Andy Wharhol - Sopas Campbel

Um ano sem…

Sim, vim aqui despertar o desafio. O desafio de um ano sem… Sem que? Sei lá. Você que sabe.

Enfim, complicado. Acabo de ler uma matéria de Camila Carnielli que se propôs a passar um ano sem comprar roupa. Nos tempos que correm, tarefa quase impossível. Cheguei a pensar em fazer o mesmo, mas já estou fazendo exceções para calcinha e sutiã.

Curiosamente ano passado, sem ter colocado o desafio, foi um ano que praticamente virei sem comprar quase roupa. Nos últimos meses cheguei a comprar mais e de certa forma estas compras despertaram meu consumismo. Ainda que esteja feliz com todas as prendas, se elas não estivessem no armário também não ia fazer grande diferença.

Consumismo

A questão do consumismo é uma questão complicada de abordar. Não quero ser a pessoa demagógica que transmita a ideia que o consumismo é ruim e deve ser combatido. Não gosto da demagogia e tento combatê-la com ideias equilibradas. As ideias demagógicas só ajudam a reforçar os estereótipos e extremismos, seja de um lado ou de outro. Quando todos sabemos que a vida não é preta ou branca, e a linha entre o certo e o errado, entre o bem e o mal é tão estreita que temos sim que cuidar com aquilo de disseminamos e pregamos.

Agora bem, quando li essa matéria na revista Vida Simples, tenho que dizer que gostei muito do desafio como um bom exercício. Se trata de uma pessoa, a própria autora do artigo, que se propõe passar um ano sem comprar roupa como forma de reflexão. Não porque o consumismo é mal, mas porque o que ela estava consumindo não era o que ela queria ou se definia como pessoa. Para encontrar essa pessoa que estava dentro da caixinha ela teve que fazer uma escolha, que lhe ajudasse a chegar a essa conclusão.

Às vezes paro e penso que deveria fazer o mesmo. Com as roupas, com os sapatos, as bolsas, ou qualquer coisa que está tirando a gente do foco. Quem sabe, se nos propormos a esse desafio “Um ano sem…”, possa ser um bom exercício para pensar se realmente o que temos em casa é realmente necessário.

Faxina anual

Todos os anos, antes do ano novo, faço sempre uma limpeza geral na casa. A ideia é limpar cada cantinho, abrir as janelas, deixar o ar correr e tirar absolutamente tudo que não é necessário e não se usa mais: doar roupa, sapatos, livros, e tudo aquilo que só faz volume em casa. E me dói encontrar alguma peça de roupa que comprei e nunca usei… e chegar à conclusão que só comprei por mero consumismo.

Por outro lado, também gosto de ver as boas compras, aquelas peças que me lembro quando comprei o muito que as uso diariamente.

Seria um bom exercício passar um ano sem comprar futilidades para pensar em aquilo que realmente é necessário. Uma das coisas que adorei do exercício da Camila, é que isso a ajudou a pensar nos seus valores e naquilo que a define. Deixar de comprar por uma temporada ajudou-a colocar as ideias em ordem.

Em uma das minhas livrarias preferidas em Madrid, me lembro que tinha um texto impresso em uma das estantes que me chamou muito a atenção. O título do artigo era Como fomentar a leitura?, artigo publicado no jornal El País em 2015. A texto dizia:

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“Somos una sociedad mercantil que necesita, para seguir existiendo, consumidores y no lectores. La lectura inteligente y detenida puede alentar la imaginación y fomentar la curiosidad y, por lo tanto, hacer que nos neguemos a consumir ciegamente. Es por eso que Christine Lagarde, ardiente defensora de las sociedades de consumo, cuando era ministra de finanzas durante el Gobierno de Sarkozy, dijo a sus conciudadanos que se quejaban de la crisis: “Trabajen más y piensen menos”Madame Lagarde sabía muy bien que un pensador nunca sería un buen consumidor”.

Quem sabe essa é uma das claves para deter o consumismo irracional e compulsivo. Ler pode ser uma das claves. Outro, pode ser o exercício da Camila. Para os menos radicais, um pequeno exercício pode ser perguntar várias vezes se o que você está comprando é realmente necessário.

Nem bem, nem mal

O consumismo não tem porque ser mal, desde que seja consciente e meditado. Compramos porque realmente queremos, precisamos e vamos dar uso ao que se compra, ou por mero desejo de adquirir o bonito e levar para casa.

