Pintura feita pelo arquiteto francês Pascal Coste, que visitou a Pérsia em 1841. Fonte: Wikipédia

Arte salvou Kyoto na segunda guerra. Quem salvará os tesouros artísticos do Irã

Kyoto, antiga capital do Japão, era a primeira na lista das cidades-alvo da bomba atômica no final da segunda guerra mundial. Salvou-se por sua importância cultural e artística. Numa possível guerra entre Irã e EUA quem convencerá Trump a não usar a bomba atômica num país, cujo território é habitado desde os tempos pré-históricos, que em cada centímetro de sua terra a história escrita da Pérsia está ali registrada desde 3.200 a. C. Os tesouros  são inestimáveis, arqueológicos e culturais.

Tente elaborar um e-mail convincente a Trump que o faça parar de ‘brincar de mocinho e bandido’ e não colocar em risco vidas, além da possibilidade de destruir um importante patrimônio histórico da humanidade. Escrever para Trump foi um exercício feito depois de uma aula de inglês com Alasdair Gardiner,  australiano, cineasta e professor, repleta de informações sobre Kyoto e Irã. Experiência fantástica, em inglês e em conhecimento.

Kyoto

Alguns historiadores dizem que o secretário de Guerra dos EUA, Henry Stimson, tinha um motivo pessoal para poupar Kyoto do bombardeio nuclear que arrasou Hiroshima e Nagasaki. A antiga capital do Japão estava no topo da lista e seria a primeira a ser bombardeada, de acordo com registros históricos da segunda guerra mundial. Kyoto abriga mais de 2.000 templos budistas e santuários xintoístas, incluindo 17 Patrimônios da Humanidade

Um artigo na BBC publicado em 2015  conta que houve uma pressão muito grande por parte de Henry Stimson para retirar Kyoto do alvo. O homem que salvou Kyoto da bomba atômica. A cidade de Nagasaki nem estava na lista e foi colocada para substituir Kyoto uma semana antes do primeiro bombardeio. As boas condições climáticas de Hiroshima selaram o destino da cidade, que recebeu a primeira bomba, em 6 de agosto de 1945.

“Kyoto foi visto como um alvo ideal pelos militares porque não havia sido bombardeado. Muitas indústrias foram realocadas e algumas grandes fábricas estavam lá”, diz Alex Wellerstein, historiador de ciências do Instituto Stevens de Tecnol ogia. 

“Os cientistas do Comitê de Alvos também preferiram Kyoto porque era o lar de muitas universidades e pensaram que as pessoas de lá seriam capazes de entender que uma bomba atômica não era apenas mais uma arma – que era quase um ponto de virada na história da humanidade”. ele adiciona.

Irã

Hoje onde é o Irã, na antiguidade foi centro do grande império persa que se estendeu da Grécia até a China. Seu patrimônio histórico e arquitetônico lembra a história de Mil e uma Noites. Mesmo numa visita virtual percorrendo os olhos em alguns de seus edifícios mais antigos  com sua torres abaloadas poderá sentir-se sobrevoando num tapete mágico.

Cidades como Arg-e Bam perto do deserto de Dasht-e-Lut que foi importante ponto estratégico na rota da seda que teve seu auge entre os séculos VII  até o XI.

 

Em Teerã, o visitante poderá encontrar o Golestan Palace construído entre os séculos XVIII e XIX, em Isfahan a cidade mais visitada do Irã e onde está a segunda maior praça do mundo, que só perde para a Praça da Paz Celestial em Pequim – a Praça de Naqsh-e Jahan.  Os famosos Jardins Persas, Mesquita Shah, Persépolis e uma infinidade de mesquitas construídas e decoradas com mosaicos coloridos.

Mas antes de escrever para Trump lembrem-se que o país é rico em petróleo e que as indústrias bélicas não podem parar de funcionar. Certamente existe um comitê que une todas elas e quando o mundo se acalma o principal tema em discussão é: “Onde vamos começar uma guerra”?

 

With Flowers, Weiwei- 2013. foto retirada do site do artista.

O que trouxe o ‘espírito do tempo’. Zeitgeist!

O uso indiscriminado da tecnologia da comunicação e atrelada a ela, todas as controvérsias. Mesmo assim, viva a tecnologia, o espírito do tempo. Zeitgeist!  um termo em alemão usado para definir a cultura que predominou na época.  

Mesmo vivendo na era da pós-verdade (pós- verdade só foi um jeito bonito de denominar a mentira vil)  muitos artistas não teriam voz para gritar, chocar, provocar, denunciar como profetas de seu tempo. Sem a tecnologia, o artista chinês Weiwei  não teria como protestar em dimensão global sobre a apreensão injusta de seu passaporte pelo governo da China, depois de uma prisão secreta e perseguição.      

