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Violência verbal e ódio online têm raiz numa guerra cultural

Quais são os limites da discussão em rede?

Leis restritivas ou liberdade de expressão às manifestações de ódio, violência verbal e as diferentes formas de discriminação – racial, política, interpessoal e homofóbica? O que é mais importante na proteção do ecossistema digital ou a garantia de um fluxo ininterrupto do pensamento sem a intervenção politica e de governo?

Giovanni Ziccardi, na Itália, e João Cézar de Castro Rocha, no Brasil, estudaram desenvolveram teses sobre o assunto. Ziccardi coloca como alvo principal em sua pesquisa uma análise focada na jurisprudência e dentro das leis como conter este ‘Tsunami’ de mentiras e agressões virtuais que hoje é comum no ambiente da web. O escritor brasileiro trata a questão como uma guerra cultural, com base na realidade brasileira depois do golpe que derrubou a presidenta Dilma Roussef e colocou no poder um presidente que se elegeu pelo ‘gabinete do ódio’.  Na verdade, Castro Rocha busca a raiz , a causa do problema, que uma construção de uma corrente de pensamento que surgiu nos EUA.

O advogado escritor italiano Giovanni Ziccardi, em seu livro ‘L’odio online. Violenza verbale e ossessioni in rete’ (sem tradução para o português), mostra o perigo que se corre em um contesto democrático, em aplicar normas contra ‘hate speech’ (discurso de ódio), em uma situação de emergência, para disciplinar outros âmbitos – terrorismo, difamação- com o risco de abrir , ao mesmo tempo, uma lacuna a perigosos poderes discricionários e a um controle arbitrário do pensamento que circula na rede. Ziccardi é advogado, jornalista e professor orientador da Faculdade Jurisprudência, da Universidade de Milão. 

“PREVENIR, EDUCAR E SANCIONAR são as três palavras que muitos argumentam para começar a afrontar o quadro atual”, recomenda ele. Uma parceria entre governos, representantes da sociedade civil, talvez ordens e instituições internacionais seriam ventiladas como a única solução para tentar diminuir a proliferação dos discursos de ódio, sobretudo online.

Ele alerta também que existe um consenso social ao ódio. Lembra da Segunda Guerra que mostrou ao mundo uma nova forma de ódio e isso fez com que se refletisse sobre o tema. “Em um quadro quase igual, o temor agora é da normalização das agressões, em um nível de tolerância altíssima nas expressões extremas”.

mensagem no Pavilhão do Egito, Bienal de Veneza de 2015

“Guerra cultural e retórica do ódio e país pós-político(…)O que está em jogo não é mais visões de mundo contrárias,  propostas diversas de governo, concepções distintas de como organizar a sociedade. O que está em jogo na guerra cultural norte-americana, é a ideia que existe uma essência, uma verdade absoluta, que deve ser defendida por todos os meios possíveis e todo aquele que se opõe a essa verdade absoluta, não é apenas um adversário, é um inimigo, cuja eliminação é legítima.

Conclusão de seu pensamento: “Precisamos inventar linguagens, criar pontes entre nós e a sociedade e não disputar narrativas”. 

Assistam a explanação do escritor, para estabelecer pela ética do diálogo,  um novo momento político brasileiro e vencer a retórica do ódio.

João Cezar de Castro Rocha é escritor, historiador, enxadrista e professor de Literatura comparada da UFRJ. Considerado um dos intelectuais mais importantes do Brasil da atualidade, seus estudos concentram-se na contribuição mimética para o contexto cultural da América Latina, bem como a discussão da atualidade do movimento antropofágico e dos escritos de Machado de Assis no momento contemporâneo.

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História da Caricatura Brasileira. Parte II

Prossigo aqui com a segunda e última parte da entrevista que realizei com Luciano Magno – pseudônimo de Lucio Muruci, pesquisador –  que desenvolve um trabalho sobre a história da caricarura brasileira, em uma coleção de livros e exposições.

