Prossigo aqui com a segunda e última parte da entrevista que realizei com Luciano Magno – pseudônimo de Lucio Muruci, pesquisador – que desenvolve um trabalho sobre a história da caricarura brasileira, em uma coleção de livros e exposições.
O trabalho, além de uma notável pesquisa é uma pequena aula de empreendedorismo.
Primeiros passos do projeto do livro
Wallace: Com os recursos do patrocínio você registrou uma empresa, uma editora (Gala Edições de Arte) especialmente para realizar a coleção sobre a caricatura brasileira. Em determinado momento você editou um catálogo de exposição que ocorria no RJ, a fim de dar visibilidade a editora e ajudar a conseguir espaço para captar patrocínios. Foi uma ação pensada ou de oportunidade?
Foto: prêmio Jabuti
Magno: Na verdade a Gala Edições de Arte foi criada para realizar inúmeros projetos editoriais, inclusive a coleção sobre a caricatura brasileira. Mas a captação de patrocínio veio depois, como conseqüência do nosso trabalho e esforço. Creio que a realização do 1º Festival de Humor Gráfico foi determinante como currículo e trajetória para conseguir posteriormente o patrocínio da Petrobras para a obra História da Caricatura Brasileira. Mas era inegável também a força desse projeto histórico de resgate da memória nacional, tanto que passou numa Seleção Pública da Petrobras, concorrendo com quase 4000 projetos, como já mencionado.
No projeto todo, recupero a história de vida e da obra de mais 300 célebres caricaturistas.
Em determinado momento editamos nosso primeiro livro: “Nova Escultura Brasileira”, lançado em 24 de janeiro de 2012. Um livro de arte, em grande formato, 31 x 24 cm, de luxo e colorido, em 214 páginas, em que a Gala Edições assinou a Produção Editorial, realizada junto com a curadoria do arquiteto e artista plástico Alexandre Murucci, sobre a nova produção artística da Escultura no Brasil. Esse Livro-Catálogo registra a exposição homônima, realizada no Rio de Janeiro, no Conjunto Cultural da Caixa Econômica Federal, de novembro de 2011 a janeiro de 2012, com 90 artistas do porte de Estela Sokol, Tiago Carneiro da Cunha, Erika Verzutti e Efraim de Almeida. Esse lançamento demonstra nossa vocação para editar livros de arte no Brasil.
Divulgação
Wallace: Desenvolver sites e material impresso promocional foram facilitadores para você conversar com a mídia, “antes da fama”?
Foto: catálogo 1a Bienal Internacional de humor
Magno: Tanto o site quanto o material impresso promocional ajudam no diálogo com a mídia, mas em nosso caso, ter a própria obra História da Caricatura Brasileira impressa e lançada foi determinante. Encaminhamos para cada redação de jornal 1 ou 2 exemplares da obra, e a magnitude e a atração do livro foram tão grandes que todos os jornais do Brasil reconheceram a importância da obra.
Mídia espontânea
Wallace: O primeiro volume da coleção sobre caricatura brasileira foi eleito um dos melhores livros editados em 2012, pelo jornal O Globo. A partir daí você conseguiu espaço na mídia de modo espontâneo, além de fazer palestras e lançamentos do livro no Rio de Janeiro e São Paulo. Esses eventos de apoio ao projeto foram uma das exigências dos patrocinadores (Petrobras), mas você acha válido incluir essas ações, por conta própria, em projetos semelhantes?
Não se deve considerar erros uma coisa ruim, eles fazem parte do aprendizado. O brasileiro, não está acostumado a essa ideia.
Magno: Vou começar respondendo pela última parte da pergunta. É claro que esses eventos de apoio – palestras, debates, workshops que fiz –, sobre a obra, são importantes, tanto que fiz em quantidade maior do que era necessário para agradar os patrocinadores Petrobras, Eletrobrás e Suzano Papel. Sempre acho válido e fundamental incluir essas ações em projetos semelhantes.
Quanto a questão da divulgação na mídia, a obra conseguiu mídia espontânea mesmo antes da consagração do livro como um dos Melhores do Ano, o que foi muito bom e somos muitos gratos por esse reconhecimento.
Foto: troféu Jabuti
Bastidores da obra
Wallace: Mas nem tudo foram flores. Você como qualquer empreendedor, pode ter tomado algumas decisões erradas. Faça um mea-culpa e cite alguns erros que um empreendedor da área cultural deve evitar ao empreender um projeto.
