foto Mari Weigert, Alicante, Espanha

Pensamentos moleques

 "As esquinas são filhas das ruas. Pois elas nascem quando as ruas cruzam".

É um jogo de palavras muito divertido que Eno Theodoro Wanke( 1929-2001) dispôs de sua criatividade para brincar e construir frases bem humoradas e as reuniu num livro: Pensamentos Moleques. Eno era engenheiro civil, escritor, poeta e trovador, muito irônico e espirituoso, que às vezes se assemelhava a um menino travesso. 

Apesar de ser meu primo em segundo grau o chamava de tio porque tinha idade do meu pai e ambos eram muito amigos.  Certa vez, quando nos visitou, para justificar comportamentos meio excêntricos de sua personalidade, contou que a sua psicóloga explicou a ele que era uma célula infantil que não se desenvolveu no seu cérebro. Dizendo isso dava aquele sorriso maroto. Jamais esqueci o recado e fiquei na dúvida se o problema tinha passado para outras pessoas da  família… rsss

O meu destino se encerra num grave e eterno conflito: - meu corpo é feito de terra... meu coração de infinito!

 Com certeza, o coração ou seja as emoções de Eno registradas em seus livros e poemas permanecerão em anos infinitos. Ele foi neto de Marie Weigert Wanke e foi tocado pelo gosto de ler e escrever, assim como muitos de seus descendentes, inclusive eu! Leia a saga da família: Ser Dona de Casa, eu?  I     Viagem de Marie ao BrasilII     Um resgate necessário III   Tributo a Marie IV

Como curto demais a história da palavra fui buscar a origem de ‘moleque’ que significa ‘menino’.  Muleke do idioma quimbundo, uma das línguas banto faladas em Angola era para referir-se a menino e foi estigmatizada no Brasil Colônia, sendo usado de forma pejorativa, para filhos de escravos. 

Mas hoje na linguagem popular significa menino levado, travesso. Quer conhecer os pensamentos moleques de Eno registrados no livro?

Continue lendo e divirta-se com as travessuras que Eno fez com as palavras construindo frases muito bem elaboradas pela sua mente criativa…

“As praias são as toalhas onde o mar se enxuga.”

 

“Estou fazendo planos para escrever minhas memórias póstumas. Só ainda não descobri como, depois de morto, poderei escrever”

“O céu é um eterno domingo, o inferno é repleto de de segundas-feiras”..

“A filha da quiromante entrou, esperançosa, na escola que anunciava: ‘Ensina-se alemão’. Depois de uma semana de aulas, veio, chateada, contar à mãe:´Acho que eu vou desistir, mãe, pois até agora, nada. Eles parecem interessar-se mais por ensinar uma língua esquisita do que a ler a mão´.

“Quando eu morrer, não me venham de espanadores, ventiladores ou aspiradores, pois pretendo ser um pó tranquilo”.

 “Quando morrem, os aviões nunca mais vão pro céu.”

Antes de existirem os relógios todos tinham tempo. Hoje, todos têm relógios…

Melhor perder o trem do que perder a linha.

Felicidade, vantagem que todos querem ganhar, não é bem um fim de viagem, é um modo de viajar!

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Caminhada histórica atrai multidão em Natal e prova que o povo gosta de cultura. Mas cadê os museus?

O natalense gosta de cultura. Disso tenho certeza! A prova foi o grande número de pessoas que participou de uma aula de história a céu aberto, numa homenagem ao Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte -IHGRN e percorreu ruas e praças da Cidade Alta.

Mas quando faço uma análise do número de museus em Natal me deparo com quase nada de espaços culturais que poderiam abrigar pura arte na capital potiguar. Posso contar nos dedos: Pinacoteca de Natal, A Rampa, Câmara Cascudo, dos Minérios e do Forte. Me ajudem se esqueci de algum…

O tradicional Festival Histórico de Natal atraiu um número significativo de pessoas interessadas e dispostas a caminhar pelas ruas descobrindo Natal do passado. Uma aula a céu aberto conduzida por um historiador do IHGRN, dentro de uma espécie de “Trio Elétrico”. Legal a iniciativa , já na sua 12a edição, que mostra que existe público para cultura e arte.

Enfim, o povo compareceu e se for estimulado vai visitar museus com frequência. Falta aqui em Natal mais vontade política para investir na cultura e na arte. Talentos artísticos não faltam e conheço alguns que estão invisíveis por falta de apoio.

Solar João Galvão de Medeiros.abriga preciosos acervos de personalidades políticas e culturais do Rio Grande do Norte.

Quando destaco a falta de vontade política envolvo o município e o estado. Todos são responsáveis! 

Cadê o Museu de Cultura Popular Djalma Maranhão fechado para reforma há alguns anos. Cadê?