O trabalho, além de uma notável pesquisa é uma pequena aula de empreendedorismo.

Primeiros passos do projeto do livro

Wallace: Com os recursos do patrocínio você registrou uma empresa, uma editora (Gala Edições de Arte) especialmente para realizar a coleção sobre a caricatura brasileira. Em determinado momento você editou um catálogo de exposição que ocorria no RJ, a fim de dar visibilidade a editora e ajudar a conseguir espaço para captar patrocínios. Foi uma ação pensada ou de oportunidade?


2-slide-show-premio-jabutiFoto: prêmio Jabuti

Magno: Na verdade a Gala Edições de Arte foi criada para realizar inúmeros projetos editoriais, inclusive a coleção sobre a caricatura brasileira.  Mas a captação de patrocínio veio depois, como conseqüência do nosso trabalho e esforço. Creio que a realização do 1º Festival de Humor Gráfico foi determinante como currículo e trajetória para conseguir posteriormente o patrocínio da Petrobras para a obra História da Caricatura Brasileira.  Mas era inegável também a força desse projeto histórico de resgate da memória nacional, tanto que passou numa Seleção Pública da Petrobras, concorrendo com quase 4000 projetos, como já mencionado.

No projeto todo, recupero a história de vida e da obra de mais 300 célebres caricaturistas.

Em determinado momento editamos nosso primeiro livro: “Nova Escultura Brasileira”, lançado em 24 de janeiro de 2012. Um livro de arte, em grande formato, 31 x 24 cm, de luxo e colorido, em 214 páginas, em que a Gala Edições assinou a Produção Editorial, realizada junto com a curadoria do arquiteto e artista plástico Alexandre Murucci, sobre a nova produção artística da Escultura no Brasil.  Esse Livro-Catálogo registra a exposição homônima, realizada no Rio de Janeiro, no Conjunto Cultural da Caixa Econômica Federal, de novembro de 2011 a janeiro de 2012, com 90 artistas do porte de Estela Sokol, Tiago Carneiro da Cunha, Erika Verzutti e Efraim de Almeida.  Esse lançamento demonstra nossa vocação para editar livros de arte no Brasil.

Divulgação

Wallace: Desenvolver sites e material impresso promocional foram facilitadores para você conversar com a mídia, “antes da fama”?

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Foto: catálogo 1a Bienal Internacional de humor

Magno: Tanto o site quanto o material impresso promocional ajudam no diálogo com a mídia, mas em nosso caso, ter a própria obra História da Caricatura Brasileira impressa e lançada foi determinante. Encaminhamos para cada redação de jornal 1 ou 2 exemplares da obra, e a magnitude e a atração do livro foram tão grandes que todos os jornais do Brasil reconheceram a importância da obra.

Mídia espontânea

Wallace: O primeiro volume da coleção sobre caricatura brasileira foi eleito um dos melhores livros editados em 2012, pelo jornal O Globo. A partir daí você conseguiu espaço na mídia de modo espontâneo, além de fazer palestras e lançamentos do livro no Rio de Janeiro e São Paulo. Esses eventos de apoio ao projeto foram uma das exigências dos patrocinadores (Petrobras), mas você acha válido incluir essas ações, por conta própria, em projetos semelhantes?

 


Não se deve considerar erros uma coisa ruim, eles fazem parte do aprendizado. O brasileiro, não está acostumado a essa ideia.

 

Magno: Vou começar respondendo pela última parte da pergunta.  É claro que esses eventos de apoio – palestras, debates, workshops que fiz –, sobre a obra, são importantes, tanto que fiz em quantidade maior do que era necessário para agradar os patrocinadores Petrobras, Eletrobrás e Suzano Papel. Sempre acho válido e fundamental incluir essas ações em projetos semelhantes.

Quanto a questão da divulgação na mídia, a obra conseguiu mídia espontânea mesmo antes da consagração do livro como um dos Melhores do Ano, o que foi muito bom e somos muitos gratos por esse reconhecimento.