                   

Foto retirada do site do artista. Bicicleta que recebia diariamente flores colocadas pelo artista.[/caption]

Durante 600 dias, quase dois anos o dissidente artista chinês, catalogou buquês de flores colocados numa bicicleta, em frente a seu ateliê, em Pequim, em troca do passaporte confiscado. Esta obra intitulada With Flowers foi fotografada e veiculada em seu site e compartilhada nas suas mídias sociais em 2013. Seus admiradores compartilharam também com o hastag – #flowersbyfreedom – e foram milhares de compartilhamentos, o que gerou em 23 de julho de 2015 a devolução de seu passaporte.

Florescer

O resultado dessa poética artística inspirou Weiwei a criar 16 painéis de porcelana com milhares de delicadas flores que percorrem o mundo, nas inúmeras exposições que promove. Florescer é uma instalação que remete à ação diária do artista de chamar atenção para a restrição do Estado às liberdades individuais. Também para lembrar a campanha o Desabrochar de Cem Flores (1956- 1957). Um período na história da República Popular da China durante o qual o Partido Comunista incentivou a expressão das mais variadas escolas de pensamento (inclusive anticomunistas) para corrigir e melhorar o sistema.

A artista indiana Shilpa Gupta, deu voz aos poetas presos e silenciados em suas crenças com o apoio da tecnologia, com uma visceral instalação sonora  For In Your Tongue, I Can Not Fit -100 Jailed Poets, este ano na Bienal de Veneza. Sem a tecnologia, o americano Bill Viola nem nascia como artista. Ele é um dos pioneiros na exploração de novas mídias nas artes visuais. Conheci sua fascinante obra Três Mulheres, na Bienal Internacional de Curitiba, em 2015, exposta na Catedral.

São centenas, inúmeros  e talentosos artistas que se utilizam da tecnologia e hoje têm o apoio de suas mídias sociais para expor suas ideias, compartilhar seus anseios como testemunhos de um tempo que não deixará vestígio e nem memória, como as formas artísticas delineadas no duro mármore branco de grandes artistas do passado. Ainda assim, continuo apostando na narrativa artística da tecnologia. É o espírito do nosso tempo.

Vale lembrar que antes de Weiwei criar Florescer, os painéis com delicadas flores em porcelana, o artista a fez existirem na vida real. Singelas flores coloridas que abarcavam um conceito tão grandioso e significativo! 

Florescer é preciso para um novo mundo, mais solidário e com sistemas políticos mais justos, pois até hoje a humanidade ainda não conseguiu achar um denominador comum para as organizações sociais que contribuam para o desenvolvimento do homem, com liberdade e qualidade de vida!

Peru, autor desconhecido feito em madeira e barro.

Arte do presépio no imaginário das pessoas

Quando uma menininha de 3 anos pede para que conte a história do menino Jesus e aí  você para e pensa, o que eu faço? Tento criar uma fábula ou faço um discurso religioso. Optei pelos dois de um jeito muito especial e criativo. Contei uma história sobre a família com a estrutura da história bíblica e falei sobre o amor e solidariedade.

famosos presépios alemães de hélice

Nesse momento lúdico lembrei da importância e atração que o Presépio exerce na criatividade de artistas tanto em telas famosas como de Giotto, Fra Angelico, entre outros, como os näifs que se encantaram e envolveram-se na história do nascimento de Cristo. Lembrei também do Museu do Presépio que visitei em Évora, Portugal. Uma coleção incrível!

A coleção Canha da Silva conta com 472 presépios de proveniência europeia e alguns poucos das Américas. As mais ternas, exóticas e originais montagens artísticas que representam a Natividad. Conta a história que o costume de criar essa cena começou com São Francisco, em 1223, e depois foi difundida pela ordens religiosas.

O caráter universal apoia-se na tradição iconográfica da Sagrada Família, onde são habituais a presença do burro, da vaca, da estrela que guiou os pastores e os reis magos a Belém e de anjos. Neste conjunto de personagens cada cultura coloca sua afetividade, seus costumes e cores. Enfim as diversas identidades regionais unidas a espiritualidade que se misturam entre o profano e o sagrado, com boas doses de fantasia.

 

 

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Culinária sensorial e criativa

A culinária é arte que exige criatividade e estética, além do empenho na elaboração de um prato. É como compor uma música, pintar uma tela ou escrever um poema. Muitas vezes o ritual de servir e os sabores combinados nos pratos provocam sensações que alteram nosso humor. Filmes, livros, poemas são inúmeros sobre o assunto e contam o quanto é sensorial e criativa a arte culinária. Cada cultura, cada povo, tem seu estilo e marca e é um mundo fascinante!

