Video instalação do artista argentino Sebastián Diaz Morales. Suspension. 2014

Artistas capturam Zeitgeist – o espírito do tempo na Bienal de Veneza

O espírito do tempo está explícito nos pavilhões que representam os países na Bienal de Arte de Veneza, na Itália. O Zeitgeist que Hegel, Heder, Klotz, e outros sábios alemães, usaram como termo para definir a cultura, o clima intelectual de uma época é visível demais, para quem visita o Giardino.

Viva a Arte Viva é o tema desse biênio, que se encerra em 26 de novembro.  É uma exclamação, uma expressão da paixão pela arte e pela figura do artista.

 A 57a. edição reúne 120 artistas convidados, 86 países presentes nos históricos pavilhões, no Giardino (parque), no Arsenale e no centro de Veneza. Dentre esses, estão três brasileiros e também foram incluídos três países novos, Antigua e Barbuda, Kiribati, Nigéria.

Artistas, sempre visionários, dialogam por intermédio de suas pinturas, esculturas, vídeos e instalações e apresentam o espírito da época.  A leitura feita por eles nem sempre é bonita, embora extraordinariamente bela no seu conceito mais profundo!

Giardino

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Fica a critério de cada visitante escolher o início do percurso ou pelo Giardino ou Arsenale. Comecemos, então, pelo Giardino.

Coreia, Japão, Alemanha, Venezuela, Rússia

Os pavilhões da Coréia, Japão, Venezuela e Suíça estão mais ou menos num mesmo sentido, isto é na mesma direção espacial dentro do Giardino, embora cada qual com a sua identidade cultural. É nesse aspecto que se repara o espírito do tempo e as diferenças dentro de cada contexto étnico.IMG_3168

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O pavilhão da Coréia que apresenta o tema Conterbalance, pelos artistas Cody Chol e Lee Wan, esforça-se para responder a seguinte pergunta: como a história individual se relaciona com histórias nacionais.

Como a nossa compreensão desta dinâmica no contexto coreano pode ser relevante para o resto do mundo e esclarecer o futuro. A exposição é estruturada em torno de três quadros geográficos: Coréia, Ásia e o mundo e coloca na balança as tradições antigas e os reflexos da tecnologia.

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Alemanha em suas formas transparentes, sem obras, oferece todos os dias uma apresentação adaptada para arte, Fausto, por Anne Imhof, que recebeu o Leão de Ouro (mas nem sempre o horário coincide para assisti-lo).

O próprio Goethe trabalhou por mais de 60 anos, transformando-o no símbolo do homem moderno, pronto para vender sua alma para alcançar resultados pessoais.

É a segunda vez que a Alemanha tem um pavilhão sem trabalho, sem o fetiche do objeto.

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O Japão esse ano não usa cores intensas como o vermelho do artista Shihary Shiota, na bienal passada com The Key in the Hand ( A chave na mão). Mas o tema é tão intenso no sentido da poética e estimula à reflexão.

O artista Takiro Iwasaki, que nasceu e cresceu em Hiroshima, dentro de um contexto delicado, coloca a sua cultura flutuando no tempo e a destruição com o homem ao centro.

Hiroshima que se foi e uma cultura que permanece flutuando na memória dos que viveram a devastação.
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Venezuela homenageia o arquiteto que construiu o pavilhão no Giardino em Veneza, Carlo Scarpa.

O pavilhão tem 61 anos de construção e foi restaurado como foi concebido por Scarpa. Se analisa o jogo de luz e sombra da ‘magnífica obra do arquiteto’.

“Em um momento em que se lançam tantos e tão graves acusações e demonizações, nada melhor do que a crítica de arte, implacável e absoluta para esclarecer os horizontes”. Diz um dos cartazes.

No interior são colocadas obras do poeta e artista visual Juan Calzadilha.

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A Rússia trouxe para os visitantes um misto de tecnologia avançada e uma crítica velada à sociedade moderna, em especial ao estilo e regime que representou seu país por muitos anos.IMG_3146

‘Em mudança de cena’, fala-se sobre o tempo e que o arcaico emerge no contemporâneo.

“Na história, o novo está sempre preservado a memória do velho. Os gregos recordam os egípcios, os romanos, os gregos, e os homens do Renascimento até agora.