3-slide-show-trofeu-premio-jabutiFoto: troféu Jabuti

Bastidores da obra

Wallace: Mas nem tudo foram flores. Você como qualquer empreendedor, pode ter tomado algumas decisões erradas. Faça um mea-culpa e cite alguns erros que um empreendedor da área cultural deve evitar ao empreender um projeto.

Magno: Não se deve considerar erros uma coisa tão ruim assim.  Erros fazem parte do aprendizado e da evolução de qualquer trabalho. Servem como lição, e a partir deles produzimos um trabalho melhor.  A vida é um eterno aprendizado.

O brasileiro, me parece, não está acostumado a essa ideia, mas em grandes empresas e universidades no exterior se trabalha muito fazendo experimentações, com pesquisas, errando muito, até que daí chega-se a uma grande descoberta e surge uma criação maravilhosa.  Lá eles tem noção que a área de pesquisas, testes, com muitos erros e acertos, é fundamental para que uma invenção, um conceito, um produto, prospere, seja vitorioso e chegue ao mercado como algo bastante inovador e criativo.

Como uma descoberta científica, a obra História da Caricatura passou por várias fases, até chegar ao grau de excelência que ora se apresenta.

Caminhos das pedras

Wallace: Se você fosse dar conselhos a quem deseja desenvolver um projeto cultural, qual seria o caminho das pedras (etapas que devem ser percorridas para “pôr o bloco na rua”)?

Magno: Para mim, não existe um caminho das pedras tão pré-definido assim. Mas é importante atentar para algumas questões:  Acredito que o sucesso “é muitas vezes questão de foco”, ser objetivo em relação ao que se almeja. Dar o máximo de si e buscar a qualidade máxima sempre, a excelência. E tem uma frase de Walt Disney que sigo como meu lema, pois ele dizia, que apesar das adversidades, é importante: “Continuar seguindo em frente”. Quanto a tramitação burocrática de um projeto cultural, os Manuais do MinC e técnicos culturais estão aí com suas dicas nos sites e blogs.

Wallace: estudo (doutorado, bolsa de pesquisas) ocorreram em paralelo ao projeto da coleção de caricatura. é possível conciliar projeto, resultados e estudos ou “a necessidade é a mãe da invenção”?

Magno: É possível, sim, conciliar projetos e estudos, mas, de fato, tem que se fazer um esforço mais esmerado. De fato, muitas vezes a “necessidade é a mãe da invenção”. Mas acho também que o importante é aproximar estudos da área aonde se trabalha pragmaticamente. Foi o meu caso, estudava a história dos caricaturistas fora, no trabalho, quanto dentro da universidade.

A história da caricatura brasileira: considerações finais

Wallace: Há alguma coisa curiosa ou relevante que aconteceu no projeto do livro da caricatura e que gostaria de citar?

Magno: Fato importante, a própria descoberta da primazia da charge do periódico O Maribondo, em 1822, como a primeira caricatura brasileira, fez mudar todo o arcabouço dos marcos históricos do nosso trabalho, e por conseqüência, da história da nossa caricatura.

O primeiro volume da obra História da Caricatura Brasileira  acabou refundando a caricatura no Brasil, estabelecendo novo marco inaugural e fundador dessa arte no país, reconhecendo a charge publicada no periódico pernambucano O Maribondo como a primeira caricatura brasileira, reinaugurando a data da caricatura no Brasil para 25 de julho de 1822. Ao mesmo tempo, destaca a fundamental importância, também precursora, da magnífica série de estampas caricaturais de Manoel de Araújo Porto-Alegre, um marco dessa arte em nosso país.

A obra propõe reavaliações, introdução de novos marcos históricos e de personagens que haviam ficado de fora dos estudos anteriores, até mesmo no livro “História da Caricatura no Brasil”, obra clássica do escritor cearense Herman Lima, publicada em 1963.

No projeto todo, recupero a história de vida e da obra de mais 300 célebres caricaturistas. Muitos deles eram apenas mencionados em estudos anteriores e outros nunca figuraram neles.

