Embora a Bienal de Veneza mobilize artistas contemporâneos de renome e seja um evento internacional fascinante para os que vivem o cotidiano das artes plásticas, a linguagem das obras e das instalações, algumas puras metáforas ou conceitos sobre um tema, é de difícil entendimento para o público leigo. Talvez por isso a arte contemporânea seja tão criticada em um tempo que se coloca em discussão o que é arte e não arte.
Muitas vezes a poética do conceito encanta muito mais que a própria obra e quando o espectador se posta diante dela para apreciá-la sente que a imagem material não corresponde ou não se formata com a viagem criativa que fez sobre o significado proposto a partir do conceito do artista.
É como ler um livro de ficção e depois assistir o filme sobre o mesmo tema. Existem anos-luz de distância entre a obra física, material, à concepção criativa do pensamento do espectador sobre o trabalho artístico. Este espaço entre a realidade visual e a magia do pensamento na poética da arte jamais será preenchido. O pensamento e a criatividade, tanto do artista, quanto do espectador, viajam até o infinito e a matéria é finita.
Por isso, existe uma espécie de decepção sentida pelo visitante leigo a uma mostra de arte contemporânea e isso consequentemente restringe o interesse para um grupo seleto. É uma pena! A arte contemporânea traduz, com refinamento, os paradigmas da sociedade moderna. Entender a atualidade sob o olhar da arte é aprimorar os sentidos.
Esta reflexão se faz necessária para interpretar o conteúdo das curadorias de bienais que ocorrem em todos os cantos do planeta, quanto conduzem o tema geral da exposição para questões sociais, ambientais e políticas. Nas sucessivas bienais de Veneza esta postura é visível, especialmente na 56a. Exposição Internacional de Arte 2015 que a atenção é voltada às questões geopolíticas mais urgentes. Leia mais no site da Bienal em italiano
Veneza está abrindo cada vez mais para participações de novas nações e o júri 56a. mostra, Naomi Beckwith(USA), Sabine Breitwieser (Áustria), Mario Codognato (Itália), Ranjit Hoskote (Índia), Yongwoo Lee (Corea do Sul), entregou o Leão de Ouro de melhor pavilhão para a representação da Armênia, sob o título Armenity, que se debruça sobre os 100 anos de genocídio armênio. As obras foram instaladas num mosteiro e na ilha de San Lazaro dos Armênios, na cidade italiana.
Neste pavilhão, que tem como subtítulo “Artistas contemporâneos da diáspora armênia”, estão expostas obras de 18 artistas convidados, entre eles a brasileira Rosana Palazyan, carioca, nascida no Engenho de Dentro, que faz parte da terceira geração – os netos dos que sobreviveram ao massacre perpetrado pelo Império Otomano na gigantesca e compulsória marcha para tirar os armênios da atual Turquia.
O melhor artista da mostra segundo o júri, foi Adrian Piper e quem levou o Leão de Ouro, com a obra The Probable Trust Registry: The Rules of the Game#1-3 (USA, 1948; Arsenale, Corderie). “Adrian é vanguarda na medida em que renovou a prática conceitual inserindo uma subjetividade pessoal – do seu ser, do seu público, da platéia em platéia em geral. A sua apresentação convida a uma prática permanente de responsabilidade pessoal ao caráter efêmero e fuga dos sistemas de valores”. Publicação original da premiação.
O Leão de Prata ficou por conta de uma jovem artista da Coreia do Sul, Im Huen-Soon, com Factory Complex, 1969. “Por um emocionante vídeo instalação que mostra a precariedade da nautreza em relação as condições do trabalho feminino na Ásia. Factory Complex é quase um documentário, mas é apresentado por meio do encontro direto e imediato, leve, dos sujeitos e suas condições de trabalho”.
Três menções especiais para Harun Farocki (Alemanha), Coletivo Abounaddara( Síria), Massinissa Selmani(Algeria).Harun recebeu por ter sido uma figura fundamental no cinema depois da guerra. Ao Coletivo da Síria, pela sua extraordinária coragem em documentar o conflito político e luta pela sobrevivência humana na Síria de hoje, sem se esgueirar. Para Massinissa Selmani pelo trabalho realizado por intermédio de um simples médium, mas capaz de incindir além de sua dimensão. O juri decidiu também premiar o pavilhão dos Estados Unidos pela representação da Joan Jonas, um artista importante por sua obra e sua influência – They Come to Us Without a Word.
Brasileiros
O pavilhão brasileiro se representa na Bienal de Veneza de 2015, com o título É Tanta Coisa Que Não Cabe Aqui, com obras dos artistas André Komatsu, Berna Reale e Antonio Manuel, convidados pelo curador Luiz Camillo Osorio. Os três construíram um lugar de aprisionamento como crítica a uma falsa liberdade em que transita o indivíduo contemporâneo.
“É como se o trio dissesse que para, sermos livres, precisamos estar trancafiados num espaço cirurgicamente limpo, falso, montado por nossa imaginação, na estética do ‘condomínio’, citando Christian Dunker. E há também o aprisionamento do outro, na pobreza econômica, na violência física, social e cultural, que é uma maneira de garantir nossa própria e mesquinha sobrevivência”, do site brasileiros.
Outra brasileira que se faz presente em Veneza é a mineira Sonia Gomes que está entre os 136 selecionados pelo curador da Bienal, o nigeriano Okwui Enwezor. Sonia trabalha com tecidos, bordados, torcidos e rasgados. “O material chega pedindo socorro. ‘Não me deixe morrer. Me deixe viver em outro corpo’”. Leia mais sobre Sonia Gomes.
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