através daquilo que nos propomos a exprimir, com as palavras ou escritos ou de outras maneiras, o real funcionamento do pensamento. Comando do pensamento sem qualquer controle exercido pela razão, sem preocupação estética ou moral”.

 

Os destaques nos temas da arte surrealista são ligados ao amor, à liberdade dos vínculos sociais pelas regras, mas sobretudo pelo universo surrealista ligado ao sonho e à loucura, que são evidentes sobretudo nas obras de Salvador Dali. Leia mais sobre o artista em Fascínio de Dalí pela pintura em três dimensões.

Um cadáver esquisito gráfico
Um cadáver esquisito gráfico

Uma das técnicas usadas pelos surrealistas é a do cadavre exquis (cadáver esquisito). É um processo criativo que envolve vários artistas simultaneamente e pode ser aplicado tanto a pintura quanto à poesia. Um primeiro artista desenha ou escreve a primeira coisa que vem à mente, sem pensar e passa o seu trabalho para o outro artista que faz o mesmo e assim por diante, até obter obras aparentemente sem significado como a poesia O cadáver esquisito beberá um novo vinhoque deu o nome a esse procedimento.

O que é ser surreal

Hoje o termo surreal foi introduzido no cotidiano e não tão somente no mundo das artes. É muito usado para definir algo absurdo inexplicável.  O ano de 2016, por exemplo, para o Brasil foi surreal – surrealismo às avessas.

O movimento surrealista com certeza permanece no tempo e no imaginário das pessoas por significar exatamente o desejo de liberdade interior. Salvador Dalí e tantos outros que expressaram em sua arte o inconsciente sem as amarras da razão, nos representam em nossos delírios e sonhos. “O homem é livre para exprimir a parte autêntica do ser”.