As mais audazes inovações da modernidade pegaram liderança por meio das tradições e das imagens das culturas antigas. As colisões entre o arcaico e contemporâneo é dedicado o meu trabalho”. Grisha Bruskin.

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Austrália e Estados Unidos

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Austrália em ‘Meu Horizonte’ traz a poética da artista Tracey Moffatt, sob a curadoria Natalie King. Tracey se fixa na ‘linha onde o sol beija o mar’. São imagens de fotografia e vídeo em que a artista descreve o momento em que se alcança os próprios limites e nesse mesmo momento a superação deles.

O vídeo motiva pela montagem que Tracey faz usando a expressão de artistas famosos de pasmos e olhando assustados aos refugiados que estão chegando num barco de resgate.

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“Em realidade, requerentes de asilo não é um caso atual: é velho como o tempo. Ao longo da história em todas as culturas, as pessoas estão sempre fugindo além das fronteiras na busca de uma nova vida”. Tracey Moffatt.

Austrália é um país que também recebe muitos forasteiros em busca de uma nova vida.

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No pavilhão americano EUA não se entra pela frente. Está fechado.

A porta de entrada é pela lateral, na qual precisa ser espremer e abaixar para evitar bater em uma grande esfera-instalação, como metáfora o contraste entre aqueles que vivem na ponta e o poder cada vez mais centralizado e iminente.

Dentro, o artista Mark Bradford destaca a figura feminina, como a escultura Medusa.

As três pinturas cercam uma escultura central intitulada Medusa, feita com cordas embrulhadas pretas, para formar um tríptico clássico e contemporâneo em torno do tema da representação feminina.

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Essa Medusa talvez seu próprio país, que devora pelo olhar. A proposição de um altar envolvido pelo petróleo. Quem sabe…

Brasil, Egito, França

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O pavilhão do Brasil me deixa sempre com algo mais que precisa ser dito.

Não sei se porque vivo em território brasileiro e sinto que as obras representam apenas uma parte do que é esse gigante território. Cinthia Marcelle, em Chão de Caça, traz a violência como tema.

Aliás, isso é Brasil, sim. Mas há quase três bienais consecutivas portamos a violência, os nossos problemas sociais ou o passado opressor. 

 

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Certamente, temos muitas pedras e espinhos em nosso chão, sobretudo agora num momento político instável. No entanto, possuímos também, talvez, a maior diversidade étnica desse planeta convivendo num espaço único, num território que abraça diferenças culturais.

Essas diferenças carregam, às vezes, preconceito ou não, com alegria ou tristeza, de norte a sul. Falta… algo fica entalado na garganta quando o visito!

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Egito apresenta um vídeo de 12 minutos, cujo tema é A Montanha, do artista Moataz Nasr. O destaque é a figura feminina que retorna à sua aldeia depois de ter estudado na cidade. A comunidade agrícola é simples e cheia de medos do demônio que vive na montanha.

A mulher encarna a liberdade e tenta destruir o mito.  O que representa, na verdade, são os dois mundos distintos que fazem parte da vida do Oriente. A crença ingênua e poderosa e a liberdade do conhecimento. Mas deixa no ar se essa liberdade consegue destruir o mito do demônio…

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A França esse ano está mais lúdica e dentro de um contexto real. Em Studio Venez_.a, Xavier Veilhan, imagina um ambiente total. “Uma instalação imersão, que revive do universo de estúdio de gravação a inspirar-se na obra pioneira de Kurt Schwitters, o Merzbau (1923-1937).

Músicos vindos de horizontes diversos são convidados a ativar a escultura estúdio de gravação que se coloca como suporte à criações deles durante os sete meses da bienal. O pavilhão propõe uma fusão entre as artes visuais e música, fazendo referências não só Bauhaus e as experiências do Black Mountain College, mas também a Station to Station de Doug Aitken”.

Essas rápidas e superficiais apresentações sobre alguns pavilhões dão uma ideia do universo rico em imagens e símbolos dentro da arte contemporânea.

A liberdade é o impulso que move o artista sem fronteiras ou limites. 

