Os Amantes, Henri Matisse, 1928. Nova York. Museu de Arte Moderna

Casais desestruturados

Há quem lembre do meu texto sobre os solteiros desestruturados. Há quem lembre das minhas divagações sobre esta época, esta mudança de paradigma que estamos vivendo. Pois outro dia em casa estava divagando no telefone com a mesma pessoa que me trouxe o conceito “Solteiros desestruturados”.

E não sei se porque é Dia dos namorados aqui na Europa ou Carnaval no Brasil, a verdade é que comecei a pensar sobre o seguinte nível dos tão famosos solteiros desestruturados.

São os casais desestruturados. Isso mesmo. O solteiro deixou de ser solteiro e encontrou uma pessoa… que o complete, que dívida as mesmas inquietudes que ele. Quando um solteiro desestruturado encontra a outro solteiro desestruturado o mundo treme.

Regras do mundo

Treme porque sabe que a relação deles, longe de ser o que os outros esperam, vai ser plasmada por esse conceito que eles levam tão arraigados dentro de si: a liberdade. Os casais desestruturados não são aqueles que fogem de todas as convenções possíveis, mas sim aqueles que sabem que estas convenções podem ser quebradas quando eles quiserem. Porque eles, que foram solteiros desestruturados, sabem melhor que ninguém que as regras desse mundo já não se aplicam na sua forma de vida.

Os casais desestruturados podem casar, ter filhos, assim como podem decidir o contrário. Podem ter uma relação cada um na sua casa, podem ir a viver juntos sem ter que casar e podem um milhão de coisas mais que antigamente vinha preestabelecido como regras do jogo.

Dogma dos relacionamentos

Quando converso com meus amigos que têm relações atípicas, muitos deles sempre me dizem o mesmo; que essa rota pré-programada que as pessoas te dão, e assumem como um dogma dos relacionamentos, limita muito as relações.

E hoje, depois de viver essa liberdade, essa possibilidade de fazer as coisas como a gente quer, assusta muito entrar numa relação e esperar que tudo aquilo que você construiu sozinho, tudo aquilo que você quer ser, pode ser quebrado porque agora as regras do jogo são outras…

O que fazer nesse caso?

Eu digo que não… e como eu, muitas pessoas que sentem o mesmo dizem que não. Queremos sim ter uma pessoa do nosso lado, mas que entenda os nossos desejos e inquietudes, e que nos permita ser tão plenos com eles que quando éramos sem eles.

Queremos ter nossa liberdade e respeitar a liberdade do outro… queremos não aceitar esse contrato preestabelecido que a sociedade nos impões e limita… não para sermos rebeldes ou romper o ‘status quo’; senão para ter a possibilidade de ser quem realmente somos.

Casais desestruturados

Somos casais desestruturados… e não queremos que nada nem ninguém nos impeça de ser felizes. Podemos ceder, e ser flexíveis, mas não queremos fazer sacrifícios… porque sabemos que os sacrifícios passam fatura a longo prazo.

Se você, solteiro desestruturado, encontra uma pessoa para seguir esse caminho consigo, por que não abrir os horizontes e falar abertamente sobre o que quereis: trabalho, família, casa, sexo, relações abertas, fechadas, sentimentos… o que for.

Ninguém aqui está obrigado a aceitar aquilo que não o faz feliz. E o futuro de um casal está justamente nessa flexibilidade e na tentativa de simpatizar sobre aquilo que espera o outro.

O diálogo é o primeiro passo a dar quando um quer realmente que o outro o compreenda. Não se sinta obrigado a fazer o que os outros querem que façam, e permitam que a vossa relação seja única e singular como pessoas que vocês são: únicos e singulares.

De solteiros desestruturados a casais desestruturados.

Façamos a nossa escolha. O que queremos? Flexibilidade, relações abertas, fechadas, muito sexo, pouco, filhos, família, casa própria, aluguel… viajar o mundo inteiro… ter a possibilidade de aceitar uma proposta de trabalho na conchinchina… Hoje mais do que nunca temos a possibilidade de alçar a voz e falar sobre isso.

Olhar um no olho do outro e dizer sinceramente: eu gosto de você mas isso também é prioritário na minha vida, o que você acha?

Escravidão

O tempo nos permitiu abolir a escravidão, a dar direitos as mulheres, a aceitar os homossexuais… por que não agora, aceitar o diferente, e assumir que a tua maior alegria é ver o outro, aquele que você ama, progredir e ser feliz da forma que ele sempre desejou. Porque não fazer com ele entenda o que você quer, o que te motiva e o que te faz feliz.

De repente, não queremos casar, não queremos ter filhos, mas queremos sim uma pessoa do nosso lado. De repente queremos ter filho e ensiná-los de forma diferente, educá-los com outras prioridades e outros matizes. De repente, queremos viajar sozinhos, queremos ter nosso tempo para fazer esporte, interagir, ler, escrever ou o que for… não queremos ir de férias todos os anos à praia, comprar casa própria, ou comer todos os domingos na casa dos pais ou dos sogros… não queremos estar atados e ter que viver a vida inteira num só lugar.

Ajamos com boa fé, sejamos sinceros, abramos a porta do diálogo e demos a possibilidade de que um seja realmente quem quer ser: com todos suas qualidades, defeitos, desejos e vontade. Não importa o que for… ter a liberdade de manifestar-se sobre esse desejo, sobre esta inquietude é uma das grandes vantagens do tempo em que vivemos.

Liberdade

Somos casais desestruturados. De solteiros aprendemos que o grande valor da vida é a nossa liberdade. E nessa liberdade que ambos levamos consigo, busquemos comer o mundo e fazer dele um lugar mais tolerante e habitável… e que a nossa felicidade, o nosso sorriso emane em todos os cantinhos do mundo.

Que juntos, aceitemos e respeitemos todos os casais e solteiros, dos mais conservadores aos mais progressistas, e que façamos que eles se sintam em casa… porque somos aquilo que sempre sonhamos ser, porque encontramos uma pessoa para dividir essa vontade, esse desejo da forma mais honesta e livre… sem dogmas, sem rota pré-estabelecida, e principalmente sem medo de falar.

Sejamos solteiros desestruturados, casais desestruturados, ou mesmo famílias desestruturadas… buscando nesse conceito, não o seu lado negativo mais sim o lado mais singular que nos fazem ser como somos. E nessa singularidade, o único desejo de viver uma vida plena e feliz sem receitas de bolo, nem caminhos pré-definidos. A vida começa agora e nós indicamos a direção que queremos tomar.

Somos casais desestruturados e a vida é hoje e agora.

*Dia de San Valentino na Europa comemora-se o Dia dos Namorados. 14 de fevereiro.

 

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