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Arte naïf em dose familiar apresenta o universo lúdico da cultura nordestina

Pintura naïf. Nivaldo do Vale. Nordeste brasileiro
Cavalos. Nivaldo do Vale

A família “do Vale” respira arte em dose tripla. A manifestação artística que brota do coração de Ivanise(mãe), Nivaldo(pai) e Divaldo do Vale (filho), é a chamada arte ingênua ou naïf. As obras do casal, sobretudo destacam o universo lúdico da cultura popular do nordeste brasileiro.  A família vive em Parnamirim, Região Metropolitana de Natal, no Rio Grande do Norte.

Como tudo começou
Imagem da família de artistas naïf
A família do Vale e sua arte naïf.

Para o pequeno grupo de artistas a pintura entrou sem pedir licença. Nivaldo foi quem iniciou a relação com a arte em 1964, quando decidiu colocar na tela, as cores e as formas da vida nordestina. “Nivaldo é um feiticeiro da cor, um reciclador das legítimas tradições populares, um pesquisador (se assim pode-se considerar) da alma simples do povo”, escreveu uma vez o famoso artista plástico portiguar, Dorian Gray sobre ele.

Ivanise começou a pintar em 1985, já casada com Nivaldo que a presenteou com tintas, pincéis e tela. Aí ela perguntou a ele: agora seremos dois artistas? Sim, respondeu firme e convicto.

Pintura naïf de Divaldo do Vale
Beija-flor. Divaldo do Vale.

Divaldo, o filho, viveu sua infância e adolescência rodeado de obras de artes, telas, pincéis e tintas.  Começou a pintar em 1999 e já participou de várias exposições coletivas. No entanto, o artista faz questão de dizer que seus temas são mais voltados a vida urbana e a natureza.

O que é arte naïf

Uma obra naïf ou ingênua é uma manifestação artística produzida sem escolaridade profissional. É arte amadora. “Trata-se do artista naïf, aquele que, sem ter tido escolaridade artística e sem acesso aos círculos dos artistas profissionais ou aos equipamentos eletrônicos da atualidade, profissionalizam-se, utilizando técnicas tradicionais, aprendidas de forma intuitiva”. Fonte: Questões de Arte, Cristina Costa.

Por que a palavra naïf

A palavra naïf é um termo francês que significa ingênuo, inocente. Parte da criatividade autêntica do ser humano baseada na simplificação dos objetos decorativos, espontâneos, coloridos e calorosos.  Esse tipo de arte está associada mais à pintura e começou no século XIX. “Os franceses chamavam esses artistas ingênuos de pintores de domingo, porque só podiam se dedicar à arte nos fins de semana, mas, ainda assim, alcançavam, graças a seu esforço, bom nível de produção artística”- Cristina Costa.

Ivanise
Imagem de uma tela naïf.
As bailarinas. Ivanise do Vale.

Ivanise tem um jeito doce e tranquilo e agora aposentada de seu trabalho – foi administradora do Museu Café Filho, em Natal – gosta de uma boa prosa quando senta na cadeira de balanço na varanda de sua casa e vai contando de mansinho como faz para criar suas obras.  “Não uso um lápis, um traço, vou direto com tinta e pincel na tela e vou organizando tudo que vem na imaginação”, diz a artista. Mas, faz uma pausa, fica quieta e depois confidencia:

“Primeiro eu faço as almas para depois poder vestir meus personagens”.

Os temas são, na maioria, os mesmos e fazem parte da sua vida e o que viveu na infância. São João da Roça, Boi de Reis, Mulheres apanhando algodão, o Circo, Parque de Diversões, Cortadores de Cana, entre outros. O que muda são as feições de seus personagens.

Imagem do Farol de Mãe Luiza, em Natal. Pintura ingênua de Ivanise do Vale.
Farol Mãe Luiza, Natal, Ivanise do Vale. Foto Mari Weigert

Acredita que sua inspiração tem conexão com o espiritual. Não esquece o dia que pintou uma tela que foi doada à  Marinha e o tema era mar, navio e marinheiro. Aí, em certo momento, começou a criar seu marinheiro. “Não conseguia achar a alma dele e pedi ajuda a Nivaldo, que estava doente, mas ele me respondeu que não poderia. Que não estava bem. Aí, olhei para o quadro, apaguei tudo, chorei e fui dormir”,  revelou.  “Não dia seguinte comecei tudo de novo e dessa vez a minha imaginação funcionou, me liguei com a alma do marinheiro e gostei do resultado do quadro”.

As telas de Ivanise e Nivaldo enfeitam as paredes da casa do casal. Para quem entra, de imediato, na sala, a grande tela assinada por Nivaldo, dá boas vindas ao visitante. Três personagens do”Boi de Reis”.