Wallace: Alguma que gostaria de acrescentar?

Magno: Quero agradecer a oportunidade da entrevista e gostaria de lembrar que a dedicação e o amor ao que se faz é muito importante. No meu caso, a dedicação à essa arte, a arte da caricatura, é integral. Mas em todos os projetos e profissões na vida também vale esse mesmo exemplo, inspirado num ídolo meu e dos brasileiros em geral, Ayrton Senna, que certa vez disse: “No que diz respeito ao desempenho, ao compromisso, ao esforço, à dedicação, não existe meio termo. Ou você faz uma coisa bem-feita ou não faz.”

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Cinema reflete a realidade e faz dela um sonho

 

A cineasta francesa Claire Denis encontrou no cinema um modo de viver  o sonho.

“O cinema reflete a realidade, mas se comunica como algo da imaginação, como um sonho”, afirmou a cineasta sobre a sétima arte, e disse mais: “a vida é real e precisamos acrescentar bastante fantasia para aguentar o que é insosso nela”.

Sagaz, sensível, a cineasta confessa que chegar ao limite, até a fronteira do desconhecido  sempre foi  para ela algo instigante ou irritante. Uma ideia mágica. Um de seus filmes “O Intruso” – a  história de um homem de 70 anos, que precisa fazer um transplante cardíaco para continuar vivendo, ultrapassa a fronteira que tanto a fascina.

“Um coração que penetra nas fronteiras internas das defesas do corpo humano”.

Claire Denis revelou que não tinha vontade de escrever o roteiro na época. O filme foi lançado em 2004, no entanto depois  que leu o livro do filósofo Jean-Luc Nancy sobre imigração na França, que relata a sua própria experiência com um transplante cardíaco feito há mais de 15 anos, pediu autorização para escrever o cenário. “Vou tentar fazer uma ficção, escrever essa viagem de alguém que vive com a morte do outro”, contou.

O Intruso

“O Intruso” para ela  foi o filme mais  difícil de fazer de todos outros que produziu. Segundo revelou, é mais fácil fazer a pesquisa de qualquer outra história, do que filmar uma operação cardíaca, sobretudo quando ela própria se obrigou a assistir de fato para realizar as cenas. “Impressionante ver o cirurgião abrir o peito, afastar as costelas e no meio tem um coração, que depois de ligar as artérias num tubo, é jogado no lixo e em seguida pegar outro novo dentro de uma caixa de sorvete, como aquelas que levamos a um pic-nic. É como assistir Ilíada e Odisséia, de Homero”, relata.

“O cirurgião não percebe essas sutilezas que um ser humano normal sente ao ver um peito vazio e ver também um outro coração. É coisa pavorosa”, entendeu. “Não vou filmar isto porque para filmar precisamos abrir o peito do ator, é melhor abrir o filme e fazer uma elipse sobre a história”, pontuou.  Filha de pais franceses e nascida e criada na África, agora com mais de 60 anos diz que fazer um filme não a torna mais forte, ao contrário, a deixa mais frágil e sensível.

A Chefe

“Quando comecei a fazer filme me sentia a chefe. Com o desenrolar das cenas a situação gira lentamente e se apresenta de fato.É nesse momento que  a minha relação  de poder com ele fica cada vez mais fraca. É bom porque muda a relação de estar possuindo para compartilhar sentimentos  e devaneios”

Ao explicar o que entende por documentário, é categórica e afirma que um documentário não é reportagem, exige do diretor um risco, uma aventura, exploração e participação. “O documentário deve ir além da simples curiosidade”.

Para definir o seu conceito da fronteira entre a ficção e realidade, ela dá o exemplo de alguém estar sozinho no cais,  na beira do Tejo, em Portugal, perto da Torre de Belém, sentado numa manhã de vento e vê um ponto escuro no horizonte, um transatlântico chegando.

