O efeito “não acabado” impresso pelo estilo de Auguste Rodin (Paris 1840 – Meudon 1917), em algumas esculturas, envolve o interlocutor (aquele que dialoga com sua obra) a tal ponto que o deixa livre para criar a sua própria poética.
Desse modo, ao renunciar os traços transparentes e precisos dos mestres escultores clássicos do passado, Rodin revolucionou sua época e talhou no mármore uma forma que se tornou conhecida em todo mundo. A curadora Alice Magniem, do Museu de Rodin, em Paris, diz que: “Se a mão do escultor é fundamental para os seus interlocutores, é claro que Rodin mantém em separado as coisas: de um lado a criação e o modelo, dos quais têm plena responsabilidade, de outro a execução real que não hesita em envolver o cliente ao ponto de o fazer escolher o título que deseja.
Mais adiante completa que, “A mão aqui é o ponto crucial por que o papel (real e imaginário) que Rodin desenvolve está no centro da valorização ao realizar seus mármores, ou em oposição às críticas ao longo do século 20.
A ilusão da carne e da sensualidade e pelo qual são classificadas as obras do início da carreira, em estilo clássico, entre as quais aparecem o Homem do Nariz Quebrado, recusado pelo Salão de Paris de 1864, que homenageia o grande gênio Michelangelo.
No topo está o “Beijo”, que representa a escultura de dois amantes e que escandalizou a França no fim do século XIX e ainda atrai visitantes para o Museu de Rodin, em Paris.
“O mármore é um material rico de referências na Antiguidade, da mitológica Grécia Antiga até a Itália renascentista de Michelangelo. Frequentemente, a tradição tem nos ensinado que a escultura tem por objeto o corpo nu e o mármore é considerado o material mais adaptado à sensação da carne. O mármore, sólido e frio, deve adquirir suavidade e calor e sob o cinzel do artista e transmutar-se em matéria palpitante. Para Rodin, o mármore não somente evocava o passado glorioso, mas permitia jogar com a luz e sombra, reentrâncias e saliências e é nisso que se encontra a força de Rodin e da sua revolução, em oposição a um neoclassicismo que olhava a antiguidade como única matriz estética e formal”, diz a curadora do museu.
A segunda fase o artista está em plena maturidade a partir do ponto de vista da capacidade de elaboração das figuras que emergem dos brancos blocos de pedra. Nesta fase algumas obras que exaltam o amor e a sensualidade já deixam transparecer uma nova ideia de escultura.
A poética de deixar incompleta a obra está caracterizada na terceira fase que representa o triunfo do “não acabado”. É neste momento que Rodin encontra a chave para modernidade. Uma relação com o mármore diferente do que era visto até o momento. Uma relação que o seus contemporâneos o viam como um dominador pelo qual a matéria tremia. “A suas esculturas, longe de ser convencionais, dão vida e forma à modernidade, revivendo a matéria clássica destinada, por sua natureza, à imobilidade”.
Olhar Crítico
Os artistas expressam em suas obras a vida em que estão inseridos no momento. Angústias, anseios, exigências, necessidades, emoções passageiras, efêmeras, no contexto tempo, porém quase perenes nos efeitos da arte. Impossível ver a sensualidade dos temas escultóricos de Rodin no mármore e não lembrar de Camille Claudel, sua aluna, modelo e amante.
A paixão avassaladora vivida pelos dois intensificou as linhas de muitos de seus trabalhos e esta intensidade estão expressas em esculturas, como O Beijo ( cerca de 1882),Amor e Psique(1885), Amor Fugitivo (1885), Zeffiro e Psique (1900). Nestas obras o masculino e o feminino se fundem e fazem o mármore pulsar.
Mas a poética de Rodin muda depois de 1898, quando Camille decide terminar a relação entre os dois. As esculturas que foram produzidas a seguir estão totalmente fixadas no seu estilo: “não terminado”. O Segredo (1909), Arianna (1905), A mãe e a filha moribunda (1910), Adão e Eva (1905), entre outras, deixam o espectador livre para realçar o tema. Em suas esculturas, Rodin abre as portas da modernidade ao dar movimento ao mármore duro a seu estilo.