São Paulo ou Rio? Madrid ou Barcelona? Carne ou peixe? Tem gente que sabe, tem gente que não, e tem gente que depende. Eu pertenço ao grupo dos depende.
E quando falam de vinhos, regiões vinícolas, nem se fala. Novo mundo ou tradição? Espanha ou França? Portugal ou Itália? Branco ou tinto? Monovarietal ou coupage? Malbec ou Merlot? Tempranillo ou Grenache?
E depende de que?
Depende de tudo ora. Do dia, da hora, do tempo, da ocasião, do preço, da região, do cardápio… e assim por diante. Sim; depende de tudo.
Para gostos, sabores; já dizia o ditado… e por que não muitos? Aqui não se trata de escolher um time de futebol, uma religião ou um partido político. Se trata de que a comida italiana é tão gostosa como a francesa ou a espanhola… é uma questão de experimentar.
Se tratando de vinhos então, a teoria é a mesma. Experimentar, experimentar e educar o paladar. De todos os cantos, de todas as regiões, de todos os lugares. Quanto mais melhor. Só assim você vai começar a entender as diferenças de um vinho para outro sem se perder no meio de tanta informação e de tanta crítica.
Uns dizem que os Bordeaux são melhores, outros dizem que os Borgonhas.
Tem os que não abrem mão dos Riojas, dos alenteijanos, ou dos Alvarinhos. Mas a verdade é que para quem está começando, dá no mesmo. Enquanto você não começar a provar tudo o que você vê na frente, vai ser impossível criar um critério próprio.
Por exemplo: No verão de Madrid dificilmente tomo um tinto numa esplanada. Ou no inverno dificilmente tomo um branco. Um peixe geralmente pede um branco, carne geralmente pede tinto: mas a regra não é restrita. Você acomoda ela como você quiser. Isso é como arte: não gosta, não compra!
Mas quando você começa a gostar, cuidado pra não se arruinar!
Nos últimos dois anos estive viajando pela França nas regiões mais míticas de vinho do mundo: Bordeaux e Borgonha. A primeira dominada pela produção das uvas Cabernet Souvignon e Merlot, e a segunda pelas uvas Pinot Noir e Chardonay. Disputas à parte, eu fico com as duas. Mas para os franceses, não cabe dúvida. Ou você é de uma ou é de outra. Menos mal que sou de fora e não tenho que escolher.
Desde que eu fiz essas viagens, França abriu meus horizontes e se revelou como um país completamente desconhecido.
Bordeaux fica quase na fronteira com a Espanha, sendo destino turísticos de muitos espanhóis que vivem na capital. A parte da cidade, que leva o nome da região e do tipo de vinho procedente dali, esta zona está repleta de subzonas que se diferem basicamente pela sua variedade e forma de elaborar o vinho. O resultado: uma diversidade digna de ser provada, degustada e repetida quantas vezes forem necessárias.
Ali estão os famosos Margaux, Médoc, Saint-Emilion, Pauillac, etc., etc. y tal. Todos cortado pelos rios Garona e Dordonha. Entre o correr das águas dessa região na margem esquerda do rio Garona é onde se cultiva os vinhos que dão fama ao lugar. No entanto, Saint Emilion e Pomerol caminham na mesma direção; se já não alcançaram.
Sai de Madrid de manhã e depois de 9 horas dirigindo, passando pelas mais belas paisagens do País Basco, Pirineus espanhol e francês, cheguei a Saint Emilion, uma das muitas regiões vinícolas da área.
A cidade, super pitoresca, batizou o nome de uma das muitas denominações de origem da zona. Poder andar pela cidade e ver que cada cantinho dela emana essa tradição foi uma experiência singular. Tanto é assim que o comércio local se dedica quase que exclusivamente ao vinho, e nas praças da cidade vendem mudas da variedade da uva Merlot. Levei duas mudas, uma está em Madrid e outra em Nanin, na Galícia. Uma pena que nenhuma das duas regiões têm a terra que tem ali, nem o clima. Mesmo assim, foi como levar um pedacinho dessa região a minha casa.