“O tempo que leva para o navio de luxo chegar gira lentamente na mente. É nesse momento que começa a ficção. Aí ele pode escrever fantasias, a história inteira de Portugal, conquistas, descobertas, no fim desta poesia o barco chega ao porto e nisso passou-se uma hora. Essa é a ideia mágica da fronteira”.

  • reportagem republicada do PanHoramarte baseada na palestra de Claire durante o encontro de jornalismo cultural, em São Paulo, em 2011.
Filmes de Claire Denis:

> Chocolate (Chocolat, 1988). Jovem francesa retorna para Camarões, onde viveu com sua família, para contemplar e relembrar a infância.

> Dane-se a Morte (Se’en Fout la Mort, 1990). A vida de dois irmãos imigrantes da África que vivem de rinhas de galo no subúrbio de Paris.

> USA Go Home (US Go Home, 1993). A história de duas adolescentes parisienses, uma festa e as tensões sociais e sexuais que envolvem o evento.

> Noites sem Dormir (J’ai pas Sommeil, 1994). Um mosaico da juventude contemporânea numa Paris multicultural, violenta e obscura.

> Nénette e Boni (Nénette et Boni, 1996). Dois irmãos de criação tomam rumos diferentes, se reencontram e agora terão de se redescobrir.

> Bom Trabalho (Beau Travail, 1999). Um passeio coreográfico pelo campo de treinamento da Legião Francesa, no nordeste da costa africana, que mostra o universo repressor e os conflituosos sentimentos de um sargento. Livremente inspirado no romance Billy Budd, de Herman Melville.

> Desejo e Obsessão (Trouble Every Day, 2001). Americano que vai passar lua de mel em Paris começa secretamente a frequentar uma clínica médica que trata da libido e se deixa levar por perigosos impulsos sexuais. Com Vincent Gallo.

> Sexta-feira à Noite (Vendredi Soir, 2002). Presa num engarrafamento, mulher observa o caos da cidade de Paris e oferece carona para um estranho.

> O Intruso (L’Intrus, 2004). Homem de 70 anos que mora sozinho com seus cachorros em uma floresta entre a França e a Suíça precisa de um transplante de coração e vai até o Taiti procurar o filho que abandonara muitos anos antes.

> 35 Doses de Rum (35 Rhums, 2008). Releitura do clássico Pai e Filha, do diretor japonês Yasujiro Ozu, sobre as tensões sociais a partir da relação entre um pai viúvo e sua filha na periferia de Paris.

> Minha Terra, África (White Material, 2009). Em um país africano não definido e que vive em guerra constante, mulher branca se nega a deixar para trás sua plantação de café e passa a correr risco de ser assassinada pelos rebeldes. Com Isabelle Huppert

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História da Caricatura Brasileira. Parte I

Lucio Muruci, que assina sua obra com o pseudônimo de Luciano Magno, é sociólogo, com doutorado em História Social da Cultura e sempre envolvido com o tema da Caricatura Brasileira.

Esta é a primeira parte de uma entrevista que fiz com Lucio. Como sempre costumo fazer, meu o objetivo é mapear parte da trajetória do entrevistado num empreendimento vencedor ou digno de nota; neste caso a coleção de livros A história da caricatura Brasileira, para mostrar os bastidores desse trabalho e  registrar este caso de sucesso.

O primeiro volume da coleção sobre caricatura brasileira foi eleito um dos melhores livros editados em 2012, pelo jornal O Globo

A caricatura no Brasil: o livro

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Mais do que entretenimento, é um dos retratos de uma sociedade. Assim como o esporte, a política e a educação são retrato de uma época, a arte da caricatura faz um 3 por 4 dos hábitos, costumes e valores de um povo.

E foi nesse espírito que Magno lançou em 2012 o primeiro volume da “História da Caricatura Brasileira” que pode ser visto no blog da sua própria editora, Gala Edições de Arte, de um total de sete edições previstas.

Um dos grandes méritos do livro é ter um texto agradável até para quem não é fã do tema, além de ser um trabalho de pesquisa que interpreta a história, sem meramente citar datas e descrever opiniões pessoais do autor.