 

 

 

 

 

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Degustando vinhos por Languedoc Roussilon. Série WWOOF

Vida de wwoofers não é só trabalho pesado. Temos nossos momentos de descanso e momentos que de folga que compartilhamos sempre da melhor maneira possível.

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Aqui na Grange de Bouys somos todos aficionados por vinho e umas das coisas que fizemos no nosso primeiro fim de semana de folga foi pegar o carro e ir por ai, para degustar os vinhos produzidos na região. A experiência foi um tanto peculiar: não pelo vinho em si, mas pelo inusitado de toda a visita.

Languedoc- Roussilon é um região vinícola da França, não tão conhecida e que se destaca principalmente por ter uma grande variedade de pequenos produtores com casas humildes e amor pelo que fazem.

 

As visitas que fizemos não foram a grandes Chateus maravilhosos como podemos encontrar em Bordeaux, Champagne ou Borgonha, que têm pessoas designadas para guiar você durante o roteiro mostrando o lindo das suas parreiras, a amplitude da sua Adega e terminando com a degustação de vinhos no restaurante da Adega.

Aqui, os produtores quando aceitam mostrar o seu vinho abrem, muitas vezes, a porta da sua casa. Muitos tem parcelas de vinhos espalhadas pela região, perto de casa mas não ao lado e geralmente utilizam a garagem, ou o porão como lugar para fabricar o vinho.

Isso não significa para nada que o vinho seja ruim ou de qualidade inferior. Tive o privilégio de comprovar por mim mesma que muitos vinhos produzidos assim, tem a mão do produtor em cada processo e a sua artesanalidade aporta um valor – “añadido” – adicionado que nem toda Adega grande faz.

Três lugares

Estivemos em três lugares diferentes. Dois deles fabricavam o vinho na sua casa e degustamos ou na cozinha ou no jardim, e outro tinha uma pequena adega no centro da cidade em que pudemos degustar e apreciar todo o processo do vinho na sua própria adega.

O melhor de tudo é que estávamos diante do próprio produtor, que nos apresentava a sua história e os seus vinhos com histórias completamente novas e inusitadas. Não havia pergunta que não pudessem responder: se notava que cada decisão foi tomada com muito critério e sabendo exatamente o que estavam fazendo.

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Mas Coris

Nossa primeira visita foi a Mas Coris com denominação de origem Languedoc e selo de vinho biológico. Provamos quatro vinhos, entre eles, brancos, rosés e tintos. Eu pessoalmente gostei mais do tinto e do branco jovem.

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O produtor abriu a porta do seu estabelecimento só pra mostrar todo o processo como ele faz os vinhos e abriu garrafas novas pra gente provar. O lugar era simples, mas cheio de encanto. Pudemos perguntar sobre como ele fazia o vinho, a particularidade do vinho dele e todo o resto. Saímos com algumas garrafas, não todas que queríamos obviamente, mas o suficiente.

Deborah e Peter

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Segunda parada foi na casa de uns amigos de Stephane e Florence: Deborah e Peter que têm uma produção de vinhos maravilhosos chamado ‘Mas Gabriel’, um deles com 91 pontos obtidos pelo célebre crítico Robert Parker.

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Deborah e Peter são britânicos, radicados na França há anos. Eles têm toda a produção feita no porão da sua casa. Foi umas das degustações mais curiosas que já fiz em minha vida. Primeiro fomos conhecer a sua adega, onde a produção de 20 mil garrafas por ano em média eram produzidas.

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O lugar era pequeno, mas acolhedor.

Uma das curiosidades foi ver pela primeira vez barris de concreto para estocar o vinho, em vez de aço-inoxidável.

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Ao lado deles, as barricas de carvalho ocupavam quase todo o lugar. Dalí, passamos ao jardim localizado no fundo da sua casa, onde nos sentamos numa mesa , debaixo de um toldo, onde íamos fazendo a degustação de cada um dos seus vinhos.

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Não resisti e tive que comprar dois, um branco e um tinto, também sem carvalho. Quanto mais conheço os vinhos produzidos nessa região mais me convenço que a maioria deles realmente não precisa de carvalho para melhorá-los.

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Deborah e Peter nos contaram que foi um dia jantando em alguma parte de UK que decidiram que iam ser produtores de vinhos.