Eu confesso que seria legal entrar no exercício da Camila. Um ano sem comprar roupa pode me ajudar a colocar as ideias em ordem e quem sabe potencializar a minha economia. Agora cuidado: cuidado para não substituir um consumo por outro. Porque no final o exercício vai ladeira abaixo e quando você vê está gastando com outra coisa.

É curioso, mas até hoje acho que não tenho televisão em casa por isso. Quando me mudei de apartamento cheguei a pensar em comprar uma TV e até fui atrás de uma. Cheguei a conclusão que uma TV não me aportava em nada e só ia fazer volume na minha nova casa.

Se eu queria ler mais nesse ano não podia comprar um objeto que captasse minha atenção e passasse por cima dos meus objetivos.

Pensemos qual é o objetivo do exercício que pretendo alcançar fazendo isso: gastar menos, descobrir minha identidade, definir-me melhor como pessoa, viver com menos. Dependendo daquilo que você se proponha, “Um ano sem…” pode incluir várias coisas.

Mas mais que nada, busquemos o consumo inteligente.

Composição - Jean Helión. 1934

A coleção de Peggy Guggenheim

A coleção de Peggy Guggenheim( 1898-1979) é um delírio para todo amante da arte moderna do século 20. Visitá-la no Pallazzo Vernier dei Leoni, em Veneza, Itália, é entrar no passado, percorrer  a história da arte ao vivo e a cores nas obras de Picasso, Max Ernst, Marc Chagall, Man Ray, e outros artistas que  testemunharam uma época efervescente e desejosa de mudanças…

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A paixão de Peggy Guggenheim deixou um legado inestimável para estudiosos pesquisadores, historiadores, amantes da história da arte no Ocidente. Envolve cubismo, surrealismo e expressionismo abstrato. Ela foi a mais importante colecionadora e mecenas de sua época.

Era de família rica de Nova York. O pai morreu no naufrágio do Titanic em 1912 – Benjamim Guggenheim e sobrinha de Solomon Guggenheim que idealizou a fundação que hoje existe em diversas partes do mundo, com os famosos e arrojados em arquitetura, museus Guggenheim.

Veneza

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Sua coleção está preservada na Sereníssima, na beleza arquitetônica do Palácio Vernier. Construção de 1748, inacabada, assinada pelo arquiteto Lorenzo Boschetti.

Peggy teve uma vida cheia de glamour e diversos maridos. Viveu entre Londres, Nova York, Paris e Veneza, onde terminou seus dias.

Obras

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Pablo Picasso – Buste d’homme en tricot trayé. 1939.

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Marc Chagall- A Chuva. 1911

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Salvador Dalí – Sem Título. 1931

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Amedeo Mongliani – L’Femme en blouse Marine. 1916

 

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Alexander Calder – Brincos para Peggy Guggenheim. 1938.

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Andy Warhol – Flores. 1964.

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Marchel Duchamp – Bôite-en-valise. 1941.

Essa é uma pequena demonstração das obras que existem nesse palazzo maravilhoso. Pollack, Tanguy, Men Ray,Vasily Kandisnky, Marcel Duchamp, e muito mais.

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Ao visitar uma coleção como a de Peggy Guggenheim o espectador tem a oportunidade de se transportar no tempo, atingir a memória histórica, viver cada momento de criação de uma obra, percebendo o olhar do artista no instante em que nasce a obra. Se passar por Veneza e gosta de arte, não deixe de conhecer esse importante acervo que faz parte da história da arte do mundo moderno europeu e americano.

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Missa da Benção em Salvador. Extraordinário sincretismo

Se fosse no passado os participantes e o padre seriam queimados na fogueira pela Inquisição, tal é o sincretismo entre os ritos católicos e africanos. Estamos falando da missa mais original celebrada no mundo, a Missa da Benção. certamente, na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, em Salvador, na Bahia.

A celebração religiosa é emocionante, imperdível. Isso para quem é ecumênico e multidisplinar em suas crenças. Pode tornar-se chocante para os mais conservadores que acreditam que a instituição religiosa a que pertence é a única verdade existente.

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Igreja erguida pelo fervor dos escravos e alforriados.

A Missa da Benção coloca o catolicismo e o candomblé lado a lado e é rezada todas às terças-feiras, às 18h, e aos domingos, às 10h, ao som dos atabaques e cantos africanos, com a participação de padres e pai-de-santo.

