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O corpo e a alma das mulheres de Victor Brecheret

 

As mulheres de Victor Brecheret são magníficas!

A mostra “Brecheret Mulheres de Corpo e Alma – Desenhos e Escultura” é magnífica. Victor Brecheret (1894-1955) quando delineou suas mulheres, no gesso, no bronze e no desenho, as relacionou “à anima, ao feminino que habita em todo o homem”.

Se o olhar for de uma mulher, portanto, sob a ótica feminina, a identificação com as performances criadas pelo mestre será imediata.  Quando o feminino se depara com os grupos temáticos tão bem construídos.  A mulher no mito, no sagrado, no amor, na alegria, no próprio corpo.

É como se Brecheret estivesse ali, apresentando suas mulheres

A curadoria é de Daisy Peccini. Ela  conduz a mostra  como se Victor Brecheret estivesse ali, se apresentando com as mulheres que permearam e foram parte dele nas diversas fases de sua vida. A começar pela escultura que abre a exposição, um corpo de mulher, em bronze.  Uma Vênus sem identidade (sem cabeça) e com pés masculinos, em contraste à feminilidade das curvas.IMG_3666

O Instituto Ricardo Brennand, em Recife, presenteia aos brasileiros essa exposição até o dia 19 de julho.

São 29 esculturas e 107 desenhos (estudos) do artista ítalo-brasileiro sobre o feminino numa seleção de três décadas de inspiração, de 1920 a 1955.

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Banho de Sol, início da década de 30. Foto Mari Weigert

O objetivo do Panhoramarte não é divulgar o evento. Isto já foi feito. É oferecer a oportunidade ao leitor  de rever o mestre Brecheret, na sua magnitude, na beleza de suas criações, tanto pelas fotos das obras quanto pelo texto e olhar crítico.

Victor Brecheret é parte importante na história da arte brasileira.

Para quem não o conhece, é o artista que assina o monumento às Bandeiras, na Praça Armando Salles, em frente ao Palácio Nove de Julho, em São Paulo.

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Os desenhos e as esculturas, na mostra,representam fases e diferentes tendências da trajetória do artista.

“Manifestações de corpo e alma, esculturas e os desenhos guardam latências e emanações do arquétipo feminino, provenientes da psique do artista, o visionário, que expressa com mais liberdade o inconsciente”, afirma a curadora da mostra, Daisy Peccinini.

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O Beijo, Brecheret, 1930. bronze polido. Foto por Mari Weigert

O Beijo de Brecheret, em bronze – início dos anos 30. É uma escultura marcante de um casal apaixonado de formas estilizadas, naturalistas. As formas são volumosas, porém impregnadas de sensualidade e com um romantismo ainda definido na inclinação da figura masculina à feminina.

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O Brecheret jovem, na Escola de Paris, que viveu nos anos 20, em Montparnasse, traz a escultura clássica em obras como a Bailarina e a Tocadora de Guitarra, ambas do início da década de 30.

Embora o jovem artista tenha preservado as linhas clássicas  nas duas obras, é também possível perceber o jogo que faz com o movimento  dando às esculturas um sentido mais ousado.

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Bailarina. 1929. Foto Mari Weigert

“O artista não só procura a figura, as superfícies, os volumes, a composição, mas, sobretudo, as resultantes de sua criatividade dedicada e intensa, que ao ser moldada a matéria dela emanasse a alma feminina e os valores simbólicos, históricos e estéticos da mulher universal”, diz o material de introdução à mostra.

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Três Graças, início da década de 30 .

Duas esculturas que representam as Três Graças ou Carités, símbolo da harmonia. A primeira, acima, feita na época em que frequentava a Escola de Paris. Nela, ele representa como alegoria, as três raças humanas entrelaçadas e em igualdade. Nos anos 50 retoma ao tema, porém usa formas orgânicas e primitivas.

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Três Graças, início dos anos 50
Nus Femininos, Mulheres Alegorias, Mulheres Amor, Ritmo e Música

A mostra está dividida em grupos temáticos, entre eles está o Nus Femininos, Mulheres Alegorias, Mulheres Amor, Ritmo e Música, Figuras Santas, Mulheres Indígenas, Mulheres Reclinadas, entre outras.