E o Complexo Cultural da Rampa que oferece um espaço de aproveitamento magnífico, à beira do Rio Potengi, com um por do sol de ‘tirar o fôlego’, atualmente tão mal aproveitado. Quase às moscas! Leia aqui Complexo Cultural a Rampa tem um potencial incrível

Natal de 1599  deixou poucas pegadas, quase apagadas, entre as quais o Forte Reis Magos, fortaleza das mais imponentes do Brasil que resiste ao tempo e ao movimento das marés.

Nosso foco é a Cidade Alta, o percurso da caminhada. Começou na  Praça André de Albuquerque, na frente da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação e passou por uma série de monumentos arquitetônicos….

Igreja Matriz foi a primeira igreja construída no estado do Rio Grande do Norte – 1599 . Toda igreja tem uma história interessante e a Matriz potiguar não fica para trás. Tem o achado da imagem da Nossa Senhora da Conceição e um recado dizendo que “onde a imagem chegar nenhuma desgraça acontecerá” Confira aqui

Hoje é a Pinacoteca de Natal, mas já foi sede do governo  em 1902.  A sede do espaço de artes que vale a pena visitar foi inaugurada em 1873 e dentro desse passado histórico representa a maior expressão da arquitetura neoclássica da capital potiguar.  Uma arquitetura com simplicidade, proporcões equilibradas, colunas e frontões inspiradas na greco-romana e fachadas imponentes.

Palácio Felipe Camarão, onde funciona a prefeitura da Natal, é uma mistura de estilos projetada pelo arquiteto italiano Miguel Miscussi. Tudo junto misturado, gótico, árabe e Art-Deco, que ganhou até um apelido de ‘bolo de noiva’. Confira aqui

A caminhada acabou em frente ao Teatro Alberto Magalhães – construído no início do século XX e tombado pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 1980. É uma gracinha de espaço cultural que todo o natalense deve frequentar e prestigiar seus espetáculos. É uma miniatura dos teatros em grandes estilos do final do século XIX, com cortinas do palco em veludo vermelho e camarotes rococós e uma entrada que nos dá a sensação de visitar o passado, em concerto clássico, em tempo de óperas,com cavalheiros e damas com binóculos e muita pompa. 

Valeu a caminhada do Festival Histórico de Natal? 

Valeu, sem dúvida, qualquer iniciativa que destaque a cultura é necessária, principalmente depois de quatro anos no limbo, entre 2018 a 2022, sem rumo, no vazio. Acredito na arte e na cultura como meios de transformação social e reforço a necessidade do  Brasil retomar com urgência seus valores e sua poética e não ficar à mercê de uma rede de entretenimento com interesses de um capital que manipula opiniões e alimenta o extremismo. 

Natal tem o privilégio de ter belas praias, um sol que brilha quase o ano todo e uma história que não pode ser esquecida. Mais museus, mais arte, mais cultura!

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Significados da alegoria de Botticelli na obra Primavera

A Primavera, de Sandro Botticelli, é uma das mais belas obras do Renascimento, tanto pela beleza e perfeição do trabalho do artista, quanto pela sua complexa alegoria. Já tive o prazer de apreciá-la no original, por duas vezes, na Galleria degli Uffizi, em Florença. Mas minha vontade é vê-la de novo. Desta vez, com um olhar que viaja pelos detalhes da mitologia.

Significados mitológicos que foram repassados pelo amigo italiano e professor de Letras, Antonio Puleo, de Crotona. Por duas vez observei, no original, a beleza e maestria do trabalho de Botticelli, na pintura, Primavera. No entanto, lendo comentários do amigo Puleo, mentalmente ampliei o meu olhar além do enxergar somente a matéria, a tela,  e percorri os caminhos da alegoria. Resultado disso, intensifiquei meu desejo: compartilhar com vocês leitores do PanHoramarte o que existe por trás da criação de uma obra de arte. Primavera de Botticelli fascina!

Mitologia

autorretrato. Sandro Botticelli

“Esta estupenda tela, em tempera sobre madeira, do fiorentino Sandro Filipepi, conhecido como Botticelli, é do século XV e está exposta na Galleria degli Uffizi. É uma das mais famosas e apreciadas pinturas do Renascimento e foi elaborada, segundo os estudos mais credenciados, por um primo de Lorenzo, o Magnífico.

O assunto é mitológico e lembra o mundo grego / romano clássico. Se você olhar atentamente para o trabalho, à direita você pode ver Zephyr, o vento primaveril, perseguindo a ninfa Cloni, filha de Zeus, de quem ele é apaixonado.

Cloni, no entanto, é inatingível e se transforma em Flora, que é a personificação da primavera. No centro há Vênus, deusa do amor e no alto Cupido….

que lança suas flechas em direção a uma das três Graças.