Uma celebração que somente no Brasil poderia acontecer e, talvez, para lembrar sempre que da triste história da escravidão em terras brasileiras. Também da humildade e religiosidade desse negro que sofreu no Pelourinho, pelas mãos de brancos algozes.

História da Igreja

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Segundo fonte da Wikipedia , os negros escravos e alforriados eram muito devotos de Nossa Senhora do Rosário.

De acordo com frei Agostinho de Santa Maria, desde os inícios do século XVII os escravos e forros veneravam Nossa Senhora do Rosário num altar da Sé da Bahia, em Salvador. Como outros grupos da colônia, também os negros se organizavam em agrupações religiosas de ajuda mútua, as chamadas irmandades ou confrarias. Na segunda metade do século XVIII, quase todas as freguesias de Salvador possuíam alguma irmandade de negros.

A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Salvador foi formalmente constituída em 1685 (…).As irmandades de negros começavam reunindo-se nos altares laterais de igrejas matrizes ou conventuais, mas em 1704 a do Rosário reuniu o dinheiro necessário e recebeu a permissão do arcebispo DSebastião Monteiro de Vide para a construção de uma igreja própria nas Portas do Carmo.

A construção da Igreja do Rosário foi um processo lento, pois a irmandade era relativamente pobre e os irmãos da confraria doavam seu trabalho para a construção em suas horas livres (…)

Vídeo que mostra a missa quase inteira

Esse vídeo é amador. Mas foi uma maneira que encontrei para registrar algo tão profundo e, certamente, só é possível vivenciar no Brasil. As imagens estarão comigo até o final de minha vida, sobretudo o momento do ofertório. Maravilhoso!

 

 

R. Magritte - Golconda

Terapia e autoterapia – a arte do autoconhecimento

Como muita gente no Brasil, na adolescência frequentei o psicólogo. Não porque tivesse grandes problemas, problemas impossíveis de ser resolvidos ou porque alguém pensou que eu não fosse normal. Na realidade, fui ao psicólogo porque sou normal.

E adolescente, como tantos outros experimentei essa fase hormonal, esta transição entre ser criança e vida adulta… a aproximação, a realidade e comecei e notar que dentro de mim tinha muitas e muitas dúvidas.

Preconceito

Eu falo isso, porque noto que aqui na Espanha existe um certo preconceito com a palavra psicólogo ou terapia. Muitos dos meus amigos que vão hoje ao psicólogo não têm coragem de falar em nenhum dos seus círculos que fazem terapia.

E isso foi um fator que me chamou a atenção. A terapia não é vista nem encarada com bons olhos, e muitos entendem que quando uma pessoa é derivada ao psicólogo é porque sofrem de algum problema ou transtorno bastante avançado.

Às vezes chego a pensar que algumas dessas pessoas que eu conheço chegaram a esse ponto porque na hora certa não foram ao psicólogo. Se eu pergunto por aqui, muitas pessoas dizem que preferem falar com um amigo a pagar um profissional para serem escutados. Ledo engano. O psicólogo não substitui o amigo nem o amigo substitui o psicólogo.

Um bom psicólogo

O certo e aonde vou com tudo isso é que um bom psicólogo no momento certo pode ajudar muito agente entender a nós mesmos e esforçarmos e nos tornarmos aquilo que queremos ser.  Obviamente o psicólogo vai te dar ferramentas, mas o único motor de mudanças nisso tudo é você. E você só vai começar a entender o que te falta ou o que você quer, ou quem você quer ser, se você se conhece.

Platão, um dos filósofos mais lidos e estudado de todos os tempos, é um dos pensadores que fala sobre o autoconhecimento. Conhece-te a ti mesmo. Tarefa difícil, sem dúvida. Muita gente quando é perguntada sobre si mesma não sabem nem responder: não sabem o que gostam, o que admiram, o que as motiva ou que tipo de pessoas querem ser. E isso é normal.

Principalmente na adolescência. Se nós adultos, que somos seres  cambiantes e inconstantes não sabemos e não nos conhecemos, como vamos deixar que um adolescente se enfrente a todos estes desafios sozinhos?

Não pretendo defender a terapia na adolescência, senão defender a terapia nessas fases da vida em que estamos mais perdidos que o normal e que uma ajuda profissional orienta a encaminhar essas decisões.

Encarar a pessoa que vejo no espelho

O psicólogo na minha adolescência, com o meu pouco conhecimento e experiência de vida, me ajudou muito a encarar essa pessoa que vejo diariamente no espelho. Me plantou a semente sobre quem sou e aonde quero ir. Junto com elas muitas pessoas no meu entorno me ajudaram obviamente, mas não com todo o conhecimento que se requer.