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O Beijo início da década de 30.Foto Mari Weigert

Uma outra escultura que compõe o Beijo e criada quase na mesma fase da outra, na qual o sentimento romântico está mais acentuado pela inclinação da figura masculina à feminina.

Nessa acima, o beijo unifica o masculino e o feminino, os imanta e os transforma em um.

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O tema feminino e religioso aparece em todas as fases da vida do artista, segundo informações do catálogo.

O bronze Soror Dolorosa, 1920, é uma delas, do início de sua carreira, e foi inspirado no livro de poemas homônimo de Guilherme de Almeida.”A composição dramática e tensa, bastante moderna, dispõe frente a frente a cabeça da mulher mística, contemplando o rosto de Cristo sacrificado”.

Belíssimo trabalho!

Em Virgem da Anunciação – 1955, o artista retoma a criação de madonas dos anos 20, e representa o Arcanjo Gabriel e a virgem adolescente.

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Virgem Indígena, 1950.

Na década de 50, Brecheret retoma a arte religiosa que desenvolveu nos anos 20 e representa a Virgem Maria em todos os seus perfis. Na foto, acima, a escultura da Virgem Indígena. Mais sintética e com volumes rusticamente definidos.

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Índia Escondida por um Grande Peixe. c.1948. Granito. (pedra rolada pelo mar)

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Entre as marcantes obras de Brecheret, essa, a Índia rolada por um grande peixe é fora de série. É apoteótica, primitiva e ao mesmo tempo dramática.

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“A respeito da minha arte, estou em um momento de máxima simplicidade, dentro das linhas e jogo de volume, encontrei minha inspiração, graças a Deus, pura Arte, que é completamente original”. ( Carta de Victor Brecheret a Mário de Andrade, Paris, 14-05-1924).

 

 

 

 

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Um caso peludo

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Ilustração da netinha Victoria (Vicky) Wanke – 9 anos

 

Por Luiz Ernesto Wanke –  (Este ‘causo’ é antigo, de mais de 60 anos. Ouvi numa barbearia enquanto estava sentado na cadeira cortando o cabelo, por outro freguês que esperava a vez. O interessante é que esqueci quase tudo, mal me lembro do lugar, das fisionomias e muito menos dos nomes dos personagens. Mas não tive problemas de relatar a história, tão fresca como tivesse acontecido agora. É que a memória afetiva guarda apenas o que nos interessa e descarta os detalhes inúteis.)

Finalmente tinha reunido força e vontade para cimentar o piso da garagem que sempre o incomodou. Bastava uma chuvinha rala para as goteiras estabelecer o caos naquele chão barrento e liso, de maneira que ao recolher o velho fusca, ou ele ou o carro se complicavam. Era tão desagradável essa situação que seus amigos de trabalho mais chatos espalharam por todos os cantos que ele tinha encalhado seu possante na própria garagem.

Num sábado de folga tomou coragem e munido de material e ferramentas foi à luta. Tudo nos conformes até o final da tarde quando estava alisando a última camada de cimento. Não é que ao levantar os olhos deparou lá no fundão da garagem e em cima do parapeito da única janela lateral, um bichano angorá gordo ameaçando saltar sobre o piso fresco tão caprichosamente aplainado? Em princípio gritou escandalosamente para afugentar o gato. Torcia para que, assustado, tomasse o sentido inverso. Gritou, atirou algumas pedras de brita, mas qual, o gato sem nada entender, só fazia olha-lo com maior curiosidade.

E, finalmente, aconteceu: o improvisado pedreiro viu em câmara lenta o angorá pular em cima do piso, afundando suas patinhas na nata do cimento fresco, fazendo um estrago que doeu bem no fundo do seu peito. Ainda assim continuou a gritar, esbravejar, mas qual, o desgraçado nem dava bola.

Como se fizesse de propósito, o gato veio andando em ziguezague como a boiada à procura de água num regato. Mal acostumado e com os pés sujos de cimento, ainda veio de mansinho se aninhar junto de suas pernas, miando e levantando a cabeça à procura de um afago no seu cangote. Depois se enrolou na barra de sua calça, roçou seus pelos no calcanhar, e, por fim, miou um amoroso pedido de colo.

