Na hora marcada
O rapaz elegante adentra o jardim
Tão nervoso, por um triz não levou um escorregão
Vexame que poderia colocar em risco sua fama de valentão
Munido de uma rosa na mão
E com ares de galante conquistador
Tenta impressionar a mocinha
Que tinha um olhar lânguido como de uma fuinha
A coitada estava exasperada
Com receio que tudo acabasse em marmelada
O rapaz parecia ser um bom partido
Apesar da panca de metido
No fundo do quintal
O cachorro desconfiado deu um estridente latido
Sentaram-se no banco
Sem saber o que dizer
Ele havia escrito um discurso romântico
Mas no calor da emoção
As palavras de sua cabeça desapareceram de sopetão
O coitado começou a gaguejar
A mocinha em pensamento a praquejar
À certa altura e nada acontecendo
Ambos não conseguiam conter um irresistível bocejar
O silêncio era de amargar
Aquele romance de jardim parecia estar fadado a fracassar
Antes mesmo do próximo olhar se cogitar
O tempo foi passando
E o nervosismo mútuo pouco à pouco se dissipando
Ele de repente lançou uma bela piscada
Que causou no coração da moça uma fisgada
Estavam enamorados finalmente
Ambos agora promissores pretendentes
O rapaz tomou coragem e lascou um beijinho na moça
Que cheirava à detergente de lavar louça
O rosto dela ficou vermelho como uma cereja
Após sentir dele um bafo pesado de cerveja
A vizinha que observava à tudo atrás do muro
De tanta curiosidade ficou com o pescoço duro
Não conseguiu conter a emoção
De ter muito para fofocar na próxima procissão
Mulher de língua comprida
Que de tanto falar pelos cotovelos
Criou na língua um calo
Duro como de um brócolis o talo
À certa altura da conquista
O rapaz tentou avançar o sinal
A mocinha ofendida lhe lascou uma bofetada
Que senhora raquetada!
O rapaz nocauteado perdeu os sentidos
Sem dar-se conta, primeiro, dos pecados cometidos
A mocinha arrependida
Jogou-se no chão
Para socorrer o bonitão
Passou a alisar dele o viçoso bigodão
Que mais parecia um maço de algodão
Quando o pobre ainda atordoado pela chapuletada
Pediu que a moça lhe desse com amor um beijo
Uma legião agora de bisbilhoteiras
Se posicionaram atrás da vegetação
Em pelotão
Todo mundo queria ver
Que rumos levaria aquele romance de revista
Desabrochando em direção ao anoitecer
O rapaz depois do beijo
Sentiu-se leve como um pão de queijo
Perdidamente apaixonado estava
Pela mocinha desnaturada
O namoro de jardim
Acabou na porta da igreja
Depois de uma cerimônia benfazeja
Os dois pombinhos
Para a lua-de-mel partiram
Em amor e paixão se confundiram
Foram felizes e muito riram
Juntos para sempre
Almas gêmeas se descobriram
Adorei este poema irreverente Simone. Ao mesmo tempo tem a doçura dos tempos que não voltam mais.
Muito obrigada, Mari! Pois é, os velhos tempos de namoro de portão! É bom celebrar os anos dourados e aqui, queria também, colocar uma pitadinha de humor, que não faz mal a ninguém. Um abraço e muito obrigada pelo comentário!