Com este trabalho feito anteriormente e com as ferramentas na mão pude caminhar em frente e começar a fazer um trabalho de autoterapia: entender o que me deixa feliz, o que me deixa triste ou o que me deixa frustrada. E isso é o motivo do porquê que estou escrevendo esse texto.

Frustração

Esse domingo, passei por uma situação realmente frustrante no final da minha tarde e me alterei tanto pela impotência de pode-la resolver que no caminho de casa me correram umas lagrimas.

Hoje, vendo a coisa já com outra perspectiva, o tema não é tão grave, mas naquele momento teve a capacidade de alterar de certa forma meu estado de ânimo.  O curioso é que quando entrei no metrô e estava metida na minha dor e frustração, comecei a respirar e dizer a mim mesma: isso tem solução e você não pode deixar que estes terceiros, que estas pessoas alterem o teu estado de humor.

Tinha uma cara de tão brava que notava que as pessoas no metrô me olhavam. Era visível o meu enfado. Foram 30 minutos no trajeto de casa em que comecei a dialogar comigo mesma: dizia que tinha coisas que não estavam na tua mão, mas o último que você pode deixar é que certas pessoas determinem seu estado de ânimo. Sei que tinha pilates mais tarde e que se chegasse em casa para resolver o tema perderia pilates e ficaria mais frustrada.

Diálogo comigo mesma

Então, basicamente, depois de todo esse diálogo comigo mesma, quando sai do metrô estava relativamente mais calma e fui pra casa com algumas decisões tomadas: primeiro que não ia perder pilates, que o tema podia ser resolvido depois e isso não implicaria e nenhum problema.

Segundo que ia a pilates correndo para de certa forma soltar toda esta frustração que tinha dentro de mim transformando em energia para o meu próprio benefício. E terceiro que não ia pensar no tema até voltar a casa porque isto só me causava ansiedade e não tinha porquê. E por último, olhando com perspectiva o tema realmente não era grave, já que tinha solução, ainda que me sentisse lesada.

Exercitar-se

De repente fazer esse exercício não foi fácil, mas foi muito produtivo. Já não é a primeira vez que faço isso, mas quem sabe ontem foi um desafio pelo tamanho da questão. Assim mesmo, passado todos estes meses lendo sobre filosofia, literatura junto com a minha passagem pelo psicólogo pude ver o bom que foi ter tido um profissional na minha vida.

No fim do dia, depois de sair a correr, fazer pilates, voltar para casa correndo e fazer ligações para resolver o problema, me senti orgulhosa de mim mesma e fui para cama feliz, fazendo que o meu fim de tarde que parecia que se ia torcer, se tornasse agradável de novo, porque soube identificar o problema, gerenciar meus sentimentos e aportar uma solução. Ou seja, depois de tanto tempo indo a terapia, fui capaz de fazer autoterapia comigo mesma e entender vários pontos de mim mesma e da minha frustração.

Autoconhecimento

Coisas como estas passam a diário na nossa vida e vemos como muitas pessoas soltam para fora a sua frustração de forma incontrolada. Até os mais controlados perdem o controle.  E aqui não se trata de dizer que as pessoas têm que ser controladas sim ou sim. O que quero dizer é que o autoconhecimento proporciona ferramentas para entender e gerenciar o que se passa com nós mesmos e isso é muito importante para determinar o teu nível de felicidade no fim do dia.

O psicólogo foi essencial para entender isso. Outra parte essencial foi eu mesma, como pessoa que queria mudar de atitude e ser uma pessoa mais positiva e emocionalmente inteligente. O resto do trabalho foi eu comigo mesma, os livros e as horas de solidão, reflexão contínua sobre o EU, trabalho continuo para seguir adiante.

Encarar a si mesmo sem complexos é fundamental.

Tendemos pensar que os nossos medos e dúvidas são únicos e não passam com os nossos amigos. Ledo engano. Passa e mais do que pensamos. Não é porque eles não falam ou não se manifestam sobre o que está acontecendo que isso não ocorre. Eu sigo tendo muitos medos e traumas, e ainda muitos deles não saberia com enfrentar. O caminho andado, o trabalho já feito me permite saber quais são esses medos e saber identificá-los no momento apropriado.

E se for necessário voltar a fazer análise. Os resultados sempre foram positivos.