Jean-Baptiste Debret. 1768-1848,
Mercado de Escravos no Rio de Janeiro
Um dos raros quadros  à óleo produzidos por Debret no Brasil. Fonte: Inst. Ricardo Brennan

Paixão pela arte juntou tudo misturado e hoje é acervo muito interessante

Não importa que é tudo junto e misturado. O que importa é paixão pela arte que inspirou o empresário e colecionador Ricardo Brennand a criar seu pequeno mundo artístico.

Exatamente a réplica de um castelo inglês foi o que Brennad construiu em plena Recife tropical, em Pernambuco. Não confundam Ricardo Brennand (1927- 2020) com o famoso ceramista e artista plástico, Francisco Brennand (1927-2019). 

Ricardo,  que também amava as artes era primo de Francisco, e  aos 92 anos morreu em consequência do Covid 19. O empresário integrou na paisagem da capital nordestina a arquitetura européia medieval em uma área  verde fora da cidade.  Ajustou na sua réplica ao entorno, um ambiente que nos é familiar quando assistimos filmes de época que se passam em castelos na Europa.

 

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O seu amor incondicional pela arte não parou por aí. Fez muito mais. O empresário colocou dentro deste castelo um acervo totalmente original. Muitas peças góticas e medievais, assim como reproduções de obras famosas como o Pensador de Rodin. 

Nossa Senhora da Conceição - madeira dourada policromada. Século XIX
Contador Holandês, século XVIII. Feito jacarandá, com aplicações em marfim e porcelena. Cenas de Amesterdam

Num verdadeiro jogo de paciência, de 50 anos de aquisição de objetos de arte, Ricardo Brennand compôs o cenário interno de seu castelo  com esculturas, pinturas, tapetes, móveis, adagas, armaduras. Estas obras todas, inclusive o castelo, hoje fazem parte do Instituto Ricardo Brennand, que está à disposição do público desde 2008.

São Jerônimo. século XVIII

Um dos destaques na abertura da instituição foi a vinda das telas do pintor holandês, Albert Eckhout, que retratou o que viu no Brasil no século 17: a flora, a fauna, o povo e a cultura de Pernambuco. Os quadros de Eckhout jamais deixaram o Museu Nacional de Copenhagen, na Dinamarca, em 350 anos. Hoje, o Instituto mantém o acervo do nerlendês, Frans Fost. O primeiro artista a pintar panorama nas Américas, a serviço de Maurício de Nassau, segundo Wikipédia

Retrato de Franz Post
Jonatas Medeiros - Tradutor e intérprete de Libras UFPR. Foto cedida pela UFPR

Libras na arte pela manifestação poética de artistas surdos

Um mundo de emoções e significados revela-se nas expressões faciais e corporais dos artistas surdos.

É de deixar atônito o espectador!

Quando representação artística tem tradução para a língua portuguesa, fazendo a conexão entre o ouvinte e o não ouvinte,  é ainda mais fantástico para o público que desconhece Libras. Aguça a sensibilidade pela experiência das mãos no processo de comunicação.

É constatar,  por um lado, a leveza e desenvoltura do artista na sua performance e por outro,  a velocidade que se processa aqueles gestos e sinais que dizem tudo e constroem um pensamento completo.

Libras encerra em si uma beleza estética na  sua forma e essência  e o artista surdo sabe explorá-la com suas emoções.  Na ‘bolha’ em que vivemos não nos damos conta da criatividade e das produções realizadas pela comunidade surda. 

A participação de alguns artistas e da professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Sueli Fernandes, no  tradicional encontro de domingo, dos Estados Gerais da Cultura, foi uma conquista de espaço e interação entre o público ouvinte e o surdo.  Foi histórico e vale a pena assistir no canal do movimento no Youtube: Arte, Cultura e Literatura Surda.

 

Claudio Mourão - artista surdo, professor Dr. da UFRGS

“As mãos, na língua de sinais, produzem as palavras, voam como a velocidade da luz, atravessam a visão do outro, desembarcam no aeroporto dos olhos, automaticamente vão parar no cérebro, explodindo os maiores parques do mundo, onde podem brincar de roda gigante, carrossel, montanha russa. Com as palavras gritando, entre uns e outros, são produzidas linguagens que se conectam além do significante/significado, se tornam signos, e logo nasce o compreender e entender das palavras”.      Claudio Mourao.

Sueli Fernandes, além de acadêmica, desenvolve um projeto em Libras no Museu Paranaense, em Curitiba, e há 28 anos trabalha com surdos.  É militante na defesa dos surdos, uma minoria social estigmatizada e que ainda sofre preconceitos. Libras, por exemplo, tem pouco tempo de reconhecimento linguístico. Foi em 2002 que passou a existir como uma língua nacional de comunicação. A professore, atualmente está abrindo espaço maior para que Libras seja também sinônimo de cultura surda, na arte, no cinema, na literatura, na produção social. O projeto prevê não apenas em dar o direito ao surdo de se comunicar em língua de sinais, mas conscientizar e expandir para produção, consumo, recepção de conhecimento como uma língua partilhada, não só dos surdos.

professora da UFPR, Sueli Fernandes

A artista surda Gabriela Grigolon tem diversas produções no campo da literatura e da poesia. Se denomina slamer,  uma poeta de rua, uma modalidade de arte que começou nos Estados Unidos e aqui no Brasil tem sua própria característica e essa batalha literária de rua é também adaptada para surdos.