Buscaram um lugar onde pudessem aprofundar seu conhecimento sobre a produção de vinhos e escolheram a Nova Zelândia como o lugar idôneo. Passaram ali uma temporada e ficaram amigos de produtores da região. Entre eles estava Britany, filha de um casal amigos de ambos que agora estava aqui região fazendo Wwoofing na casa deles.

Cristian
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Por último visitamos a Cristian, uma adega que o Wwoofer alemão Tristan trabalhou anteriormente, proprietário do Domaine Baillat. Esta é outra experiência que vai ficar marcada na minha memória.

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Cristian também é um pequeno empresário, que vem se dedicando ao mundo do vinho há mais de 30 anos. Começou primeiro com o seu irmão e mais tarde seguiu sozinho no caminho da produção.

A casa de Cristian me faz lembrar muito a casa dos meus avós nos pampas gaúcho. Mobiliário simples, aconchegante e com sabor de saudades em todos os cantinhos.

Como todos produtores, começamos a visita pela sua Adega, que também encontra-se no porão ou garagem da sua casa. O lugar é bem maior que o lugar da Deborah e do Peter, também com cubos de concreto para armazenar o vinho; e de aço-inoxidável também.

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Começamos a degustação ali mesmo, provando os vinhos diretamente dos cubos de concreto, de aço e do carvalho. Foi uma degustação super atípica porque de certa forma o vinho não está completo, nem perfeito, mas ao provar dali você tem a sensação de como um vinho pode evolucionar no seu processo até chegar a garrafa.

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Cristian se define como um contador de história, termo muito apropriado depois de ter passado tantas horas com ele na sua adega e na cozinha. Entre taças e taças passamos momentos inesquecíveis de sorrisos, risadas. Sua forma de contar a história do seu vinho, de como chegou ali, de como tomou as suas decisões nos envolve de uma tal maneira que fica difícil dizer adeus a tamanha experiência.

Significado do pequeno empreendedor

Esses três produtores, viticultores, são um imperativo do trabalho que significava ser pequeno empreendedor: gente que se sacrifica muito para se dedicar a um negócio apaixonante e que nem sempre tem retorno imediato sobre aquilo que está fazendo.

Fiquei impressionada em ver como essa gente, com um sorriso singelo e sincero são capazes de cativar-nos nesse pequeno momento que compartilhamos. São pessoas dedicadas de corpo e alma ao seu negócio, e com capacidade para levar esse amor transformado em garrafas a muitas partes do mundo.

Toda a sorte do mundo

Desejo a estes três produtores toda sorte do mundo na sua jornada, porque na suas mãos, nos seus olhares e nos seus sorrisos pude captar a essência de cada um deles. A simplicidade do seu negócio. A artesanalidade do seu vinho aporta mais valor a cada garrafa que se abre e se compartilha.

Languedoc- Roussillon sem dúvida é uma região única na França para quem quer conhecer profundamente vinhos originais, artesanais e sem dúvida inesquecíveis.

Vino, vidi, vici.
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Em nome da liberdade se aprisiona Queermuseu

Vocês sabem o que é Queer? Talvez nunca irão saber porque um movimento brasileiro que levanta a bandeira por um país livre, justamente em nome da liberdade limita a arte, coloca estereótipos e a aprisiona. Estamos falando do fechamento por parte do Santander, da mostra Queermuseudepois de uma série de protestos por parte do MBL (Movimento Brasil Livre).

Nesse grande equívoco o que está em jogo não é a moral e os bons costumes de uma sociedade hipócrita, sim, o poder econômico e manifestações políticas.

O que é Queer?
Bathing 1911 Duncan Grant 1885-1978 Purchased 1931 http://www.tate.org.uk/art/work/N04567
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O significado literal é “estranho, curioso”. Em abril de 2017, o Tate Britain, em Londres, abriu uma impressionante exposição que chamou de Queer British Art, e explica o por quê dela.
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Como muitos museus e galerias da Grã-Bretanha, o Tate também quis comemorar o 50º aniversário da criação da Lei de Ofensas Sexuais, a legislação que despenaliza parcialmente  o homossexualismo masculino na Inglaterra e no País de Gales.
Sappho and Erinna in a Garden at Mytilene 1864 Simeon Solomon 1840-1905 Purchased 1980 http://www.tate.org.uk/art/work/T03063
Sappho and Erinna in a Garden at Mytilene 1864 Simeon Solomon 1840-1905 Purchased 1980 http://www.tate.org.uk/art/work/T03063

A mostra faz uma abordagem histórica, educacional e abrangente e também apresenta um rico repertório de obras de vários gêneros, das ilustrações de Aureu Beardsley, ao drama de Oscar Wilde(1983), Salomé, a poderosa imagem pop dos anos 60 de David Hockney.

