Casa - Marília Diaz 2021 
Cerâmica, rocha ígnea em decomposição

Achegue-se! Visite ‘Casa’ de Marília Diaz

Aconchegue-se à Casa de Marília! Aproveite o convite e acompanhe a poética da artista sobre esse espaço tão vivenciado por nós durante a pandemia.

Casa (clique aqui e conheça) é uma mostra de arte criada a partir de objetos em cerâmica feitos pela artista, escritora e educadora paranaense Marília Diaz,  aberta ao público até domingo (31), na Galeria virtual da Maré.  A galeria é um projeto de Clauba Mendonça e André Serafim, dois jovens que uniram os recursos tecnológicos com a paixão pela arte. 

Múltipla artista, Marília (poeta, escritora, artista visual) soube explorar em sua obra, idealizada a partir de uma instalação de mesa, em cerâmica e rocha ígnea em decomposição, perturbadores significados desse espaço tão nosso que é a Casa, sobretudo o que representou no período do isolamento obrigatório.

Acolhimento, aconchego, vivências cotidianas, lugar sagrado, paz, alegria ou espaço do desassossego, intolerável…..

A pequena casa de cerâmica ( 46X24X24) agiganta-se na medida em que nos faz aprofundar em seu conceito, intensificado, obviamente, pela narração da artista no vídeo.

É por intermédio dessa meditação poética que vasculhamos nossa memória afetiva e a reinterpretamos  ou melhor damos sentido ao que é para nós a casa, o lar, a morada, a permanência, enfim o que é e foi esse espaço tão habitado  obrigatoriamente durante meses ininterruptos de pandemia

“A exposição Casa emergiu da necessidade do estar limitado a esse espaço durante a pandemia. Enquanto muitas das pessoas que eu convivo entraram em processo de depressão por não saírem, eu fiz o oposto: aproveitei para organizar muitas coisas. Ganhei prêmios com reflexões sobre a pandemia, participei de lives, fiz um site, realizei três exposições virtuais, lancei quatro livros. Me mantive muito produtiva. Como diz a minha amiga Lourdes Atié, grande educadora do Sesc: “é preciso segurar o céu e atravessar o deserto”, parafraseando um pensamento indígena.
Podia escolher ficar deprimida e reclamar, mas busquei ter uma visão crítica e estar antenada com as coisas. Li bastante nesse período……”

Marilia confessa que foi durante período de isolamento que teve a inspiração de escrever um livro sobre a sua história como artista. Uma iniciativa que resgatou a arqueologia familiar. “Isso me deu muito prazer, mas ao mesmo tempo, me deu muito trabalho”.

A inquietude não cessou mesmo limitada pelas rotinas diárias de um isolamento, principalmente o de mulher dentro de uma casa. Sem pudores e problemas, conta com certa determinação e orgulho que preencheu muito bem o seu tempo nesses dois anos. “Cuidei de minha mãe, do meu marido, cozinhei, orei e trabalhei. A casa, portanto, nasce dentro desse contexto”.

Uma instalação feita fora de seu ateliê localizado em Curitiba. Devido a pandemia foi necessário ficar perto de sua mãe no interior do Paraná. Mesmo assim o resultado da obra foi aquilo que exatamente ela buscava.

Uma certa monotonia na paisagem. Perfeito. “Era o que eu queria como obra, Casa assemelhada ao branco, um pouco suja, com várias paisagens monótonas”, define ela. “Uma visão muito feminina dessa introspectiva e desse tempo que estivemos dentro da casa”

Com ideias fervilhando na mente e novos projetos, Marilia confessa que não é apaixonada pela tecnologia. No entanto, como professora universitária tem o entendimento da importância do seu uso e vai buscar apoio de quem sabe. A mostra Casa é prova dessa conexão que ela faz com a atualidade.

Com um currículo fora do comum, para essa professora, artista e escritora, uma página seria pouco para apresentá-la ao leitor. Como diz ela “tenho 66 anos e já fiz muita coisa nesse percurso”.

Na sua vida profissional transitou em todas as frentes – artes visuais, pesquisa, educação, trabalhos de cunho social, todas vinculadas a arte como meio de transformação.

Vale visitar o seu site e conhecer Marília Diaz um pouco mais

“Sou artista visual e já participei de exposições individuais, em dupla e coletivas. Me expresso principalmente por meio da argila e do bordado e discorro sobre o feminino e questões que perpassam a vida das mulheres. Tenho predileção por vasculhar, escavar arcadas, mercados populares e bazares em busca de objetos insólitos.

