Video instalação do artista argentino Sebastián Diaz Morales. Suspension. 2014

Vamos flanar em “Pensageiro frequente” de Mia Couto

O flanar foi a próposito para definir aquilo que eu senti lendo "Pensageiro Frequente" de Mia Couto. Um preambular pelo mundo, caminhar sem rumo observando a vida.

Isto é, Mia Couto me fez flanar sobre Moçambique, sul da África, por intermédio das palavras que ziguezagueavam e definiam o seu país de origem. 

E seu texto ahhhh…. Que texto maravilhoso para definir suas emoções e os lugares em que vive! 

“O Índico não é apenas da ordem geográfica: é um guardião de história de povos diversos. Viagens antigas não trocaram apenas genes, mercadorias, línguas e culturas.(…) Os adeptos da ‘pureza’ genética e/ou cultural que se desenganem: o que somos hoje é o resultado de mestiçagens antigas, tão velhas e complexas que nem sempre lhes seguimos o rasto.”

Imagem retirada da internet

Uma frase tão clara e simples e me faz lembrar das guerras com o objetivo de extermínio de um povo: como o genocídio de Israel e contra Palestina. Na presunção dos donos do poder e da guerra, com as mãos sujas de sangue, acreditam que podem banir da face Terra  um determinado ‘gene’. Assim foi com Hitler e seu discurso de ‘pureza’ de raça, que por ironia do destino, hoje o poderoso de Israel está  imitando o ‘austríaco insano’, isso sem o aval da maioria dos judeus de bom coração! E o que pior: o mundo assiste esse filme de terror e cruedade, pasmem, sem fazer nada contra, cujo protagonista principal é a indústria bélica dos EUA.

Mas voltemos aos nossos Pensageiros Frequentes de Mia Couto – o escritor e sua poética. Vale lembrar, que em Terra Sonâmbula Mia Couto fala da dor com poesia e emoção. Mas o que mais me apaixonou em seu livro de contos e crônicas que foram republicados, considerando que eles foram originalmente concebidos como revisa de bordo das Linhas Áreas de Moçambique. 

 

É poesia em prosa quase que inteiramente o livro. Para escrever sobre Maputo, sua cidade natal, ele coloca como título “A cidade na varanda do tempo”.  Pensem e sintam o conceito na ‘varanda do tempo.  Quando trata das chuvadas de fevereiro ele lembra da resistência das árvores.

 

Resistem também algumas árvores. Algumas delas são monumentos.  A velha phama do Xipamanine  que deu nome ao bairro. 

A kigelia  frente a fortaleza: quantas histórias, quantos mitos? Vale a pena visitar as cidades africanas por via das árvores que encerram lendas e carregam mais histórias que folhagem.

O texto de Mia Couto não é inspirador? Recomendo a leitura desses ‘pensageiros’. Tão inspirador que quando resolvi escrever sobre o livro lembrei da palavra flanar tão conhecida em leituras de arte e literatura  porque era usada pelo escritor e poeta francês do século XIX,  Charles Pierre Baudelaire, que usou flâneur  para tentar descrever o observador apaixonado. O verbo hoje é usado em diversas línguas, incluindo o português: flanar. 

“É um imenso prazer fixar residência na multiplicidade, em tudo o que se agita e que se move, evanescente e infinito: você não está em casa, mas se sente em casa em toda parte; você vê todo mundo, está no centro de tudo, mas permanece escondido de todos.”  fonte  AH (leia aqui)

clique na foto para visitar o site do artista

Que acham? Não maravilhosamente inspirador? De Mia Couto a inspiração foi até Baudelaire e continua, meus caros leitores. A foto principal que ilustra o artigo, eu a captei numa Bienal de Veneza, numa instalação do artista  argentino Sebastián Díaz Morales cuja obra é Suspension – 2014. Já usei-a várias vezes no site porque simplesmente é inspiradora para mim. Desconectada do seu real conceito, cada vez que a uso é para definir um flanar pelo mundo. Como se homem adquirisse asas e estivesse em pleno voo para olhar o mundo pelos sonhos. 

Não é fantástica a capacidade da arte nos estimular à inspiração e buscar novos conceitos para definir uma emoção!

Todas as frases acima são retiradas do livro Pensageiros frenquentes”.  Como Mia Couto, dos lugares da Terra eu prefiro os de água. Penso que é porque somos quase 80 por cento água em nosso corpo. Amo banhar-me nas águas de rio e mar e faço isso com frequência porque na minha fase atual, mais antiga, dei-me ao luxo de viver pertinho das águas maravilhosas da costa brasileira banhada pelo Oceano Atlântico, testemunho de tantas aventuras para chegar às Américas e morada final de muitos escravos vindos da África.  

” Um dos meus irmãos, quando menino e em estado de birra, ameaçava: – Vou fugir para Inhaminga. O que ele queria dizer era que ia para além do mundo, para onde já não havia estrada nem distância. Ele ultrapassava o limite do regressável e, assim, o nosso amor por ele era posto à prova. Jogo sem risco: o amor era maior que toda a distância.”Mia Couto.

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