Sua apresentação no encontro dos Estados Gerais da Cultura foi  eloquente ou melhor definindo, intensa e emocionante, ao mostrar para o público o quanto a sociedade atual ainda não insere o surdo e não o ouve em suas angústias.

“Meu meu caminho na arte inicia pela minha família que também é envolvida artisticamente, mas no meu caso,  a arte sempre era sem acessibilidade, também vivia angustiada porque tinha um relacionamento abusivo e não sabia como denunciar.” 

 

Gabriela Grigolon, atriz e poeta de Curitiba

“A Libras possui estrutura gramatical própria, portanto, é uma língua. Inclusive é reconhecida como segunda língua oficial do Brasil desde 2002, através da Lei nº 10.436, de 24 de Abril de 2002. O ato de se comunicar através da Libras é fazer o uso da linguagem”. fonte: Libras

 A comunidade reivindica Teatro Bilíngue de Base para começar. “Não se quer uma arte que use da língua de sinais como simples objeto estilístico. Se quer movimentos, legítimos, profundos e não utilitaristas”. Fonte Facebook.

Rhaul de Lemos, tradutor e intérprete de Libras. UFPR

“Estou sozinha, bloqueada, não consigo me comunicar. Eu quero bilinguismo, quero minha língua no meu corpo. Sou muda, sou negra surda”.

Não deixem de assistir o slam de Gabriela para sentir à flor da pele sua angústia e perceber o nosso grau de insensibilidade.

Alguma vez já imaginou como uma pessoa surda pode falar sobre suas dores em um hospital que não tem ninguém que possa interpretar Libras?

Pense nisso!

Imaginem Gabriela Grigolon, gestante, dentro de um hospital sem  se comunicar porque uma sociedade inoperante não sabe o quanto é necessário um intérprete de Libras no local.

Deveria ser obrigatório.,

Tela de Heinz Budweg

A sabedoria dos povos da floresta

Nossas florestas ardem e junto com elas desaparecem as plantas que curam, alimentam e fornecem o conhecimento a humanidade.

Os índios foram fiéis depositórios  deste conhecimento que vem sendo transmitido de geração para geração.  Os Povos da Floresta não escrevem as suas memórias ou documentam os seus usos e costumes. Vivem o presente e a sua sabedoria ancestral é passada como uma espécie de literatura oral de pai para filho. “Kuarajy reike mborayhukõ’eti ombohesakã”, dizem os Kaingang, Guarani ou Xetás. Significa: amar o poente dá a luz ao amanhecer.

 “Amar o poente é buscar o nascente, o nascer. O velho, o poente, é o dono da história, o saber. O homem é a aldeia, o agora. E a criança é a dona do mundo, o vir a ser, o amanhecer. O Guarani é um povo muito místico e todos os dias o pajé-cacique reúne sua tribo na Casa da Reza, para realizar seus rituais pedindo a Tupã a proteção para os mais novos e aos idosos, defumando com o petÿ ou petinguá (cachimbo) os sagrados lados da casa onde o sol nasce e onde se põe” (Fonte: indigenista Edivídio Battistelli).

Tela de Heinz Budweg

 

O Guarani é nômade e sempre caminha em direção ao Leste, em busca da terra sem males. . Na sua mitologia  o conceito terra sem males, o paraíso, é um lugar que é chamado “aguydjê, uvý-nõmimbyré,mbáeveráguasú,mará-ey ou yváy” , denominações com o mesmo significado, usadas pelas diversas tribos que compõem este grande grupo linguístico. Um mundo singular, onde o homem é totalmente livre e as regras da vida são trilhadas por tradições milenares, obedecidas espontânea e instintivamente por todos.

Alguns homens brancos brasileiros que viveram com os índios ficaram irremediavelmente apaixonados pela sabedoria das tradições e pela pureza de espírito destes povos da floresta. Os irmãos Villas Boas estão neste rol http://veja.abril.com.br/noticia/celebridades/em-xingu-os-irmaos-villas-boas-sao-herois-imperfeitos. Sem dúvida, são os mais ilustres. A eles devemos a criação da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e a demarcação de áreas para os índios viverem pacificamente, apesar de existirem ainda conflitos entre índios e gananciosos brancos.

 

O artista alemão Heinz Budweg, nascido e Berlim e desde 13 anos vivendo no Brasil, atualmente em São Paulo, colocou em pauta o tema índios brasileiros, principalmente da Amazônia, na agenda de arte internacional quando mostrou seu trabalho lá fora. Heinz foi responsável pelo texto e ilustração do material Xingu e seus mistérios, material distribuído por ele e pela Fundação Nacional do Índio, na década de 80. Magnífica pesquisa apresentando em ilustração e texto, as comunidades indígenas do Parque Nacional do Xingu e seus usos e costumes. Este foi apenas um dos diversos trabalhos artísticos e pesquisas do alemão-brasileiro sobre o Brasil e a sua gente.

O indigenista paranaense Edívio Battistelli é outro que tem um caso de amor incondicional à causa indígena. Entre 1994 a 2003, criou a Assessoria de Assuntos Indígenas durante o Governo Lerner e colocou na pauta governamental o tema índio no Paraná. Durante o período que atuou na Funai, hoje está aposentado, implementou projetos que garantiram buscam a dignidade e a  manutenção das culturas dos Guarani, Kaingangs e Xetás em território paranaense.