Conquistei pessoas que me habitam. Na Comunidade do Pinto, construí a primeira Ludoteca do Paraná, ajudei a erigir um atelier de cerâmica a partir de ruínas, congreguei 1.500 alunos e professores a construírem um mural de cerâmica em uma Escola Pública. Convidei e seduzi 84 artistas a fazerem um jardim com flores brancas em cerâmica e 86 a edificarem cadeiras com o mesmo objetivo, nos jardins de um dos museus mais importantes de Curitiba e da América Latina. Vi o homem pisar na lua, a quebra do muro de Berlim e atravesso o tempo da peste. Recontar a própria história é corporificar narrativas, trazer luz aos meus trajetos, assenhorear-me de mim mesma”. Fonte site da artista.

Fotos da Casa: Rodrigo Ramirez

O artista sempre visionário testemunha seu tempo. Aflora a sensibilidade do observador e o estimula a pensar, reagir, transformar. O isolamento social, consequência da pandemia, produziu ‘Casa’ de Marília Diaz. Uma poética individual que representa o coletivo. Uma humanidade em espera que espia o mundo pela janela aberta….
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Mineração: artistas e moradores da Serra da Moeda pedem socorro. Cauê!

Cauê é Tupi e saudação. Salve!
Salvem a Serra da Moeda dos mineradores ecoam os artistas e moradores com suas armas em punho (música e poesia) no I Festival de Arte e Cultura.

Isso porque em português salve é também socorro.

Enquanto alguns querem dissecá-la e retirar tudo que vive e pulsa dentro dela, pela ganância, a arte fala mais alto e mostra que a riqueza é bem maior quando se conhece  a história, descobre-se  crendices, benzimentos e se enleva com os músicos, poetas e cantores do local.  O Festival foi idealizado para isso, mostrar o que existe de mais genuíno e inestimável na região.

A cantautora Sol Bueno, artista e moradora, integrante do Coletivo Cauê,  conta que o Festival começou a nascer a partir de um mapeamento cultural há mais de dois anos pelo Coletivo e só transformou-se em realidade com o apoio da Lei Aldir Blanc.

Ela quer que o grito de rebeldia de quem ama aquele lugar ecoe por todo o Brasil e em uníssono seja possível conter a destruição. ” Eu moro na única cidade não minerada do quadrilátero ferrífero e isso tem uma carga simbólica muito forte de resistência. É luta o tempo todo!…”, conta Sol.

 

Ironicamente a Serra da Moeda tem em sua história a prova que a corrupção no Brasil vem de tempos remotos e foi trazida pelo homem branco. Divino Pedro, que tem origens na comunidade centenária de São Caetano da Moeda Velha, apresenta no Festival a história da casa clandestina de fundição de moeda. A casa está lá, isto é, as ruínas. Segundo ele, a história veio à tona porque os dois fazendeiros que faziam moedas clandestinas e burlavam a lei brigaram e um denunciou o outro. Veja o depoimento no vídeo do nono dia.

“A Serra da Moeda situa-se ao sul da Região Metropolitana de Belo Horizonte e integrante do quadrilátero ferrífero, é uma das mais belas e importantes formações geológicas do Brasil, com altitudes que ultrapassam os 1.600 m. Se estende no sentido norte-sul por mais de 50 Km, incluindo territórios de oito municípios. O lugar é bastante visitado por turistas, atraídos pelas suas paisagens deslumbrantes, cachoeiras e comunidades centenárias, onde se desfruta de uma boa gastronomia junto a um povo acolhedor que ainda conserva modos de vida que remontam às origens de Minas Gerais.

O nome do festival faz menção e destaca o Aquífero Cauê, responsável por alimentar o coração da montanha, e com ela a cultura e a alma das pessoas. Essa região vem sofrendo impactos ambientais e constantes tentativas de avanço da atividade minerária, e o festival vem apresentar uma diversidade de riquezas que vão muito além de minério de ferro.”Fonte: Coletivo Cauê 

 

Essa riqueza cultural se expressa nos cantos, depoimentos e imagens que foram registrados ao longo de meses, e revelam muita expressão de vida que está intimamente conectada à terra onde existe. As entrevistas trazem desde manifestações tradicionais da cultura popular, como mestres de folia de reis e benzedeiras, como também expressões mais urbanas, como o universo hip hop. 

Dona Rita (foto) é cantadeira e benzedeira de Belo Vale, MG. Quilombo. Conta causos que faz a gente sentar horas e horas numa boa prosa numa roda de conversa. O depoimento está no vídeo dois do Festival.