 O termo Queer responde à necessidade de escapar de todos os rótulos que, tendencialmente, ou por provocação e ofensivamente, foram utilizados ao longo dos anos para identificar gêneros e identidades que por natureza não se enquadram em uma categoria, mas que, pelo contrário, rejeitam qualquer aspecto do conformismo. (fonte Exibart).
 
Além do Exibart, alguns sites especializados comentaram a atitude arbitrária do Banco Santander e de alguns segmentos da sociedade brasileira. Hyperallergic, The Guardian, entre outros.
Inquisição

A inquisição ressurge no século XXI, com toda a força no Brasil, desta vez a caça tem como alvo o artista.

A arte é testemunho da história e o reflexo da realidade. Independente de partidos ou corrente religiosa, a arte é a manifestação mais sensível do homem. Representa a sua percepção diante do mundo.

É muito triste isso acontecer de forma tão reacionária.

As pessoas têm o direito de não gostar e criticar obras de arte. As pessoas não são obrigadas a apoiar mostras ou eventos artísticos que não correspondem seus aos padrões morais, culturais ou que fogem do conceito de como definem o belo, mas proibir ou coibir a manifestação da poética artística não é só reacionário. É perigoso!

É autoritarismo!

Em todos esses anos de convivência com o mundo da arte, nas diversas viagens pelo mundo afora visitando museus, minha experiência na área de cultura no governo do Paraná, meus estudos na Escola de Música e Belas Artes do Paraná, na Università della Sapienza em Roma, me preocupa uma atitude como essa.

Nesse giro convivendo com a arte contemporânea já vi obras, cujo conceito abordavam temas polêmicos e com imagens muito fortes ou até iguais aos expostos na Queermuseu, nas inúmeras bienais e em anos consecutivos que visitei, São Paulo, Veneza, Curitiba.

IMG_3157Fosse por isso, num momento como esse no Brasil, o pavilhão da Rússia, por exemplo, seria fechado na Bienal de Veneza por agredir a imagem de Cristo.

Jonathas Andrade, na Bienal de São Paulo, 2016, não poderia expor sua obra, um vídeo instalação, O Peixe, pelo olhar de algumas pessoas fere princípios ambientais. A obra faz uma relação entre o algoz e a vítima. Ele acaricia o peixe até o seu último suspiro depois que é capturado.

O vídeo foi mostrado em minha página no Youtube e uma americana insistentemente registrou sua indignação. Ela não aceitava a divulgação e em tom ameaçador disse que não era arte, mas um abuso. Bem, a liberdade de se expressar era dela.

Enfim, não retirei o vídeo da minha página.

Muitas vezes o belo, que não é o bonito, não é igual para todos.

Bonito pode ser aquele quadro que compõe uma saleta de café própria para reunir amigas é falar sobre amenidades. Mas beleza é algo mais intenso.

 “A beleza vem da emoção que temos diante de uma obra de arte quando percebemos o que o artista tenta transmitir. A beleza vem também da sensação de conseguirmos ver o mundo da maneira que pensamos ter sido a intenção do artista”. Cristina Costa.

 

 

 

 

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Vindimando. Série WWOOF

Chegou finalmente o dia que eu estava esperando há muito tempo: a vindima, em outras palavras, a colheita da uva.
A experiência da colheita na Grange du Bouys foi um ato de amor e trabalho coletivo tendo como cenário inicial o sol nascendo no horizonte.

E posso dizer com toda certeza que não tem coisa melhor para fazer aqui no programa que ajudar a coletar uvas nessa época do ano. Esperava por esse momento desde maio, quando me inscrevi para participar do WWOOF, e elegi setembro porque sabia que a maioria das colheitas aqui na Europa se faziam nesse mês.

