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Encontro com as obras de Leminski em Lisboa. Surpresa gostosa!

É uma boa surpresa quando você está fora de seu país e encontra uma obra de um conterrâneo sendo exposta ou destacada. "Se não fosse isso e era menos não fosse tanto era quase".

Assim foi ao ler a frase ‘existencial’ acima e se deparar com a foto de Paulo Leminski ( 1944 – 1989) numa janela, no momento em que caminhava na companhia da filha em uma calçada lisboeta para visitar outra mostra, Rapture – Weiwei, na Cordoaria Nacional. 

É Leminski?, perguntou Marcela. Confirmamos a duas que era uma mostra dele, do poeta, escritor e artista admirado, gente da nossa terra, lá do Paraná.  Múltiplo Leminski estará até 3 de novembro, na Casa da América Latina, em Lisboa Portugal.

A sensação de acolhimento foi muito gostosa e para o leitor pode parecer meio esquisito, cafona, dizer que achamos por acaso.  Deve pensar: Uai… não lê a programação cultural da cidade que visita para saber?

Confesso que essa deixamos passar ou porque não recebe tanta publicidade  como uma mostra em espaço culturais mais badalados.  Mas vale dar o tom da emoção e espontaneidade para o leitor sentir como a afetividade cultural alimenta a nossa a alma quando está distante da nossa terra natal.

O escritor, poeta e músico paranaense, Paulo Leminski foi expoente da literatura brasileira do século XX e deixou obras que transitam por todos os campos culturais e artísticos,  sobretudo uma personalidade marcante como pensador de cultura e autor de “experimentações verbais e visuais”,  como destaca Alice Ruiz, poeta e escritora que viveu com Leminski 20 anos. 

Erudito, culto, poliglota, não passou incólume, no entanto, à geração rebelde e furiosa dos anos 60.
“Nós somos de uma geração que sonhou muito alto. Em algum momento, acreditamos que realmente pudéssemos mudar o mundo”, atesta Alice Ruiz, num depoimento emocionado (…)

O próprio poeta orgulhava-se das canções que tinha composto, muitas transformadas em verdadeiros clássicos na voz de Caetano Veloso, Itamar Assumpção, Moraes Moreira ou Ney Matogrosso. Orgulhava-se também de pertencer à geração que pretendeu “derrubar as estantes, as estátuas, as vidraças”. Por outro lado, cultivava um profundo rigor herdado da poesia concreta e da familiaridade com os monumentos literários da humanidade, de Ovídio a James Joyce. Poetas de primeira grandeza, como Haroldo de Campos, perceberam rapidamente a peculiar originalidade de sua poesia: o hábil artesanato aliado à loucura, à urgência e à rebeldia da geração de um Frank Zappa ou de um Rolling Stones.
Segundo Alice Ruiz, a paixão pela juventude e ao mesmo tempo as antenas conectadas com textos de ruptura acompanharam a trajetória de Paulo Leminski desde o início. Catatau, o primeiro livro publicado, ainda nos anos 70, só encontra paralelos nacionais no Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa ou nas Galáxias, de Haroldo de Campos, conforme o crítico Leo Gilson Ribeiro escreveu. Mas nesta própria prosa repleta de abismos e armadilhas verbais, o germe diferencial já estava alojado. No livro, René Descartes tenta compreender o Brasil. Em uma mão, uma luneta. Na outra, um cachimbo recheado com maconha.
— Quando conheci o Paulo, ele já tinha cabelos compridos. Mas já era um cara culto, erudito, só falava de Homero, Ovídio, Pound, Joyce, Rimbaud. Era um clássico aos 20 anos e um rolling stone aos 40. Na realidade ele foi se tornando cada vez mais jovem. Tinha uma irresponsabilidade total da juventude, aos 40 anos — relembra Alice. Fonte: texto de Ademir Assunção clique aqui para ler completo

Múltiplo Leminski é um projeto que resulta na  catalogação completa das obras do poeta. A mostra pretende apresentar as diversas facetas artísticas do talentoso paranaense.

A mostra no Brasil foi visitada por mais de 300 mil pessoas e apresentou, além de fotos e a trajetória do artista,  objetos pessoais que fazem parte do acervo da família . Conheça mais aqui sobre o projeto

Por ironia do destino, Leminski pouco saiu de Curitiba em vida, salvo algumas viagens ao Rio e a São Paulo,. Pelo contrário, sua obra, está já  circulando fora das fronteiras brasileiras.  Evoé!

Alice  Ruiz no texto de apresentação compara Leminski a um navegador que usou as palavras como bússola e percorreu com  destrezas todos os rios que a palavra o levou. 

Porém, conta que foi um navegador apenas pelo pensamento, mente, coração. Fisicamente nunca saiu do Brasil e poucas de Curitiba. Sempre preferiu suas cidade  natal e numa forma criativa de declarar amor à sua terra dizia: “pinheiro não se transplanta”.

A mãe de Aurea, Alice Ruiz, e a irmã, Estrela Ruiz Leminski, são corresponsáveis pela curadoria. A ambientação e cenografia são assinadas pelo designer Miguel Paladino.

O projeto Múltiplo Leminski inclui atividades paralelas: palestras, ações educativas, shows, intervenções poéticas urbanas e artes de rua. Tudo para envolver os locais e deixar sementes por onde passa.

“Leminski era generoso com os jovens, que se sentiam especiais quando conversavam com ele. É um lado que a mostra também valoriza, trazendo o poeta mais perto das pessoas”, avalia Alice Ruiz.

“Quem nunca viu que a flor, a faca e a fera tanto fez como tanto faz na fraca carne, um pouco menos, um pouco mais, que nunca viu a ternura que vai no fio da lâmina samurai, esse, nunca vai ser capaz”.

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