Vida de wwoofers não é só trabalho pesado. Temos nossos momentos de descanso e momentos que de folga que compartilhamos sempre da melhor maneira possível.
Aqui na Grange de Bouys somos todos aficionados por vinho e umas das coisas que fizemos no nosso primeiro fim de semana de folga foi pegar o carro e ir por ai, para degustar os vinhos produzidos na região. A experiência foi um tanto peculiar: não pelo vinho em si, mas pelo inusitado de toda a visita.
Languedoc- Roussilon é um região vinícola da França, não tão conhecida e que se destaca principalmente por ter uma grande variedade de pequenos produtores com casas humildes e amor pelo que fazem.
As visitas que fizemos não foram a grandes Chateus maravilhosos como podemos encontrar em Bordeaux, Champagne ou Borgonha, que têm pessoas designadas para guiar você durante o roteiro mostrando o lindo das suas parreiras, a amplitude da sua Adega e terminando com a degustação de vinhos no restaurante da Adega.
Aqui, os produtores quando aceitam mostrar o seu vinho abrem, muitas vezes, a porta da sua casa. Muitos tem parcelas de vinhos espalhadas pela região, perto de casa mas não ao lado e geralmente utilizam a garagem, ou o porão como lugar para fabricar o vinho.
Isso não significa para nada que o vinho seja ruim ou de qualidade inferior. Tive o privilégio de comprovar por mim mesma que muitos vinhos produzidos assim, tem a mão do produtor em cada processo e a sua artesanalidade aporta um valor – “añadido” – adicionado que nem toda Adega grande faz.
Três lugares
Estivemos em três lugares diferentes. Dois deles fabricavam o vinho na sua casa e degustamos ou na cozinha ou no jardim, e outro tinha uma pequena adega no centro da cidade em que pudemos degustar e apreciar todo o processo do vinho na sua própria adega.
O melhor de tudo é que estávamos diante do próprio produtor, que nos apresentava a sua história e os seus vinhos com histórias completamente novas e inusitadas. Não havia pergunta que não pudessem responder: se notava que cada decisão foi tomada com muito critério e sabendo exatamente o que estavam fazendo.
Mas Coris
Nossa primeira visita foi a Mas Coris com denominação de origem Languedoc e selo de vinho biológico. Provamos quatro vinhos, entre eles, brancos, rosés e tintos. Eu pessoalmente gostei mais do tinto e do branco jovem.
O produtor abriu a porta do seu estabelecimento só pra mostrar todo o processo como ele faz os vinhos e abriu garrafas novas pra gente provar. O lugar era simples, mas cheio de encanto. Pudemos perguntar sobre como ele fazia o vinho, a particularidade do vinho dele e todo o resto. Saímos com algumas garrafas, não todas que queríamos obviamente, mas o suficiente.
Deborah e Peter
Segunda parada foi na casa de uns amigos de Stephane e Florence: Deborah e Peter que têm uma produção de vinhos maravilhosos chamado ‘Mas Gabriel’, um deles com 91 pontos obtidos pelo célebre crítico Robert Parker.
Deborah e Peter são britânicos, radicados na França há anos. Eles têm toda a produção feita no porão da sua casa. Foi umas das degustações mais curiosas que já fiz em minha vida. Primeiro fomos conhecer a sua adega, onde a produção de 20 mil garrafas por ano em média eram produzidas.
O lugar era pequeno, mas acolhedor.
Uma das curiosidades foi ver pela primeira vez barris de concreto para estocar o vinho, em vez de aço-inoxidável.
Ao lado deles, as barricas de carvalho ocupavam quase todo o lugar. Dalí, passamos ao jardim localizado no fundo da sua casa, onde nos sentamos numa mesa , debaixo de um toldo, onde íamos fazendo a degustação de cada um dos seus vinhos.
Não resisti e tive que comprar dois, um branco e um tinto, também sem carvalho. Quanto mais conheço os vinhos produzidos nessa região mais me convenço que a maioria deles realmente não precisa de carvalho para melhorá-los.
Deborah e Peter nos contaram que foi um dia jantando em alguma parte de UK que decidiram que iam ser produtores de vinhos.
Buscaram um lugar onde pudessem aprofundar seu conhecimento sobre a produção de vinhos e escolheram a Nova Zelândia como o lugar idôneo. Passaram ali uma temporada e ficaram amigos de produtores da região. Entre eles estava Britany, filha de um casal amigos de ambos que agora estava aqui região fazendo Wwoofing na casa deles.
Cristian
Por último visitamos a Cristian, uma adega que o Wwoofer alemão Tristan trabalhou anteriormente, proprietário do Domaine Baillat. Esta é outra experiência que vai ficar marcada na minha memória.
Cristian também é um pequeno empresário, que vem se dedicando ao mundo do vinho há mais de 30 anos. Começou primeiro com o seu irmão e mais tarde seguiu sozinho no caminho da produção.
A casa de Cristian me faz lembrar muito a casa dos meus avós nos pampas gaúcho. Mobiliário simples, aconchegante e com sabor de saudades em todos os cantinhos.
Como todos produtores, começamos a visita pela sua Adega, que também encontra-se no porão ou garagem da sua casa. O lugar é bem maior que o lugar da Deborah e do Peter, também com cubos de concreto para armazenar o vinho; e de aço-inoxidável também.
Começamos a degustação ali mesmo, provando os vinhos diretamente dos cubos de concreto, de aço e do carvalho. Foi uma degustação super atípica porque de certa forma o vinho não está completo, nem perfeito, mas ao provar dali você tem a sensação de como um vinho pode evolucionar no seu processo até chegar a garrafa.
Cristian se define como um contador de história, termo muito apropriado depois de ter passado tantas horas com ele na sua adega e na cozinha. Entre taças e taças passamos momentos inesquecíveis de sorrisos, risadas. Sua forma de contar a história do seu vinho, de como chegou ali, de como tomou as suas decisões nos envolve de uma tal maneira que fica difícil dizer adeus a tamanha experiência.
Significado do pequeno empreendedor
Esses três produtores, viticultores, são um imperativo do trabalho que significava ser pequeno empreendedor: gente que se sacrifica muito para se dedicar a um negócio apaixonante e que nem sempre tem retorno imediato sobre aquilo que está fazendo.
Fiquei impressionada em ver como essa gente, com um sorriso singelo e sincero são capazes de cativar-nos nesse pequeno momento que compartilhamos. São pessoas dedicadas de corpo e alma ao seu negócio, e com capacidade para levar esse amor transformado em garrafas a muitas partes do mundo.
Toda a sorte do mundo
Desejo a estes três produtores toda sorte do mundo na sua jornada, porque na suas mãos, nos seus olhares e nos seus sorrisos pude captar a essência de cada um deles. A simplicidade do seu negócio. A artesanalidade do seu vinho aporta mais valor a cada garrafa que se abre e se compartilha.
Languedoc- Roussillon sem dúvida é uma região única na França para quem quer conhecer profundamente vinhos originais, artesanais e sem dúvida inesquecíveis.