Mas a grande história deste livro não está nas suas páginas, e sim na trajetória de Magno até conseguir editar o livro.

Caricatura, charge e cartum: história com humor

Apesar de não ser um estudioso da área de empreendedorismo, Magno tem muitas dicas e lições para dar, e que provavelmente servirão de inspiração para quem atua na área cultural e deseja empreender nesta área, mesmo não sendo administrador, empresário ou formado em produção cultural. Lições que são válidas para projetos culturais mas se aplicam a qualquer projeto que envolva arte e comunicação.

Wallace: Magno, descreva como está o cenário da caricatura/charge/cartum no Brasil atualmente: os principais artistas e como se ganha dinheiro com essa atividade (mercado editorial, de pesquisa, colecionadores e produção artística).

Magno: O cenário artístico brasileiro, hoje, na caricatura, é bastante diversificado. Mudanças sempre ocorrem.  Desde o advento do rádio, da televisão, e agora da internet, afetando o jornalismo gráfico e fazendo migrar artistas da área do cartunismo jornalístico impresso para outros veículos.  É natural que a caricatura e o cartum ocupem esses novos veículos online.

De fato, podemos dizer que o Século XIX – com Araújo Porto-Alegre, Cândido de Faria, Agostini, Pedro Américo – e o Século XX – com tantos outros, J. Carlos, K.Lixto, Raul Pederneiras, Seth, Luiz Peixoto, teve a sua época de ouro da caricatura.

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Araujo Porto Alegre: artista e ilustração

Mas a caricatura vem se reinventando e permanece recorrente e conceituada no país, mesmo o mercado editorial aderindo a novas tecnologias de comunicação. Novos artistas como Alpino fazem sucesso em famosos sites na internet. Uma nova geração desponta.  Sites como o chargeonline reúnem a nata da nova geração e alguns da velha guarda da caricatura.

O nível de excelência de nossos caricaturistas, a capacidade que a caricatura têm de retratar o país, a inserção que têm a nível político e cultural, exercendo função crítica, continua recorrente. A tradição do humor, no brasileiro, é muito forte.  A História do Brasil pós-1822 se confunde com essa arte.

O nível das pesquisas acadêmicas na área aumentam, mostrando prestígio do tema.  O reconhecimento em outros níveis, inclusive financeiro, vem com muito esforço, suor e labuta.

Origens do livro

Wallace: Magno, você como todo bom ariano, é persistente, e não desiste de uma ideia até vê-la concretizada. Como surgiu a ideia de fazer a sua primeira exposição sobre caricaturas no Museu Nacional de Belas Artes, em 1993?

Magno: Eu pesquiso a história da nossa caricatura há 25 anos, desde os 15 anos de idade. Comecei, como destacado no prefácio da obra “História da Caricatura Brasileira”, pesquisando alguns grandes artistas, como Luiz Sá, J.Carlos e Seth, caricaturistas brasileiros de importância continental e internacional.

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Luiz Sá

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J.Carlos

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Seth

A ideia da minha primeira exposição surgiu como um desenvolvimento das minhas pesquisas sobre Luiz Sá, daí realizei a primeira retrospectiva sobre a sua obra, no Museu Nacional de Belas Artes, em 1993, chamada “Luiz Sá: Um Caricaturista Brasileiro”, e depois, realizei a minha  segunda exposição sobre o artista, intitulada “Luiz Sá: Cartuns Cinematográficos”, na Funarte, em 1994.

Depois ampliei esse leque com outros artistas, também com a realização do ciclo de exposições que fiz, do “1º Festival de Humor Gráfico”, realizado nos principais museus do Rio de Janeiro, em 2002, e daí aumentei mais ainda minhas pesquisas quando objetivei realizar essa obra monumental que é a “História da Caricatura Brasileira”, cujo primeiro volume foi lançado em 2012, com 528 páginas e 90 capítulos sobre os primórdios e a consolidação da nossa caricatura no século XIX.