A ação mineradora tem destruído toda a região e  está comprometendo toda a vida e o patrimônio material, sobretudo as comunidades quilombolas do entorno, que tiravam o sustento das águas do Rio Paraopeba. “Hoje o rio sangra”, denuncia Gloria Maia, historiadora e fotógrafa, além de presidente do Instituto XXI, correalizador do Festival.

 

O Festival é totalmente online e pode ser assistido no Canal do Coletivo Cauê. Quem assiste não consegue ficar em um só vídeo. Um projeto muito interessante que nos dá oportunidade de viver um pouquinho a vida daquela gente.

É um Brasil amoroso que espalha afetividade pela arte, pela música, pelos causos e singeleza. O Brasil genuíno que fala de flores e amores e não de armas. Um Brasil que não usa o nome de Deus em vão e sabe que ele está presente na água cristalina, no verde das matas e no afeto entre as pessoas.

Acesse o canal leitor, que não irá se arrepender. Terá oportunidade de conhecer muita gente simpática, como Amanda Gabriela e Vania dos Reis (mãe e filha) ambas fazem parte da Guarda de Moçambique, de Nossa Senhora do Rosário de Brumadinho. Elas cantam e encantam sobretudo quando falam sobre as raízes afro e de seu artesanato. Grandes costureiras exímias na confecção de um belo ‘fuxico’.

O recorte do Festival foi contemplar moradores da Serra da Moeda e principalmente mulheres. Portanto, o Festival é um exemplo de emponderamento feminino, do negro e indígenas. Nas expressões culturais predominam manifestações rurais, periféricas e quilombolas. 

Aldo Bibiano é  Capitão da Guarda de Moçambique, de Nossa  do Rosário de Brumadinho e  presidente do Conselho de Promoção da Igualdade Racial. Para conhecer um pouco mais dele é só assistir o primeiro vídeo do Festival.

“Não troque sua loucura por uma simples lucidez, aparente, envolvente, sutil, (..) Se algum dia a solidão bater em sua porta, abrace o tempo, abrace o vento(…). Não sou poeta e sim poéter diz Láercio Vilar, do Quilombo do Taquaruçu, baterista há quase 60 anos. Seu depoimento está presente no vídeo do dia 3.

“Assim, é no abraço e na conexão da natureza inteira deste lugar que nascem todas as expressões do Festival: ao todo, são 10 episódios, lançados na Internet, um a cada semana à partir do seu lançamento, nos meses de agosto, setembro e outubro, todos na página do Coletivo Cauê, no Youtube. Que Cauê, que em tupi significa gavião, como também uma forma de saudação – um salve – possa saudar, salvar, abraçar  e apresentar caminhos de “bem viver” em suas águas criativas!”. 

Salve Sol Bueno e seus amigos! 

Vale lembrar que o décimo episódio do Festival será apresentado neste sábado (23/10), a partir das 18 horas, e  ficará disponível para o público no canal. Não deixem de assistir e certificar-se que a garimpagem do Coletivo Cauê foi fantástica, mostrou o brilho de figuras humanas preciosas e repletas de ternura e sensibilidade. Não deixem mesmo de assistir que irão renovar a esperança no ser humano nesses tempos tão sombrios. 

Vamos nos juntar a eles e potencializar esse grito: Salvem a Serra da Moeda!

*Todas as fotos foram cedidas pelo Coletivo Cauê.

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Arte de Weiwei coloca em debate a China e a liberdade de expressão

O artista chinês Ai Weiwei é uma das vozes mais potentes na luta pela liberdade de expressão. Não economiza esforços para mostrar o mal que causa a opressão ao homem.

Sua arte é perturbadora e reflexiva quando aborda temas como perseguição política, guerra e direitos humanos.  As obras de Weiwei são contemporâneas nos recursos tecnológicos e ancestral na porcelana, bambu, papel, para confrontar e influenciar o espectador sobre as injustiças dos  poderes e de sistemas. 

Tive a oportunidade de visitar duas mostras em diferentes épocas e país. A primeira vez que conheci os trabalhos de Weiwei foi no Museu Oscar Niemeyer, Curitiba (Brasil): Weiwei, eu nasci radical –  mostra Raiz.  A outra agora em Lisboa, Portugal. 

Vivendo atualmente na região alentejana, o artista chinês criou Rapture, com obras inéditas como o painel Azulejo Odisseia, com a produção de Viuva Lamego e Papel Higiênico, um gigantesco rolo de papel higiênico em mármore também produzido em Portugal. 

