A arte de Angelo Campos é contundente, fere, agride a quem não quer enxergar uma realidade que é parte de um Brasil sem oportunidades.
Seus murais dialogam com a pobreza, violência, dor, abandono, numa explosão de cores e sensibilidade nas expressões e nos traços. Uma arte visceral. Um grito que sai das entranhas para denunciar a fragilidade da criança, da mulher, do negro, índio, das minorias que sofrem pelo preconceito numa sociedade injusta e desigual.
É correto dizer que são murais porque Angelo faz questão de destacar que não é grafiteiro e sim, muralista. “Na verdade sou muralista e venho de influências e inspirações ligadas a Diego Rivera, Cândido Portinari (Retirantes)”, frisa.
“O grafite está em toda a manifestação daquilo que se projeta numa parede, num muro, no sentido de marcação de território que surgiu na década de 70 nos EUA, seja qual for o material. O Brasil acabou associando o grafite ao spray, que é uma ferramenta a mais, adicionada à arte. Desse modo, como meu trabalho é muito mais conceitual do que marcação de território, eu sou muralista. Me denomino muralista fauvista”.
Sem dúvida a obra de Angelo Campos é exclusivamente conceitual e fala por imagens, no entanto, ele faz uma mixagem do muralismo com o grafite, especialmente porque o grafite possui hoje uma identidade também vinculada ao conceitual. Basta lembrar das pontuações feitas por Banksy nas críticas sociais sobre política, ambiente, consumo, capitalismo, guerr
A diferença é que o grafite muitas vezes tem cliente. No artigo publicado no PanHoramarte, Pixo é engajado, pichar é chique e grafite é imagem, a autora do livro “Uivo dos Invisíveis“, Bebeti do Amaral Gurgel, trata das diferentes performances da arte de rua .
#GrafiteTemCliente #ARuaGrita #OsMurosChoram #BanksyPerturba #PobreForaRicosDentro #OutdoorSimPixoNão….
– Uma cidade muda não muda.
Apesar de afirmar que Uivo dos Invisíveis é uma obra de ficção, a autora ao mesmo tempo confirma que fez o possível para garantir informações corretas. O livro é um documento de pesquisa sobre arte de rua, sobretudo no Brasil, prefaciado pela Filósofa Márcia Tiburi, que coloca em pauta a importância da fala por imagens e signos nos espaços urbanos.
Uma cidade muda não muda
Concordo com a autora que uma cidade muda é engessada. Cidade precisa ter voz e dar espaço a quem não tem nos meios institucionais.
A arte dá movimento nos espaços públicos urbanos, seja com grafite ou com os signos da pichação. A periferia tem na rua o lugar para legitimar seu grito de rebeldia. Assim como o teatro mambembe, malabaristas, artistas circenses, músicos têm na rua o palco para suas atuações.
#OsMurosDenunciam
Angelo Campos, este carioca que vive na comunidade da Penha, no Rio de janeiro, reconhece na arte seu trabalho e uma forma de mostrar ao mundo o que mundo não quer ver. “Fujo dos padrões do que é aceitável e o que agrada o público. Percorro um caminho totalmente inverso”.
Os murais de Campos trazem o olhar de fora para dentro da favela. A tristeza é visível quando fala sobre o que viveu. As lutas e as dificuldades e sobre alcance do reconhecimento por suas obras.
“Tudo que vivi, o meu aprendizado, o que o meu País fez por mim ou o que não fez, não faz sentido para as pessoas. Ninguém das grandes instituições me convidou. Talvez porque tenho um diálogo muito direto e a gente sabe que infelizmente existem pessoas que não querem ouvir a verdade”.
“Acima de tudo vivo numa comunidade pobre, sofro junto com a comunidade, vim de histórias também de dores e tristezas da minha família, assim como qualquer outro morador daqui. Mas acho que o pessoal poderia abrir um espaço para eu poder me expressar, mostrar como eu vivo, eu sobrevivo e como meu país me trata”
Angelo Campos participou de uma intervenção artística em Dresden, na Alemanha, na Campanha contra o Câncer, por intermédio do Instituto Moço Arte, de dança contemporânea, do Brasil.
A entrevista sobre a visita a Alemanha poderá assistida no Youtube: aqui
Como artista da periferia nunca foi fácil garantir uma renda pela arte. Em seu desabafo acusa todos os governos ao longo destes anos. Afirma que tem muito artista premiado e reconhecido lá fora que não consegue sobreviver pela arte no país. “O Brasil não dá espaço para todos os artistas. Somente para os que são mais convenientes em gostos, opiniões políticas, críticas sociais “, afirma. “Sou um artista que trabalha muito e que vive da arte comercial totalmente diferente da minha identidade artística, dirigida mais para salões e exposições. É difícil viver num país que não consome todo tipo de arte”
As intervenções artísticas de Angelo Campos são tocantes, fortes, marcadas pela sua sensibilidade e emoção diante da vida. O painel que fez na comunidade para conscientizar sobre a importância do uso da máscara na prevenção contra o coronavírus foi uma reação sua imediata após a morte de familiares pelo Covid 19.
“Fiz este painel assim que enterrei minha avó”, conta ele. A imagem é da Associated Press (AP), foram captadas por Silvia Izquierda e apareceu em mais de 40 países e foi cedida pelo artista para os leitores do PanHoramarte.