21624129_10155006566935829_1473238807_nInfelizmente, este ano tivemos um tempo peculiar e a vindima adiantou-se por algumas semanas. Muitas uvas como a Vermentino, a Grenache e a Cinsault foram colhidas na última semana de agosto quando eu ainda não tinha chegado ao projeto. E quando cheguei na primeira semana de setembro, numa sexta-feira, disseram que só faltava a colheita da Carignan e que pretendiam fazer primeiramente na quarta feira.

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Mais tarde Stephane finalmente nos disse que íamos fazer na sexta-feira, que foi quando conseguiu juntar o maior número de pessoas para ajudar. Stephane e Florence têm amigos por toda a região que lhes ajudam no dia da colheita. É curioso ver que todos estavam aqui as 6:45 da manhã na porta da Adega, prontos para organizar o trabalho.

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Muitos deles também são produtores locais e admiravelmente com idades muito avançadas. Os pais de Sthephane também estavam ajudando na colheita.

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Da gosto de ver gente entre seus 70 e 80 anos com tanta vitalidade. Acho que eles eram os que colhiam as uvas mais rapidamente. Fomos para o parreiral ainda de noite e tivemos a oportunidade de ver o sol nascer no meio do campo.

Nos juntávamos em grupo de duas pessoas e cada um ia fazendo cada lado da parreira. Era incrível como cada raio de sol iluminava as parreiras e as uvas.

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Uma luz diferente dos raios solares provocavam composições mágicas

Era uma dessas composições mágicas fotográficas que juntam todos os elementos necessários para tirar a foto perfeita. Cada raio proporcionava uma luz diferente para cada folha. Cada detalhe, cada momento que eu estava vivendo tentava capturar com o fundo da minha alma porque sabia que mais tarde teria que traduzir meu sentimento em palavras.

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Palavras que agora custam ser encontradas para transmitir esse encontro de emoções que vivi enquanto trabalhava. Era um sentimento de plenitude, capaz de preencher um ser. Chegava a conversar com as uvas, a tratá-las como se fossem parte intrínseca de mim mesma.

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Dina, Tristan e Alex se encarregavam de levar as caixas enquanto colhíamos. Cada um de nós tínhamos um cesto em que cabiam cerca de 5/10 kg de uvas, mas depois tínhamos que colocar nas caixas que estavam dispostas no centro de cada parreiral para que eles transportassem o mais rápido possível à Adega e não deixassem que a uva começasse a fermentar ali mesmo.

Fiz três pares diferentes durante a jornada. E cada um tinha a sua forma de trabalhar. As 11 horas da manhã fizemos nosso break para tomar um café, comer um pouco e continuar o trabalho. Florence fez um maravilhoso bolo de chocolate que todos queriam a receita.

Uma pausa

Também tínhamos uma variedade de queijos franceses e café com leite para todos. Foi revigorante. O sol já começava a pegar e tínhamos ainda duas horas para continuar. Geralmente Stephane escolhe fazer a vindima entre as 7h e 13h, quando o sol ainda não está alto, aqui na França, para que as uvas não fossem afetadas pelo calor e nem as pessoas.

Nesse preciso dia fazia um temperatura ideal, mas imagino que outros dias de agosto o sol deveria pegar forte. As 10h já estava com proteção solar 50, chapéu e óculos escuros. E ainda assim me queimei um pouco. As uvas estavam em perfeito estado, resultado de um ano de amor e dedicação.

Trabalho duro e dedicado

Todos sabíamos que o que estávamos fazendo ali, toda a colheita era o resultado de um ano de trabalho duro e dedicado. As uvas da casta Carignan são de uma variedade bem doce, que eu diria que podíamos até comer em casa sem saber que é uma variedade para fazer vinhos.

Quanto mais açúcar, mais graduação alcoólica vai ter o vinho na hora de fazer a fermentação. Colhemos as uvas de uma parcela em que as parreiras tinham 60 anos de antiguidade. Isso se traduz em melhor qualidade de uvas, ou seja, que quanto mais antiga uma parreira, se bem cuidada, obviamente, produzem melhores uvas.