Magno: Não se deve considerar erros uma coisa tão ruim assim. Erros fazem parte do aprendizado e da evolução de qualquer trabalho. Servem como lição, e a partir deles produzimos um trabalho melhor. A vida é um eterno aprendizado.
O brasileiro, me parece, não está acostumado a essa ideia, mas em grandes empresas e universidades no exterior se trabalha muito fazendo experimentações, com pesquisas, errando muito, até que daí chega-se a uma grande descoberta e surge uma criação maravilhosa. Lá eles tem noção que a área de pesquisas, testes, com muitos erros e acertos, é fundamental para que uma invenção, um conceito, um produto, prospere, seja vitorioso e chegue ao mercado como algo bastante inovador e criativo.
Como uma descoberta científica, a obra História da Caricatura passou por várias fases, até chegar ao grau de excelência que ora se apresenta.
Caminhos das pedras
Wallace: Se você fosse dar conselhos a quem deseja desenvolver um projeto cultural, qual seria o caminho das pedras (etapas que devem ser percorridas para “pôr o bloco na rua”)?
Magno: Para mim, não existe um caminho das pedras tão pré-definido assim. Mas é importante atentar para algumas questões: Acredito que o sucesso “é muitas vezes questão de foco”, ser objetivo em relação ao que se almeja. Dar o máximo de si e buscar a qualidade máxima sempre, a excelência. E tem uma frase de Walt Disney que sigo como meu lema, pois ele dizia, que apesar das adversidades, é importante: “Continuar seguindo em frente”. Quanto a tramitação burocrática de um projeto cultural, os Manuais do MinC e técnicos culturais estão aí com suas dicas nos sites e blogs.
Wallace: estudo (doutorado, bolsa de pesquisas) ocorreram em paralelo ao projeto da coleção de caricatura. é possível conciliar projeto, resultados e estudos ou “a necessidade é a mãe da invenção”?
Magno: É possível, sim, conciliar projetos e estudos, mas, de fato, tem que se fazer um esforço mais esmerado. De fato, muitas vezes a “necessidade é a mãe da invenção”. Mas acho também que o importante é aproximar estudos da área aonde se trabalha pragmaticamente. Foi o meu caso, estudava a história dos caricaturistas fora, no trabalho, quanto dentro da universidade.
A história da caricatura brasileira: considerações finais
Wallace: Há alguma coisa curiosa ou relevante que aconteceu no projeto do livro da caricatura e que gostaria de citar?
Magno: Fato importante, a própria descoberta da primazia da charge do periódico O Maribondo, em 1822, como a primeira caricatura brasileira, fez mudar todo o arcabouço dos marcos históricos do nosso trabalho, e por conseqüência, da história da nossa caricatura.
O primeiro volume da obra História da Caricatura Brasileira acabou refundando a caricatura no Brasil, estabelecendo novo marco inaugural e fundador dessa arte no país, reconhecendo a charge publicada no periódico pernambucano O Maribondo como a primeira caricatura brasileira, reinaugurando a data da caricatura no Brasil para 25 de julho de 1822. Ao mesmo tempo, destaca a fundamental importância, também precursora, da magnífica série de estampas caricaturais de Manoel de Araújo Porto-Alegre, um marco dessa arte em nosso país.
A obra propõe reavaliações, introdução de novos marcos históricos e de personagens que haviam ficado de fora dos estudos anteriores, até mesmo no livro “História da Caricatura no Brasil”, obra clássica do escritor cearense Herman Lima, publicada em 1963.
No projeto todo, recupero a história de vida e da obra de mais 300 célebres caricaturistas. Muitos deles eram apenas mencionados em estudos anteriores e outros nunca figuraram neles.
Wallace: Alguma que gostaria de acrescentar?
Magno: Quero agradecer a oportunidade da entrevista e gostaria de lembrar que a dedicação e o amor ao que se faz é muito importante. No meu caso, a dedicação à essa arte, a arte da caricatura, é integral. Mas em todos os projetos e profissões na vida também vale esse mesmo exemplo, inspirado num ídolo meu e dos brasileiros em geral, Ayrton Senna, que certa vez disse: “No que diz respeito ao desempenho, ao compromisso, ao esforço, à dedicação, não existe meio termo. Ou você faz uma coisa bem-feita ou não faz.”