Imagem Boi de Reis. Uma pintura naïf.
Boi de Reis, do artista naïf potiguar, Nivaldo do Vale. Foto Mari Weigert

O artista, certamente, a você leitor, se o visitar, vai fazer questão de explicar com todo o orgulho de quem cultua as festas tradicionais, que as vestimentas dos três personagens do folguedo popular jamais mudarão e que cada estado brasileiro dá um nome diferente a esse folguedo que no Rio Grande do Norte é Boi de Reis, mas pode ser Bumba-Meu Boi ou Folia de Reis.

 

 

 

 

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Instalação contemporânea é arte que não deixará vestígios

Instalação é talvez a expressão artística que mais caracteriza  a arte contemporânea, mas o seu destino é inevitável: a impermanência.

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O Rapto das Sabinas, na forma de uma vela colossal para fazê-la queimar lentamente durante a exposição e abandonar à sua aniquilação. Urs Fischer/ Veneza 2011

É o signo da atualidade, pelo qual o observador é bombardeado pelos estímulos sonoros, táteis, eletrônicos e visuais, sem que ele tenha possibilidade de interiorizar a sua procedência.

O que é uma instalação na arte

A instalação é uma manifestação artística organizada dentro de um ambiente a partir de um conceito determinado pelo artista, que pode ou não ser desmontada e transferida para outro local.

O sentido efêmero dessa poética artística, que começou a aparecer nas décadas de 60 e 70 do século passado, com o desenvolvimento da vídeo arte, da performance corporal, da tecnologia, reflete o mundo moderno, que se esvai e que se descarta rápido. Então a pergunta é, como as gerações futuras irão desfrutar de uma arte que desaparece?

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Inhotim

A impressionante instalação de De Lama a Lâmina, em Inhotim, Minas Gerais, é um exemplo da efemeridade. Mathew Barney elaborou sua instalação a partir de domo geodésicos em aço e vidro, trator florestal e escultura em polietileno.

De Lama a Lâmina é o último desdobramento de uma performance criada cinco anos antes (2004) a obra em questão (2009), num carnaval, junto com um parceiro músico, cujo princípio organizador da obra evoca o dualismo entre a criação e a destruição, progresso e conservação, fecundidade e morte.

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O Vermelho Real de Tunga, em Inhotim, é também contundente e tem como finalidade pontuar o quanto a vida é efêmera.

“O tempo é implacável  e o vermelho desbota, evapora como o sangue também, sem o sangue, sem fertilidade, a vida se esvai. A instalação contemporânea é temporal, sobretudo True Rouge, o Vermelho Real, que contextualizado evapora pela luz, a energia da vida….”

Algumas instalações apresentadas nas bienais, tanto de São Paulo como a de Veneza, muitas delas poderão ser vistas em fotos que documentam o trabalho do artista e representam o momento da exposição, o conceito a que propõem para o diálogo com o espectador.  Mas elas só existiram para  fazer a leitura do comportamento da humanidade naquele momento.

Vídeos e outros recursos tecnológico têm um tempo limitado de vida, portanto, são passageiros  e pouco deles permanecerão por mil anos. Não são como o mármore duro e frio e quase eterno.

No entanto, viver uma instalação nestes moldes é provar  de algo além do que se conhece dentro de si, entrando num mundo em que a porta sensorial é estreita, às vezes invisível e articulada em seu efeito.

As instalações artísticas externam o lado mais subjetivo da consciência do sujeito e são colocadas como desafios para espectador vivenciar ou “êxtase” ou “ódio”.

São obras que fazem parte do mundo contemporâneo que hoje está se desintegrando, com a expectativa do fim do caos para se estabelecer a ordem, num novo começo sem vestígios do passado.

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Giotto di Bondone mudou as regras da pintura na Idade Média

O pintor italiano Giotto di Bondone(1266-1337)  fugiu às imposições e hierarquias rígidas desenvolvidas pelos pintores da Idade Média tanto no Ocidente (onde imperava o gótico), quanto no Oriente (onde surgiu o estilo bizantino). As regras determinavam a importância dos personagens pintados.

Deus surgia sempre acima de Cristo e a figura de Jesus tinha que ser maior do que a dos anjos. Estes só podiam aparecer acima dos santos. E, ao fundo, ouro, ornatos, nada de árvores, de montanhas, de vida.

O mestre florentino, por sua vez, fugiu por completo das regras e fez do homem o foco das cenas que pintava. Ainda deu-lhe como ambiente o mundo real, embora moldando este à sua vontade. Não produzia uma vida estática e nem sentimentos estereotipados. As emoções eram transmitidas de forma real.