Finalmente, Mercúrio, que afina as nuvens que ameaçam a próxima primavera.
O significado da pintura é simbólico e misterioso e existem várias interpretações dos críticos, discordantes entre eles”. Fonte: Antonio Puleo. Italiani e oriundi. Dal mondo Arte, cultura, luoghi.

Botticelli

Sandro Felipepi era natural de Florença. Filho de um artesão que curtia peles. Durante sua juventude foi aprendiz de um ourives e ficou conhecido como Botticelli. Por um período foi pupilo de Filippo Lippi, até 1466, com 21 anos.

Em 1475 começa a pintar para os Médici e seus seguidores, realizando as obras mais célebres, todas agora expostas na Galleria degli Uffizi, além dos temas alegóricos: Primavera, Nascimento de Vênus, Palade e o Centauro. Outros sacros como A Adoração dos Magos e muitos retratos da época.

Sua carreira atinge o auge na época dos Médici, Florença, faz três afrescos para Capela Sistina, em Roma e é um dos artistas mais destacados em Florença, sob a proteção de Lorenzo, o Magnífico.  

Quando muda a política e se determina a caçada aos Médici, na crise espiritual influenciada pela sermões de Savonarolao artista decide isolar-se e dedicar-se a obras místicas como a Calunnia degli Uffizi( 1495), a Cruxificação (1497),  Natività Mistica (1501). Botticelli morre quase esquecido e pobre.

 

 

 

 

 

 

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“A Ciranda das mulheres sábias” vale a pena ler

'A Ciranda das Mulheres Sábias' é um livro para refletir sobre o seu papel da mulher diante do mundo. Como a grande mãe, a grande neta, a grande avó, uma grande alma...

Clarissa Pinkola Estés  é autora deste livro de poucas páginas e de fácil leitura. Escritora, poeta e psicanalista Junguiana norte-americana utiliza uma linguagem poética e simbólica, na qual a mulher é o equilíbrio no seu núcleo social. 

Na exaltação do papel da mulher na sociedade, a autora a compara a uma árvore de raízes frondosas que dissemina seus frutos e sua sabedoria para as futuras gerações.

A obra que ilustra a abertura da matéria é "A noiva" - 1862 de Gustav Klimt.. O artista aborda o ciclo da vida, seu crescimento e declínio. É uma obra inacabada. Mostra o homem sozinho, talvez o desejo do macho cercado de mulheres sensuais. Talvez seja somente o sonho da noiva...

A linguagem mágica dessa escritora, poeta, é envolvente do começo ao fim, sobretudo quando inicia o livro com o convite que faz à leitora visitar a sua própria floresta interior, onde irá nutrir-se através das próprias raízes, restaurar-se e renascer para manter o espírito vital de forma a poder gerar novos frutos, aos quais confiará a sua herança inestimável: manter em equilíbrio à sua natureza dinâmica de “ser jovem enquanto velha e velha enquanto jovem”.

– “Numa psique equilibrada, essas duas forças, o espírito jovem e a alma velha e sábia, se mantêm num abraço em que mutuamente se reforçam.

A psique foi construída para ter seu melhor funcionamento, enfrentando dragões, fugindo de torres, dando de cara com o monstro, rompendo encantamentos, encontrando o brilho, lembrando-se da própria identidade… quando é guiada por essa dupla dinâmica.

E o que deveria fazer uma mulher que perdeu o contato com um ou com o outro aspecto dessa preciosa natureza dupla dentro de si mesma, seja o espírito para sempre jovem, seja a anciã conselheira… aqueles aspectos exatos que tornam uma mulher “grande”neta, um “grande” avó, uma “grande” alma?

Imagem gerada por IA
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Receber “a bênção” para viver de verdade…..

Às vezes passamos toda a nossa vida à espera da bênção, daquela que abra totalmente os portões: ‘Ande, sim, viva como um ser pleno o tempo todo, até seus limites mais distantes’.(…) Há quem diga que bênçãos são apenas palavras. Mas, minha filha, tendo em vista sua esperança, sua capacidade para amar, seu anseio pela alma e pelo espírito, sua carga criativa, seu interesse e fascínio por viver a vida plenamente, essa bênção para você não é só “palavras”. Digo-lhe que esta bênção é profecia. Quando uma pessoa vive de verdade, todos os outros também vivem”.

O texto lírico de Clarissa Pinkola Estés é recomendado como leitura e inserido em homenagem a todas as mulheres, de todas as idades, que são mães, não só geradoras de filhos, mas de boas ideias, projetos, criações artísticas, bons exemplos essenciais para a construção de um mundo melhor. Helena Kolody , poetisa paranaense, foi uma dessas mulheres que amou mais de quatro mil filhos ( seus alunos) , aos quais pode transmitir sua sabedoria como professora e poeta.