Mas agora o pedreiro só tinha o ódio para oferecer. Não pensou duas vezes, apanhou a colher de pedreiro e de quina deu com toda a força que podia um golpe definitivo na nuca do bichano. Ele, estrebuchando, só teve tempo de dar uma olhada enviesada no agressor e como sem entender, seus olhos perguntassem: por quê?

Só então o homem acordou da raiva. Arrependeu-se, mas era tarde. Não tinha mais volta porque lá estava o bichano inerte com as quatro patinhas viradas para cima. Mas antes que o remorso florescesse, teve uma ideia genial, digna de um crime perfeito: com a própria colher cavou uma pequena cova no último lance do piso inacabado, enterrou ali o gato, cobriu-o com terra socada e completou o seu túmulo com uma camada de concreto.

Ainda chocado passou a régua onde o gato tinha deixado suas crateras. Olhou o resultado desaprovando, mas que fazer já que estava exausto.  Juntou no carrinho de mão todo o material e já ia saindo quando a vizinha, uma solitária velhinha que morava no outro lado da cerca, encostou seu rosto enrugado num dos vãos e perguntou:

“- O vizinho não viu a Fifi por aí?”

“- Quem é a Fifi?”

“- Minha gatinha!”

Para não mentir, o pedreiro só balançou os ombros.

Sem uma resposta, ela abaixou seus olhos pensativos.

Depois continuou:

“- Sabe, moço, ela é danadinha! Mas não é má… Volta e meia foge para se encontrar com seus amantes pelos telhados da vizinhança… Eu a compreendo é moça e fogosa… Mas, vizinho, desde a morte do falecido me sinto tão sozinha que até eu preferia morrer, mas Deus é que sabe a hora. Então ela fica sendo minha única companheira e sinto tanta falta quando desaparece que não consigo dormir.”

gato (do livro inédito, Pobrete mas Alegrete)

 

 

 

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Malícia de Bernini contra Borromini na Piazza Navona

 

Bernini provocou Borromini. A mão da escultura sugere que a Igreja irá cair

A partir de uma posição estratégica do olhar, a escultura de  Gian Lorenzo Bernini (1598-1680), inserida na  Fonte dos Quatro Rios, a que está à frente Igreja de Santa Agnes em Agone, na Piazza Navona, em Roma, sugere ao espectador, pela mão erguida, que está tentando se proteger de um possível desabamento da igreja.

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A travessura de Bernini se é verdadeira ou não, ninguém sabe.

Mas deve ter surgido para justificar a rivalidade que existia entre ele e o arquiteto Francisco Borromini (1599-1667) que fez a igreja. Os dois artistas disputavam na época o título de Grande Mestre.  A história ainda é contada entre os romanos em tom de diversão e brincadeira.

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A rivalidade, no entanto, entre os dois artistas e arquitetos do barroco italiano é célebre e registrada na história.

A Fontana dei Quattro Fiume ( Fonte dos Quatro Rios) foi projetada por Bernini com figuras representando os rios dos quatro continentes, o Nilo, o Danúbio, o rio da Prata e o Ganges.

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Fontes magníficas

Lenda ou verdade, o fato é que as obras de Bernini são magníficas e colocam a Piazza Navona como roteiro turístico obrigatório numa estada em Roma. Principalmente, porque o local registra dois tempos na história da arte, o de estrutura barroca, protagonizado por Bernini no planejamento e criação das três fontes, mais recente, e a história do local, que era um estadio romano, de Domiciano, construído pelo imperador do qual recebeu o nome, no ano 85, cujas ruínas ainda são visíveis nos subterrâneos da igreja e de alguns palácios situados ao redor da praça.

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Ruínas do portal do estádio Domiciano. Foto Internet http://turismoemroma.com/estadio-domiciano-subterraneo-praca-navona/
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O estádio foi construído para jogos atléticos pelo imperador Domiciano, com base num modelo grego, com uma área que media 275 metros de comprimento por 106 de largura e um dos lados curvalíneo. Passou por restauração no ano 228, na época do imperador Severo Alexandre e depois foi progressivamente se desmontando. O lugar foi ocupado, no Renascimento, por uma praça que repetia exatamente o seu formato e as suas dimensões, conservando o lado curvalíneo ao norte.