Graças a isso, suas figuras ganharam não só humanidade, como também individualidade. Ao contrário dos santos que eram pintados na época, os de Giotto impressionam por terem expressão humanas.

Sobre a vida

A vida do pintor Giotto di Bondone  é ainda tema de grandes discussões entre os estudiosos, ao contrário de suas obras que assumem comprovada importância na história da arte. O mestre italiano foi revolucionário para época em que viveu ao imprimir um estilo próprio e alterar a forma abstrata e transcendente de representar a iconografia religiosa na arte bizantina, além de desenvolver a tridimensionalidade em seus trabalhos.

Maestà é a obra-prima

A obra “Maestà”que se encontra no acervo da Galleria degli Uffizi, em Florença, é um exemplo da grande atenção dada pelo artista fiorentino ao fato de humanizar os personagens religiosos na pintura. O trono que acolhe Nossa Senhora e o Menino Jesus assemelha-se a uma oratória, ornamentada de maneira gótica com refinadas incrustações em mármore. A forma tridimensional da estrutura dá uma sensação de veracidade ao espaço e isso representa tipicamente a cuidadosa visão de profundidade dos trabalhos de Giotto.

A evidente desproporção da Virgem Maria em relação a outras figuras é devido a exigência de mostrar a imagem de Nossa Senhora em magestade a um número maior de fiéis. Os vasos rosa nas mãos dos arcanjos, símbolos marianos de pureza e castidade, estão entre os primeiros exemplos medievais de natureza morta, já experimentado por Giotto nos afrescos padovaneses. A magistral atenção de Giotto ao fato de aproximar seus personagens à realidade é evidente na obra, não só nas figuras humanizadas, mas também nos detalhes surprendentes da madeira nodosa aos pés da Virgem Maria.

Foto por Mari Weigert. Prédica Diante de Honório III - Assisi
Foto por Mari Weigert. Prédica Diante de Honório III – Assisi

Diante de Honório III

A obra Prédica Diante de Honório III, São Francisco de Assis, também revela a preocupação de Giotto com a humanidade das figuras representadas.

Foto por Mari Weigert. Última Ceia - Munique
Foto por Mari Weigert. Última Ceia – Munique

Santa Ceia

Verifica-se na Última Ceia, Pinacoteca Velha, Munique, a condição humana presente na cena: os rostos dos apóstolos são humanos e humanos são seus movimentos. A composição é dinâmica, realista. O Juizo Final ,Capela dos Scrovegni, Pádua, mostra que os rostos não são idealizados e há uma fidelidade à imagem real das pessoas. Mais uma vez, transparece o empenho do pintor em retratar de uma forma autêntica a condição humana.

Pouco se sabe da origem de Giotto

As únicas informações corretas da vida de Giotto di Bondone – assim denominado por ser diminutivo de anjo, talvez, de angiolo – é sobre o seu nascimento em Colle di Vespignano, uma pequena aldeia nos arredores de Florença e de que sua origem camponesa e humilde.

Conta a lenda que um personagem destacado nas rodas artísticas de Florença, Cenni di Peppo, mais conhecido por Cimabue, passou pelo local onde Giotto costumava ficar cuidando das ovelhas e se interessou pelos desenhos que o pastorzinho fazia dos bichinhos nas pedras.

Para surpresa de Giotto, o viajante perguntou ao menino se agradaria a ele fazer do desenho uma profissão e aperfeiçoar-se na arte de pintar. Com o consentimento dos pais, o garoto aceitou o convite e a partir daí, tornou-se o seu aprendiz. Mesmo durante o período em que aprendia a dominar os pincéis, cores e formar valores pictóricos, o futuro mestre italiano teve tempo de desenvolver idéias próprias sobre a pintura.

Como se moldou a arte brasileira de vanguarda

Arte no Brasil era pura imitação do que se fazia na Europa. Importada como eram importados alguns dos povos que viviam neste gigantesco território.

A pesquisa realizada por Maria de Fátima Morethy Couto, na obra “Por uma Vanguarda Nacional”, faz um mergulho na história da arte do país – 1940 a 1960 – e de forma minuciosa apresenta o debate crítico desenvolvido nesse meio tempo.

Aliás, na escolha deste período autora já reforça a condição que os momentos mais ricos em acontecimentos da história da arte brasileira começam a partir dessas décadas. Século XX.

Certamente, a afirmação é verdadeira, considerando a história do Brasil, um país colonizado por europeus, por uma corte escravagista. Como a arte brasileira se moldou dentro desse contexto?