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As vinhas velhas produzem os melhores vinhos

As parreiras novas tendem a produzir mais uvas e distribuir as suas propriedades e aromas entre elas.

Quanto mais antiga uma parreira, menos uvas ela produz, porém mais concentração de propriedade e aromas se encontram em cada agrupamento. Por isso muitas garrafas de vinho, quando vendidas tem especificado na sua etiqueta a frase “vinhas velhas” -é uma forma de dizer que as uvas que foram feitas esse vinho tem uma maior quantidade de propriedades e aromas.

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A jornada foi estupenda!

Nesse dia me sentia como se pudesse fazer esse trabalho por anos. Cada grupo de parreiral parecia que falava por si mesmo o muito que foi cuidado durante o ano.

Era como se fosse o trabalho de um poeta: estava colhendo palavras para depois transformá-las em poesia.

Eu colhia uvas que seriam depois transformadas nesse maravilhoso líquido que se encontra dentro da garrafa: o vinho.

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É curioso ver como o trabalho de tantas pessoas se podem encontrar dentro dela. Não era só a minha mão e a minha experiência, mas sim de toda uma gente que ano após ano as colhem, as transportam, as prensam, as provam, até que um dia decidem que essa bebida, essa experiência está pronta para ser compartida.

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Depois da colheita, tivemos um almoço com todos os amigos do casal que vieram para ajudar. Nesse almoço Stephane serviu o vinho da mesma variedade de uva que colhemos, só que nesse caso, colheita do ano anterior. Ali tive contato com gente muito interessante: muitos deles, pequenos produtores de vinhos locais, outros apenas amigos do casal e que se dedicam a algo do setor, etc.

Uma garrafa de vinho como presente

A cada um deles, Stephane os presenteava com uma garrafa de vinho em agradecimento pela ajuda. Não fomos capaz de terminar com toda a colheita na sexta, o que significava que no sábado tínhamos que trabalhar de novo e terminar com a colheita. O trabalho terminava para os amigos de Stephane e Florence, mas continuava para nós.

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Não só no sábado, mas sexta de tarde também com o transporte da uva até a Adega e a limpeza de tudo.

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Ajudamos a transportar as caixas, limpá-las, separamos as uvas dos bagos e colocamos na prensa para que sejam prensadas levemente. Foram no total quase 12 horas de trabalho e sabíamos que sábado tínhamos que terminar com a colheita.

Foi super divertido e a verdade é que não fiquei cansada nenhum minuto. Era o que eu estava esperando: parecia uma criança num parque de atrações. Queria fazer tudo. Aparte dessa experiência, Stephane também conseguiu um cliente.

Que melhor história que pode ter garrafas de vinhos feitas com as uvas que você mesma colheu.

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Amassar uvas com os pés

Mais tarde, Stephane separou duas caixas de uvas para que pudéssemos amassá-las com os pés, só pra ter a experiência de sentir como o vinho era feito antigamente. Ao pisar tínhamos que separar as uvas dos bagos e fazer o trabalho não só de prensa mas também de separação. Foi super divertido.

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Foi um dia pra ficar marcado e espero poder fazer isso durante muito tempo. Porque a vindima, ao contrário do que as pessoas falam não é tão dura. É certo que tem que estar preparado fisicamente e com os músculos das costas muito fortalecidos para não sentir dor, mas é um trabalho recompensador.

Ali sentia a verdadeira história de cada produtor de vinho, de cada agricultor; ali senti a historia que cada garrafa que abro e me quer contar. A história de o trabalho de muitas pessoas, do amor de muitas pessoas, e da dedicação que colocaram para que esta bebida tão maravilhosa, que consideramos sagrada, chegasse a nossa mesa para ser compartilhada.

Um vinho nunca é aberto sem uma boa razão, seja com os nossos amigos, com os nossos amores, com a nossa família ou com quem quer que seja.

Hoje vejo que ao comprar uma garrafa de vinho, ao escolher o dia e o momento para compartir, estamos juntando duas histórias: a das muitas pessoas que trabalharam para que ela chegasse a sua mesa; e a sua, a que você esta compartilhando no momento em que voce “descorcha” uma garrafa, seja com alguém especial ou com você mesmo.

In vino veritas.