O seu nome deriva provavelmente dos jogos que ocorriam naquela área, da expressão latina “in agone”, teria passado com o tempo, à palavra italiana “nagone”e, depois à definitiva transformação em “navona”- grande navio – devido ao seu formato. No século XVI já era área favorita dos nobres que habitavam Roma. Neste século surgem os esboços das duas fontes que hoje fazem parte das extremidades da praça: Fontana Del Nettuno e Fontana Del Moro.

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Foto Internet. www.hotelbailey.com

 

No século XVII, no pontificado de Inocêncio X ( 1644-1655), a praça atinge o auge da sua transformação arquitetônica. A Bernini coube remodelar as duas fontes e construir uma central, a dos Quatro Rios, e a Borromini foi delegada a tarefa de construir a igreja de Santa Agnes in Agone. As obras aconteceram entre 1653 a 1657.

Borromini sofreu críticas mordazes ao construir a fachada da igreja de forma côncava para criar um efeito óptico que ampliasse o desenho da cúpula,uma novidade arquitetônica para a época. A suspeita popular era de que a fachada da igreja não se sustentaria diante do peso. O tempo provou o contrário, quatro séculos depois de construída, Santa Agnese in Agone continua imponentemente de pé.

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Festas juninas inspiram o Brasil de Norte a Sul

Junho acabando e o Brasil este ano brincou apenas pela intenção. As pessoas dançaram em casa e relembraram as que participaram antes da pandemia, animadas pelo ambiente da web,  e prestigiando seus sanfoneiros favoritos. Entre as mais animadas das festas da cultura popular e rica em folguedos, é a Festa de São João, dia 24 de junho.

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Foto por Mari Weigert . Porta de uma casa em Natal, Rio Grande do Norte.

No nordeste os festejos são mais presentes na vida das pessoas, nas decorações das casas, dos bairros e das lojas.

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Decoração temática de Campina Grande, na Paraíba. Parque do Povo. Foto por André Figueiredo

O santo que faz o povo dançar, pular fogueira, está presente em todos os lugares, com sua imagem e tradições, na comida e na roupa. A doutoranda em Ciências Climáticas, que vive em Natal, mas é de Maceió, Micejane Costa,  recorda da animação de sua cidade com saudades. Ela “puxa-sardinha” para sua gente e diz que lá, em Maceió, é festa em toda parte.

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Forró pé-de-serra em Campina Grande. Foto por André Figueiredo.

Outros arriscam a dizer que a melhor Festa de São João do Brasil é de Campina Grande, na Paraíba. Elba Ramalho, a musa da música regional brasileira, comanda quase sempre a brincadeira e este ano esteve lá na véspera.

No sul, as homenagens a São João são mais tímidas, aparecem em comércios e escolas e salvo algumas exceções, grupos de amigos e famílias que se reúnem para comer muita pipoca, quentão e pinhão.

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Pinhão, fruto produzido pelo Pinheiro, Araucária Angustifolia, Foto Internet .

Mesmo assim,  vale destacar essa tradição como uma genuína representação da arte popular e do espírito alegre e singelo do povo brasileiro. Da sua origem pouco se sabe. Algumas pesquisas relatam que as Festas Juninas vieram com os portugueses, jesuítas, entre outras. As primeiras referências sobre Festa de São João segundo o informação publicada no site da Uol, datam de 1603.

Se animação é maior no sul ou nordeste não vem ao caso. O que realmente importa é a força desta tradição arraigada na memória do povo e de suas origens.

A música “Capelinha de Melão”não é literalmente um São João dentro de uma capela feita de melão. A  cisma da autora do blog Colhendo História traz um pouco de luz sobre assunto. É uma auto do Rio Grande do Norte, com cânticos pastoris e danças, realizado na noite de São João. Confirma o blog de Arte em Cultura em São Miguel do Gostoso.

Olhar Crítico

A festas tradicionais brasileiras são de interesse do comércio e da mídia. Quase todas, como o carnaval, se transformam em espetáculo com muito consumo, bebidas e vendas. Embora seja esta realidade em eventos grandes como o de Campina Grande, na Paraíba, o consumismo exagerado não invalida o objetivo principal. A crença de um povo que gosta de brincar, dançar e cantar.