Estão também presentes as obras Refugiados e Depois de Weiwei ver Juazeiro do Norte e Bicicletas e muitas outras impactantes para quem não está acostumado a refletir sobre arte conceitual.

Mas vamos falar da série S.A.C.R.E.D ( 2011-2013), através da qual Weiwei recria momentos passados dentro uma cela, durante 81 dias, em algum lugar secreto da China, sem até hoje ele saber o por quê de sua prisão.

É  uma  obra em  seis partes, feita em fibra de vidro envolta em ferro.  Apresenta o artista dentro da prisão, posto sob vigilância 24 horas por dia, acompanhado por dois guardas até mesmo quando fazia suas necessidades e dormia e era interrogado constantemente. 

S.A.C.R.E.D é uma obra símbolo da violência cometida contra o direito fundamental do homem de expressar suas ideias. Cada uma  das letras do título da obra representa um episódio de sua experiência: Supper (ceia), Acusadores, Cleasing (limpeza), Ritual, Entropia e Dúvida, que são também o nome de cada uma das seis caixas.

 

 

Não só a China ele critica como também todos aqueles que não respeitam os direitos humanos. Não é por menos que expõe a série (1995), em fotografia – Estudo de Perspectiva – tendo seu braço esticado e o dedo médio levantado frente aos locais de poder cultural e político em todo mundo, Torre Eiffel, Reichstag, entre outras.

Azulejo Odisséia e um painel gigantesco de azulejo que retrata a  crise dos refugiados relacionando seis temas. guerras, ruínas, cruzar o mar, campos de refugiados e manifestações.

A série de desenhos que compõe a Odisseia, obra de Weiwei sobre refugiados, vem de uma pesquisa que começa com os primeiros deslocamentos humanos descritos no Antigo Testamento e continua até os dias de hoje. Imagens da internet, mídia social e registros feitos pelo artista em campos de refugiados na África, Ásia, Europa se configuram em preto e branco no estilo inspirado nos baixo-relevos, cerâmicas e pinturas de parede da antiga Grécia e Egito. A sequência das várias cenas de fuga, migração, destruição, repressão e militarização foram impressas em papel de parede como um pergaminho, o que reforça a sensação de estarmos diante de uma odisseia contínua”. 

 “”.

 

“Como artista, sempre acredito na humanidade e vejo esta crise como uma crise minha. Vejo estas pessoas que vivem nos barcos como minha família. Poderiam ser meus filhos, poderiam ser meus pais, poderiam ser meus irmãos. Não me vejo diferente deles. Podemos falar idiomas totalmente diferentes e ter sistemas de crenças totalmente diferentes, mas eu os entendo. Da mesma forma que eu, eles também têm medo do frio e não gostam de estar embaixo de chuva ou ter fome. Como eu, precisam de uma sensação de segurança”.
– Ai WeiWei

Um artista como Weiwei é  exemplo de como  a arte não escolhe sistema político e nem impõe culturas. As obras de arte falam metaforicamente no silêncio de sua poética que choca, muitas vezes, mas nos obriga a pensar.  

“Sem Cérebro” é um autorretrato do artista feito em cortiça, sentado em uma cadeira e algemado.  

O Weiwei sem cérebro feito de material vegetal leve e isolante. Weiwei de 2021 talvez queira nos dizer algo. Não acham?

 

Matéria relacionada:

Ai Weiwei: eu nasci radical

 

 

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Encontro com as obras de Leminski em Lisboa. Surpresa gostosa!

É uma boa surpresa quando você está fora de seu país e encontra uma obra de um conterrâneo sendo exposta ou destacada. "Se não fosse isso e era menos não fosse tanto era quase".

Assim foi ao ler a frase ‘existencial’ acima e se deparar com a foto de Paulo Leminski ( 1944 – 1989) numa janela, no momento em que caminhava na companhia da filha em uma calçada lisboeta para visitar outra mostra, Rapture – Weiwei, na Cordoaria Nacional. 

É Leminski?, perguntou Marcela. Confirmamos a duas que era uma mostra dele, do poeta, escritor e artista admirado, gente da nossa terra, lá do Paraná.  Múltiplo Leminski estará até 3 de novembro, na Casa da América Latina, em Lisboa Portugal.

A sensação de acolhimento foi muito gostosa e para o leitor pode parecer meio esquisito, cafona, dizer que achamos por acaso.  Deve pensar: Uai… não lê a programação cultural da cidade que visita para saber?

Confesso que essa deixamos passar ou porque não recebe tanta publicidade  como uma mostra em espaço culturais mais badalados.  Mas vale dar o tom da emoção e espontaneidade para o leitor sentir como a afetividade cultural alimenta a nossa a alma quando está distante da nossa terra natal.