Imitação

Como fica arte num país em que, numa reflexão metafórica ainda é jovem, com pouco mais de 500 anos – comparando aos mil tantos anos da Europa – e que seus filhos são, em alguns estados, a terceira ou a quarta geração de estrangeiros estabelecidos no país.

De tal forma, a gestação e infância histórica – no Brasil Império e nos primeiros anos de República – na arte era pura imitação do que se fazia na Europa. Importada como eram importados alguns dos povos que viviam neste gigantesco território.

Os movimentos artísticos surgem de forma mais acentuada depois da segunda guerra mundial, quando o mundo desenvolvido (colonizador) se tornou vulnerável vacilou economicamente ao ponto, inclusive, de possibilitar ao já então povo brasileiro, o de sonhar em se tornar o novo centro cultural artístico mundial…..

Portanto, na evolução da história a certa personalidade que a arte brasileira começa a adquirir é após a segunda guerra. Pelo menos é o que se observa nos registros da época.

Os antropólogos, com certeza, diriam que  é preciso de no mínimo 200 anos para uma família imigrante adquira os hábitos e costumes do novo país que adotou como pátria.

Portanto, o nosso país colonizado pelos portugueses, negros vindos como escravos, alemães, italianos, poloneses, entre outros – pudesse depurar a cultura anterior e estabelecer características próprias e harmonizar-se com seu novo habitat, precisou no mínimo de 200 anos para formar o novo povo brasileiro.  Incluindo mais o índio que é o verdadeiro brasileiro,  o esse novo brasileiro que surgiu dessa grande mixagem precisou de mais de dois séculos para formar a identidade própria, uma personalidade.

 É neste quadro de evolução histórica, étnica, social que também a arte brasileira se molda.

‘Por uma Vanguarda Nacional’  é uma obra que envolve o leitor ao resgatar artigos e escritos da época, os debates, as controvérsias, crises, questões de um país que foi colônia e agora atingiu o patamar do sub  –  colonialismo mais moderno –  e o quanto as aberturas políticas, a repressão dos regimes  autoritários interferiram na estruturação de uma cultura artística no país.

(….)Se, em um primeiro momento, ser moderno significa acertar o passo com a Europa, após 1924 os artistas da vanguarda brasileira julgaram primordial participar da construção de uma cultura “verdadeiramente” nacional. Tornou-se então essencial não mais assimilar de maneira correta as “lições do estrangeiro”, mas voltar o olhar para o território brasileiro e criar uma arte livre de interferências externas.(…) [1]

Depois da tentativa de alguns dos fundadores da modernidade do país, como Anita Malfati e Tarsila do Amaral, tentarem afinar com a vanguarda pouco se fez de diferente até 1940, com a introdução da arte abstrata. Nesta época, no livro de Maria de Fátima é possível entender como foi forte a resistência da crítica ao novo, principalmente, de Mário de Andrade.

(…)  Entretanto, em um ambiente cultural fortemente nacionalista e preocupado com o poder de comunicação da obra de arte como era o do Brasil da época, a reação da crítica só poderia ser negativa. (…) Mário de Andrade, como era de se esperar, rejeitou de imediato o caráter abstrato desses trabalhos (…)

Mais adiante, a pesquisa da autora mostra com detalhes o impacto que as grandes Bienais começaram a provocar no mundo da arte no Brasil. Na década de 50, que se apresenta como um “boom” no desenvolvimento da vanguarda brasileira.

Bienal

Principalmente a primeira Bienal do Museu de Arte de São Paulo, realizada em 1951, que contou com a participação de 20 delegações estrangeiras e  apresentou mais de 1.500 obras. A amplitude desta Bienal – diz a pesquisa – atesta a intenção de seus promotores de incluir o país no circuito internacional de exposições, rivalizando com as Bienais como a de Veneza.

(…) Entretanto, se os anos 1950 foram marcados por uma revolução profunda na produção artística nacional e pela difusão da arte  abstrata em todo o país, a ascendência da geração modernista sobre o meio artístico e intelectual brasileiro era ainda evidente em 1951. (…)

Desta Bienal participaram artistas consagrados como Lasar Segall, Di Cavalcanti, Cândido Portinari, entre outros e quem recebeu o prêmio de melhor pintor nacional foi Danilo Di Prete, artista italiano que se estabelecera no Brasil. Isso causou grande polêmica.

Na verdade, os regastes da crítica apresentado na obra de Maria de Fátima demonstram a grande confusão existente no meio cultural brasileiro e o fato do Brasil estar ainda atrelado às tendências internacionais, de tal forma, que não conseguia extrair de seu meio um talento capaz de ganhar uma Bienal, que não fosse os já projetados e conhecidos como Portinari, Cavancanti e outros.