
Por Luiz Ernesto Wanke – Este é um ‘causo’ acontecido em Brasília. Como sabemos a nossa capital é toda planejada, com prédios iguais distribuídos em conjuntos, tendo entre os blocos aquelas alamedas de árvores frondosas. Este, dessa história é um prédio diferente, novo, com apartamentos médios e que se destaca por ter no último andar uma pequena cobertura proporcional à área da morada daquele espaço. Dela podia se ver na parte frontal uma pracinha que, por estar perto da Universidade de Brasília, era frequentada por jovens.
O apartamento tinha uns cem metros quadrados, mas era premiado por uma sacadona no último andar, justamente o detalhe que tinha encantado o meu amigo Sérgio e o convencido a compra-lo. Era uma delícia: lá em cima ele dormia nas noites de calorão e era também seu lugar preferido para esticar sua rede, ouvir músicas e ler o jornal diário. De lá ele via toda a movimentação da vizinhança, as copas das árvores e também os jovens universitários nas suas folgas. Alguns deles fumando baseados.
Claro, também acompanhava os passarinhos que ele adorava. Debruçado sobre a murada, um dia viu sobre um galho de uma mangueira, um ninho com quatro filhotes zelosamente alimentados pela mãe sabiá que voava dando grandes e graciosas voltas buscando alimento. Mas numa dessas ausências cíclicas da sabiá, um miserável gato malhado subiu rapidamente pelos galhos da árvore, numa destreza espantosa, abocanhou um dos filhotes e ainda, sob os olhos horrorizados do Sérgio, desceu rapidamente e comeu o bichinho em baixo de uma dessas caixas metálicas de lixo.
Agora que o gato tinha achado o caminho, o destino dos filhotes seria virar comida? Não, era muito para a sensibilidade do Sérgio. Matutou, matutou e achou uma solução. No dia seguinte emprestou uma longa escada e foi retirar o ninho. Mas onde coloca-lo ao alcance da mãezona? Ora, na sacadona, um lugar seguro e sem acesso do miserável bichano. Foi o que fez, arriscando despencar das alturas, mas enfim ficou feliz ainda mais quando a mãe sabiá achou o ninho com seus filhotes no meio da folhagem de sua mulher, num lugar mais seguro possível.
Agora sim, Sérgio estava feliz, acompanhando da sua rede o trabalho incessante da mamãe sabiá indo e vindo com a comida. Mas como nem tudo é perfeito, ao longo da semana surgiu um problema: dois dos sobreviventes do ninho eram mais espertos e sempre eram eles que abocanhavam a porção da mãe deixando o menorzinho sempre faminto. E o miudinho ia cada vez mais definhando.
Outro problema para o Sérgio resolver. Que fez?
Mãos à obra: emprestou uma pá e lá foi ele cavar o jardim do prédio buscando as minhocas para o menorzinho. Sentiu-se feliz porque a quantidade de minhocas que conseguia dava para alimentar toda a família, facilitando a tarefa da mãe sabiá.
Assim virou uma rotina para o Sérgio. No começo fazia este trabalho com satisfação, mas foi ficando cada vez mais chato porque tinha que balizar seus horários de trabalho para satisfazer a necessidade de alimentar a família sabiá. Mas se conformava porque seria uma tarefa de tempo limitado até os filhotes irem embora.
Mas sua mulher – vejam só – começou a reclamar da sujeira que mamãe sabiá fazia na sacada. Sem problemas, Sérgio arrumou um paninho molhado que ele mesmo usava para limpar as carimbadas da madame. Tinha até uma latinha para guardar o pano.
Bem confortáveis e, principalmente, melhor alimentados, os filhotes foram crescendo e ganhando penas. Sérgio ficou aliviado porque agora era hora dos bichinhos apreenderem a voar e, claro, também de cada um dos personagens desta história cuidar da própria vida.
Seus olhos brilhavam ao ver os pequeninos dar as primeiras tentativas de voo. No começo todos bonitinhos como qualquer filhote, mas logo foram se encorpando e passaram a voar por toda a sacada, de um lado para outro, desajeitados, derrubando os vasos, estragando a folhagem e pintando tudo de branco com suas cacacas fedidas. Nada escapava nem o chão, as paredes pintadas de nova e folhagens da mulher. Sérgio não mais vencia limpar aquele caos.
E sua mulher buzinando no ouvido… Ela ficou tão brava que ameaçou mudar-se para a casa da mãe. Ele, coitado, só pedia mais alguns dias de paciência porque o tormento estava se encaminhando para uma solução final.
Graças a Deus, foi o que aconteceu. Um dia ensolarado a família empenada finalmente se mandou sem se despedir nem agradecer. Uns foram para o prédio ao lado, outros para a praça dos viciados. Então o Sérgio encheu-se de brio e satisfeito foi contar a grande novidade para a mulher. Até prometeu-lhe que no sábado faria a faxina geral da sacada restabelecendo o território dos humanos.
No dia, foi o que fez. Foi duro. Cansado, tudo limpinho, arrumou sua rede, colocou o fone de ouvido e buscou seu aparato para as leituras. Mas logo caiu num sono gostoso.
Não é que foi acordado com um alarido dos antigos moradores? Lá, apoiados na murada estava toda a família sabiá reclamando… Pela gritaria, queriam a comida de direito!
Sérgio levantou-se silenciosamente e foi para perto da mãe sabiá. Então, sem nenhuma delicadeza, gritou, liberando toda raiva acumulada nos ouvidinhos dos passarinhos:
“- Se virem!!!”
(do livro inédito, ‘Pobrete, mas alegrete’)





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