O escritor, poeta e músico paranaense, Paulo Leminski foi expoente da literatura brasileira do século XX e deixou obras que transitam por todos os campos culturais e artísticos,  sobretudo uma personalidade marcante como pensador de cultura e autor de “experimentações verbais e visuais”,  como destaca Alice Ruiz, poeta e escritora que viveu com Leminski 20 anos. 

Erudito, culto, poliglota, não passou incólume, no entanto, à geração rebelde e furiosa dos anos 60.
“Nós somos de uma geração que sonhou muito alto. Em algum momento, acreditamos que realmente pudéssemos mudar o mundo”, atesta Alice Ruiz, num depoimento emocionado (…)

O próprio poeta orgulhava-se das canções que tinha composto, muitas transformadas em verdadeiros clássicos na voz de Caetano Veloso, Itamar Assumpção, Moraes Moreira ou Ney Matogrosso. Orgulhava-se também de pertencer à geração que pretendeu “derrubar as estantes, as estátuas, as vidraças”. Por outro lado, cultivava um profundo rigor herdado da poesia concreta e da familiaridade com os monumentos literários da humanidade, de Ovídio a James Joyce. Poetas de primeira grandeza, como Haroldo de Campos, perceberam rapidamente a peculiar originalidade de sua poesia: o hábil artesanato aliado à loucura, à urgência e à rebeldia da geração de um Frank Zappa ou de um Rolling Stones.
Segundo Alice Ruiz, a paixão pela juventude e ao mesmo tempo as antenas conectadas com textos de ruptura acompanharam a trajetória de Paulo Leminski desde o início. Catatau, o primeiro livro publicado, ainda nos anos 70, só encontra paralelos nacionais no Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa ou nas Galáxias, de Haroldo de Campos, conforme o crítico Leo Gilson Ribeiro escreveu. Mas nesta própria prosa repleta de abismos e armadilhas verbais, o germe diferencial já estava alojado. No livro, René Descartes tenta compreender o Brasil. Em uma mão, uma luneta. Na outra, um cachimbo recheado com maconha.
— Quando conheci o Paulo, ele já tinha cabelos compridos. Mas já era um cara culto, erudito, só falava de Homero, Ovídio, Pound, Joyce, Rimbaud. Era um clássico aos 20 anos e um rolling stone aos 40. Na realidade ele foi se tornando cada vez mais jovem. Tinha uma irresponsabilidade total da juventude, aos 40 anos — relembra Alice. Fonte: texto de Ademir Assunção clique aqui para ler completo

Múltiplo Leminski é um projeto que resulta na  catalogação completa das obras do poeta. A mostra pretende apresentar as diversas facetas artísticas do talentoso paranaense.

A mostra no Brasil foi visitada por mais de 300 mil pessoas e apresentou, além de fotos e a trajetória do artista,  objetos pessoais que fazem parte do acervo da família . Conheça mais aqui sobre o projeto

Por ironia do destino, Leminski pouco saiu de Curitiba em vida, salvo algumas viagens ao Rio e a São Paulo,. Pelo contrário, sua obra, está já  circulando fora das fronteiras brasileiras.  Evoé!

Alice  Ruiz no texto de apresentação compara Leminski a um navegador que usou as palavras como bússola e percorreu com  destrezas todos os rios que a palavra o levou. 

Porém, conta que foi um navegador apenas pelo pensamento, mente, coração. Fisicamente nunca saiu do Brasil e poucas de Curitiba. Sempre preferiu suas cidade  natal e numa forma criativa de declarar amor à sua terra dizia: “pinheiro não se transplanta”.

A mãe de Aurea, Alice Ruiz, e a irmã, Estrela Ruiz Leminski, são corresponsáveis pela curadoria. A ambientação e cenografia são assinadas pelo designer Miguel Paladino.

O projeto Múltiplo Leminski inclui atividades paralelas: palestras, ações educativas, shows, intervenções poéticas urbanas e artes de rua. Tudo para envolver os locais e deixar sementes por onde passa.

“Leminski era generoso com os jovens, que se sentiam especiais quando conversavam com ele. É um lado que a mostra também valoriza, trazendo o poeta mais perto das pessoas”, avalia Alice Ruiz.

“Quem nunca viu que a flor, a faca e a fera tanto fez como tanto faz na fraca carne, um pouco menos, um pouco mais, que nunca viu a ternura que vai no fio da lâmina samurai, esse, nunca vai ser capaz”.