Provei vinhos excelentes, entre eles o Chateau de Ferrand ano 2005, uma das colheitas mais extraordinárias da região, que comprei uma garrafa e a tomei ano passado, 11 anos mais velho. Esse vinho foi um dos mais especiais que provei na minha vida. A experiência é digna de ser repetida.
Outra viagem inesquecível foi quando estive ano passado na Borgonha, a região mais sibarita da França, em que a tradição e a reputação dos vinhos são inigualáveis. Os brancos da região são dominados pela uva Chardonay e os tintos pela uva Pinot Noir, o contraposto da Merlot.
Cruzei de carro pela Borgonha afim de conhecer não só a história, mas também de viver uma experiência. E assim foi. Entre Dijon y Baune pude provar os vinhos da zona, suas diferenças, aprender um pouco mais e ver quão linda era essa região no centro da França. E com certeza umas das degustações para ficar na memória foi a que eu fiz no Château de Pommard, com vinhos especiais e únicos.
A Borgonha é mágica. Não tem só beleza, mas também encanto. E com toda certeza sua reputação faz jus ao nome. Produtores do mundo inteiro direcionam sua atenção todos os anos a essa região para aprender o seu segredo, desvendar o mistério do seu vinho. Até na Espanha, muitos projetos bebem da sabedoria borgonhesa.
É uma das grandes diferenças entre os vinhos do novo mundo e do velho mundo. A identidade dos vinhos borgonheses ou dos bordelenses não são só as castas, mas também a terra, o clima e a região, que no seu conjunto os franceses chamam de “Terroir”. É aí, onde os maiores sommeliers do mundo distinguem a sua singularidade.
Ali, uma parcela de vinhas corresponde a uma especificidade cercada por muros invisíveis. Cada parcela é batizada com um nome específico, que remonta as origens topográficas e/ou históricas. Foi com o passar do tempo, que os produtores da região foram aprendendo que cada parcela se podia atribuir características únicas, já que esta parcela não tem nada a ver com o que eles plantaram 15 metros adiante. Por isso, se disse que eles entendem do seu terroir como ninguém. Nem em Bordeaux os produtores são tão caprichosos.
Todo o vinhedo está dividido, com categorias mais diversas, que podem indicar a sua denominação de origem, a cidade, a região, a província ou a vila. No topo de toda essa classificação estão os Grands Crus, ou seja, “la crème de la crème” do vinho!
Como eu disse, para gostos, sabores… e também para bolsos. Porque convém dizer que a diferença de preço de um Borgonha para um Bordeaux é substancial. Mas continuo enfatizando que ambos são deliciosos: cada um para uma ocasião diferente.
Basicamente o que faz um vinho custar mais que outro sem dúvida é a sua forma de manuseio. No caso da Borgonha joga também a lei de oferta e da procura. Como a uva Pinot Noir é uma uva de difícil cultivo os produtores não plantam muito, senão que cuidam bem de perto aquelas que foram plantadas.
A parte de isso, tanto Bordeaux como Borgonha tem altos padrões de manejo, muitos deles, quase 100% artesanais, mas nem todos os produtores seguem essa regra. E dai vem um dos porquês que um vinho da mesma região apresenta preços tão diferentes.
Uma dica, na hora de comprar vinho, é perguntar ou pesquisar sobre o processos e o manuseio do vinho. Se ele for caro e o seu manejo é quase inteiramente mecânico, você já sabe que o que você está comprando é a marca ou a estratégia de Marketing. E isso não significa que ele seja ruim. Tem muitos vinhos que mantém processos industriais que são perfeitamente aceitáveis e muito gostosos.
Agora, o exclusivo e feito a mão tem um preço. Principalmente na Europa, que a mão de obra não é barata. A regra se aplica para quase todas Denominações de Origem: Riojas, Alvariños, Dão, Chiantis, Brunelos e Barolos.
E se falamos de França então, você tem ainda oportunidade de conhecer e se deliciar com vinhos da Alsacia, Côtes du Rhone, Provence…