Inesquecível foi um jantar na casa de Roberto e Fernanda e ao participar dele lembrei do livro Afrodite, de Izabel Allende, que descreve o prazer sensorial da comida e de uma mesa elaborados com arte e imaginação. Esse jantar aconteceu há alguns anos e ainda permanece vivo em minha memória.

“O prazer de um sabor centra-se na língua e no céu da boca, embora com frequência não comece ali, mas na lembrança. E parte essencial desse prazer reside nos outros sentidos, na visão, no olfato, no tato, inclusive na audição. Na cerimônia do chá no Japão, o gosto da bebida é o menos importante – na verdade o chá é amargo – mas a serena intimidade das paredes nuas, as formas depuradas dos utensílios, a elegância do ritual, a concentrada harmonia dos gestos de quem oferece o chá, o quieto agradecimento de quem o recebe, o tênue odor da madeira e do carvão, o som da concha ao verter a água no silêncio do aposento, tudo constitui uma celebração para alma e para os sentidos”. (…) Izabel Allende. 

Apenas um parêntese, Roberto é um jovem amigo do meu genro Gustavo e Fernanda, amiga da minha filha Paula. O casal me ofereceu um carinhoso jantar para agradecer por ter feito parte da história deles. Isto é, os dois marcaram o primeiro encontro na minha casa, depois de muitos e-mails trocados. Roberto vivia em São Paulo e Fernanda em Curitiba.

Sensorial

Bem…. voltando ao tema arte culinária e os prazeres sensoriais dos alimentos, Roberto seguramente usou sua própria imaginação e incorporou, naquele jantar, o mais refinado e verdadeiro gourmet, ao ponto de somente servir e não degustar junto com Fernanda eu e Paula e Marcela. Durante o jantar dedicou-se a performance de ‘chef’ e na medida que servia os pratos à mesa, quando recebíamos a iguaria, nossos olhos as devoravam antes da primeira garfada chegar à boca.

Já no início do ritual, ops… do jantar, recebemos o cardápio. Pensando bem, foi um ritual. O cardápio era feito de forma artesanal, simples, de papel A4, mas por ser personalizado para o momento, descrevendo os pratos a serem servidos e uma ilustração com meninas na capa, transformou-se  no mais elegante menu aos nossos olhos. Mais um parêntese, Roberto é um rapaz muito espirituoso, brincalhão, mas desta vez fazia tudo com um seriedade admirável.

Daí para frente, Roberto ia e vinha da cozinha, em silêncio, concentrado na sua tarefa de agradar e alimentar com arte suas convidadas.

 Cardápio

Primeiro a entrada: Rondeli elaborado com mussarela de búfala, acompanhado por um aperitivo – um espumante batido com pêssego – de sabor doce e suave para aguçar o paladar. A partir daí  já estava me sentido protagonista de um filme semelhante ao da “A Festa de Babette”, que Izabel Allende descreve tão bem a sensação dos convidados no livro Afrodite:

 

 “Em ‘A Festa de Babette’, aquele comovente filme baseado no conto de Isak Dinesen, a câmera vai e vem entre a cozinha, onde se preparavam amorosamente os pratos, e a sala de jantar, onde os rostos severos desses estóicos habitantes de um mundo distante e gelado vão mudando, à medida que o vinho e os alimentos se apoderam de seus sentidos”…

Não eramos habitantes de uma terra distante mas seguramente os alimentos começaram a se apoderar dos nossos sentidos e o “rir à toa”, regado pelo bom vinho que Roberto nos ofereceu, fez parte daquela noitada inesquecível.

 O prato principal: salmão com ervas e tomate seco – foi servido logo após termos degustado a salada, tão colorida quanto a diversidade natural de nosso Brasil. A concha roxa de repolho, ali tão bem colocada no prato, mais parecia uma delicada pétala de flor, abrigando as tenras folhas verdes picadas em meio as azeitonas suculentas, tomates e rodelas do mais macio palmito pupunha.

 Para encerrar esta orgia sensorial, Roberto serviu mamão com cassis que foi saboreado avidamente pelas convidadas como se fosse servido no Olimpo, na categoria de sobremesa dos deuses. Izabel Allende tem razão quando escreve com a delicadeza de uma inspiração poética sobre o ato de servir alimentos e saboreá-los. Ela mostra que o cenário e a performance transformam o olhar e os sentidos.

Tanto é verdade que certa vez, há muito anos, na minha época de “bicho grilo”, fazendo um curso de Yoga, na chácara da Mary, uma exótica e extravagante professora que morava em Piraquara, numa casa também exótica, em meio a gatos e cachorros, experimentei um pedaço de pão sem fermento e de farinha integral. Lembro que era duro e seco e o achei de sabor incrível, acompanhando panquecas branquinhas de polvilho recheadas com tomates refogado. Essa comida simples de sabor único me transportou para um templo de cultura natural e sagrado naquela atmosfera excêntrica da casa de Mary!